Um dos cargos mais atingidos pela migração dos jornais para plataformas digitais foi o do defensor(a) dos leitores, uma função mais conhecida por ombudsman. Muitos chegaram a prognosticar que o cargo está fadado à extinção porque, na internet, o leitor pode se defender diretamente por meio do Twitter, blogs, comentários em artigos ou redes sociais.
Mas Margaret Sullivan, que ocupa o cargo que o The New York Times batizou de Public Editor (Editor do Público – leitores), está mudando radicalmente a forma como a função é vista tanto fora como dentro do jornal. Ela está no cargo desde setembro, já bateu de frente com vários repórteres e editores do Times e passou a ter uma relação direta com os leitores, coisa que seus quatro antecessores fizeram apenas de forma oblíqua.
A principal mudança foi no canal de comunicação. Antes, os ombudsmans do NYT dedicavam 90% do seu tempo a escrever colunas para a edição impressa. Margaret inverteu as prioridades e começou a publicar mais para o seu blog do que para o jornal . Com isso ela passou a comentar com maior frequência e diversificar a abordagem dos temas, com posts curtos e em linguagem direta.
A franqueza tornou-se a marca registrada na Editora dos Leitores do The New York Times, que já assuiu a inédita atitude de tomar o partido do público quando um dos repórteres do jornal reagiu grosseiramente às críticas feitas por leitores e postadas junto à reportagem publicada. Ela cobrou e obteve do repórter um pedido de desculpas aos leitores .
Margaret recebe diariamente, em média, 200 mensagens do público com o qual conversa sobre os temas e críticas recebidas. É outra mudança radical em relação aos seus antecessores, homens que excluíam explicitamente a conversação com leitores como uma atribuição do cargo. Margaret também decidiu instalar-se junto à redação, ao contrário de outros editores dos leitores do NYT, que decidiram ficar o mais longe possível dos repórteres e articulistas.
A editora dos leitores conseguiu inclusive ser elogiada por Dan Gillmor, escritor e um dos mais experientes críticos da mídia digital nos Estados Unidos. Gillmor chegou a ser convidado pelo NYT para candidatar-se ao cargo que acabou sendo entregue a Margaret. Ele defende a tese de que o problema dos ombudsmans não está na crítica do conteúdo do jornal, mas na busca de um diálogo com o público.
Sem essa conversa, Gillmor acha que a função passa a ser um mero penduricalho burocrático nas redações. Uma de suas propostas ao Times era de transformar o cargo de defensor do leitor no espaço para uma grande conversa em que o público seria o principal protagonista.
As ideias de Gillmor, autor do livro We The Media (Nós, os Media. Editora Presença, Lisboa. 2005; disponivel na Livraria Cultura), fazem algum sentido na medida em que o futuro da imprensa parece cada vez mais associado a uma integração entre versões online e offline (impressa), onde a plataforma digital tem como principal característica a interatividade, termo que em bom português equivale à conversação.
Margaret Sullivan enfrenta agora uma dura prova de fogo com a polêmica em torno do papel que Mark Thompson, o atual executivo chefe do NYT, teve quando ocupava cargo similar na BBC – e a emissora britânica silenciou sobre um caso de pedofilia envolvendo Jimmy Savile, um de seus mais populares animadores de auditório.