Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Personagem do ano ou escândalo do ano?

A revista Time incluiu o site Twitter como um dos canais usados para escolher o personagem do ano, uma tradição mantida há 86 anos, mas, como já aconteceu anteriormente, o voto popular não garante a eleição. Em 2012, o público elegeu o dirigente norte-coreano Kim Jong-un, mas os editores acabaram escolhendo o presidente Barack Obama, que ficou em 18º lugar na consulta popular.

Este ano o ex-analista da CIA Edward Snowden é o favorito nas pesquisas populares para o homem do ano, mas mesmo que ganhe no Twitter sua escolha não é garantida, uma vez que dependerá do crivo político dos editores da Time, uma revista tradicionalmente conservadora.

Independente do resultado, Snowden já tem o seu lugar na galeria dos personagens de 2013 porque mexeu numa abelheira que ninguém antes havia tocado. A divulgação de dados sobre monitoramento de comunicações pessoais na internet provocou um terremoto político ao envolver personalidades como a chanceler alemã Angela Merkel e a presidente Dilma Rousseff.

Mas também abalou o mundo dos negócios porque a garantia de sigilo, um ícone do mundo corporativo, virou fumaça. A denúncia de violação ilegal da privacidade individual e organizacional criou também um fosso entre os sistemas de segurança e o poderoso setor de negócios digitais, em que corporações como Google, Facebook e Yahoo reagiram com irritação porque a “arapongagem” da Agência Nacional de Segurança dos Estados Unidos (NSA) pôs em xeque sua confiabilidade diante dos milhões de usuários da internet que depositam sua privacidade nos sistemas de correio eletrônico e redes sociais.

Os governantes espionados reagiram indignados alegando violação da soberania nacional, um princípio que já é ficção na internet, mas que continua sendo uma norma importante nas burocracias estatais. Cresceu também a pressão para reduzir a influência norte-americana nos órgãos dirigentes da internet, um movimento polêmico porque abriga também interessados em “balcanizar” a rede mundial de computadores – ou seja, transformá-la numa colcha de retalhos de núcleos autônomos.

Snowden provavelmente nem se deu conta de que ao entregar documentos da CIA ao jornalista Gleen Greenwald estaria deflagrando um tsunami político tão amplo e diversificado. Ele acabou se transformando num personagem incômodo que poucos governos desejam abrigar por medo de retaliações norte-americanas. 

Mesmo que não seja escolhido o homem do ano da Time, Snowden já entrou para os anais como o autor do escândalo do ano. O presidente Barack Obama tenta minimizar as consequências do ato do ex funcionário da CIA para evitar maiores embaraços, até porque a espionagem envolveu principal aliados políticos dos Estados Unidos. Mas o vírus da desconfiança já contaminou a diplomacia mundial e este é um processo irreversível.

A sofisticação dos métodos de espionagem digital revelados por Snowden sepultou o sonho da privacidade ingênua na internet.