Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Os desafios da informação ambiental no Brasil

Em março, a Artigo 19 Brasil promoveu o encontro de ativistas ambientais para discutir os desafios que suas organizações enfrentam na realização do direito de acesso à informação sobre mudanças climáticas. O grupo fez uma análise crítica sobre a circulação da informação – de sua produção por diversos atores até sua recepção pelos grupos afetados, passando também pelos tipos de informação disponíveis.

Há algum tempo reina o discurso de que a melhor informação científica vai pautar as decisões políticas. Mas como essa informação é gerada e disponibilizada? Como influenciam efetivamente as decisões políticas? E é somente essa informação que deve pautar o debate?

Os participantes avaliaram a produção de informações sobre mudanças climáticas a partir de três aspectos: a participação da sociedade no processo de produção, a linguagem dos documentos e a inexistência de um processo de produção de certos dados.

Quanto à participação social, o grupo apontou como exemplo a formulação da Política Nacional de Meio Ambiente. Embora formalmente o governo aponte que uma série de audiências públicas foi realizada para a elaboração da política, o formato dessas audiências não propiciou o debate. Especialistas discutiam entre si, dando pouco espaço à manifestação dos presentes, que muitas vezes eram os afetados diretos das políticas que debatiam.

Falta de bancos de dados

Na área ambiental, tal ausência de debate parece ser a regra, algo reforçado pela linguagem técnica e excludente. Dessa forma, a informação não chega até o tomador de decisão, administrador ou líder comunitário que vai efetivamente implementar a política. O fato de o debate ser inacessível aos leigos se soma a uma cobertura deficiente da mídia e contribui para o fraco envolvimento do cidadão, que não identifica o tema ambiental no seu cotidiano.

Essas restrições no debate sobre mudanças climáticas acabam prejudicando o tipo de informação sendo produzida, que fica limitada a poucos temas. Como líderes de comunidades afetadas não conseguem se envolver nos trabalhos (às vezes por falta de capacitação), eles não passam adiante seus problemas. Além disso, os órgãos estatais não se aparelharam para colher e organizar dados. Então, as informações muitas vezes ficam isoladas ou limitadas a regiões específicas.

Assim, bancos de dados importantes, principalmente relacionados a medidas de mitigação e adaptação frente às mudanças climáticas, não estão sendo produzidos ou sistematizados e, quando existem, geralmente envolvem a Amazônia. Não estão disponíveis estudos sobre outras regiões e biomas, como a caatinga, o cerrado e mesmo zonas urbanas.

Mídia comunitária

Sem dados concretos demonstrando os efeitos da mudança climática no Brasil, as pessoas não percebem a urgência da situação. Mas, mesmo se informações mais detalhadas e compreensíveis estivessem disponíveis, elas chegariam aos grupos afetados? E quem são esses grupos? Como alcançá-los?

Os participantes da reunião concordaram que seria interessante ampliar o conceito de ‘população afetada’. Essas comunidades devem receber informações não só para a defesa de seus direitos ou interesses, mas também objetivando uma participação mais ampla na agenda pública e o exercício da cidadania.

Uma forma de atingir esses grupos é pela mídia de massa. Ela é uma ferramenta arriscada, dada sua cobertura sazonal – como observado na forte atenção ao tema antes, e na abrupta queda depois, da COP-15 –, além do despreparo de jornalistas e editores em relacionar fatos do cotidiano a temas ambientais. No entanto, os grandes veículos podem ser pautados pela mídia verde especializada se as organizações ambientais conseguirem identificar casos de sucesso em atrair a atenção e a confiança da imprensa e procurarem reproduzi-los.

Outra maneira de chegar até grupos afetados é utilizar a mídia comunitária. Sendo capaz de associar mudanças climáticas a questões locais, usando uma linguagem muito própria daquela comunidade, esses veículos promovem efetivo diálogo com a população. A atividade da mídia comunitária somada à capacitação de lideranças pode contribuir para o déficit participatório detectado pelos ativistas.

Criação de um grupo de ação

O importante é que o acesso à informação ambiental funcione como promotor da participação cidadã nos assuntos públicos. Como eleitor, o cidadão pode exigir que seus candidatos coloquem ações de mitigação e adaptação em seus planos de governo e avaliar como os governantes em mandato têm atuado na área. Como consumidor, o cidadão pode exercer o consumo consciente, exigindo que empresas utilizem critérios verdes, inclusivos (contra a pobreza) e responsáveis (éticos e transparentes) em suas ações no Brasil.

Devido ao tamanho dos desafios, os integrantes da reunião – Cristina Spera, do Instituto Ethos; Juliana Russar, do projeto Adote um Negociador; Marcelo Cardoso e Rubens Born, do Vitae Civilis; Markus Brose, da Care Brasil; Paula Collet, da campanha 350; Silvio Barone, do Barca; e a Artigo 19 Brasil – se comprometeram a estabelecer um grupo de ação para dar um encaminhamento às avaliações sobre o estado do acesso à informação ambiental no país. O atual objetivo do grupo é encontrar metas comuns para a sugestão de propostas concretas de ação.