Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Senhora de qual destino?

A novela Senhora do Destino despertou muito interesse, principalmente em Brasília, por causa do seqüestro do Pedrinho. Assisto-a com alguma freqüência e até mesmo tenho algumas discussões com amigos advogados em função de aspectos jurídicos que ela apresenta.

Nestes dias, contudo, a partir da cena da confissão da personagem Nazareth, comecei a questionar de qual destino a personagem Maria do Carmo era senhora.

Explico-me: numa cena em que a personagem Nazareth era obrigada a lavar as ‘privadas’ da cadeia, e tentava se esquivar disso, foi humilhada tanto pelo personagem delegado quanto pela personagem Maria do Carmo. Noutra cena a mesma personagem Nazareth foi humilhada quando tentava tomar banho na cadeia e ainda no dia seguinte, no café da manhã.

Que estas cenas sejam comuns nas cadeias, já sabemos. Mas, estão corretas? Fazer faxina em banheiro é punição? Humilhar os trabalhadores faxineiros no horário nobre da TV está correto? Não se lava vaso sanitário com um pano e um balde. Lava-se assim o chão, talvez da cozinha de nossa casa, quando não dispomos de muito tempo, mas nunca um vaso sanitário. A personagem Nazareth foi prostituta, uma mulher que não tinha empregados, portanto sabia como se lava um vaso sanitário.

Ao tentar tomar banho, teve que fazê-lo num lugar imundo, como todos os presos daquela cadeia.

Eternamente inconsciente

Qual o objetivo disso? Denunciar o péssimo estado de nossas prisões?

O tiro saiu pela culatra. O comportamento dos personagens delegado e Maria do Carmo mostraram claramente que o estado de nossas prisões é fruto da falta de fraternidade tanto dos que estão dentro das prisões quanto dos que estão fora. É fruto da crença no dinheiro como o deus que nos salva do mal: para ter dinheiro uma personagem rouba a filha de outra e mata para não ser descoberta e deixar de ter dinheiro; porque tem dinheiro, uma personagem acha-se boa porque não precisa cometer um crime para viver e então humilha o criminoso; porque tem poder/dinheiro, um personagem acha-se dono da justiça.

E a Justiça? Passou longe da novela, da Globo, dos juízes e do povo.

Assim, parece que a Senhora do Destino é senhora do destino de ser eternamente inconsciente de que o bem precisa ser exercido cotidianamente e de que o mal precisa ser derrotado a cada momento dentro de nós mesmos. Por isso vamos seguir pensando que a personagem Nazareth é completamente diferente da personagem Maria do Carmo; que o personagem prefeito corrupto é completamente diferente do personagem delegado; que a única semelhança entre a personagem Leidy Daiane e a personagem Iara é que ambas são mulheres.

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Psicóloga em Brasília