Se a tão sonhada paz no Oriente Médio ficou mais próxima com o aperto de mãos entre Mahmoud Abbas e Ariel Sharon, no começo de fevereiro, é difícil saber. Enquanto ela não chega, palestinos e israelenses convivem em harmonia. Não, a frase anterior não está equivocada: há um lugar no mundo virtual onde, sim, a paz – e a manutenção das diferenças e individualidades – é possível.
Criado em 2001 pelo palestino Ghassan Khatib, atual ministro do Trabalho da Autoridade Palestina, e pelo analista político israelense Yossi Alpher, o sítio Bitterlemons.org (http://www.bitterlemons.org/) promove debates semanais sobre questões ligadas ao conflito. O ‘fogo-cruzado’ tenta ser sempre justo: representantes dos dois lados expõem seus pontos de vista através de textos opinativos.
Alpher diz que o Bitterlemons difere da maioria das tentativas de diálogo entre palestinos e israelenses justamente por enfatizar a diversidade das opiniões e dar voz a toda uma gama de posicionamentos, em vez de simplesmente buscar um consenso cômodo. ‘Nosso principal objetivo é mostrar que é possível discutir civilizadamente diante de um desacordo’, diz ele. Os dois criadores do sítio são responsáveis pela edição do conteúdo.
Os artigos do Bitterlemons são hoje reproduzidos por jornais israelenses, palestinos e ocidentais. ‘A qualidade dos textos e o gabarito dos autores têm colocado essa newsletter como referência para todos os que querem uma informação objetiva e imparcial do conflito israelense-palestino’, afirma Moisés Storch, coordenador do grupo Amigos Brasileiros do Paz Agora. Foi dele a idéia de traduzir o conteúdo do Bitterlemons para o português, o que ocorreu no começo deste ano.
União em Israel e no Brasil
O movimento Paz Agora (www.peacenow.org.il) nasceu de uma tentativa de apoio ao acordo de paz entre Israel e Egito, no fim da década de 1970 – em troca da paz com o Egito, Israel devolveria o Sinai, conquistado na Guerra de 1967. A iniciativa, tomada por oficiais do exército israelense, conquistou a adesão de parte significativa da população local, que defendia uma solução pacífica para o conflito entre Israel, os países árabes e o povo palestino.
O Amigos Brasileiros do Paz Agora – Paz Agora/BR foi criado no início dos anos 1980, em solidariedade ao movimento israelense. Os dois grupos diminuíram sua atuação na década de 90, com o aparente progresso no processo de paz, depois da assinatura do acordo de Oslo.
Como a tranqüilidade durou pouco, o campo pacifista começou a recobrar força há alguns anos. ‘Hoje, o Paz Agora leva às ruas centenas de milhares de israelenses exigindo o fim da ocupação de Gaza e da Cisjordânia para a formação de um Estado palestino soberano ao lado de Israel’, explica Storch.
No Brasil, um grupo de judeus também se mobilizou para estimular o diálogo entre palestinos e israelenses, a partir da experiência de convivência das comunidades árabes e judias no país. O braço brasileiro do Paz Agora foi rearticulado em 11/9/01, com a criação de uma lista de troca de informações na internet, com a proposta de ser um canal alternativo à grande mídia. Quase quatro anos depois, o movimento, que já conta com mais de 2000 participantes qualificados, atua a partir do trabalho de voluntários, divididos entre São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre.
Frutificar o diálogo possível
No fim do ano passado, o grupo estruturou seu sítio na web (www.pazagora.org). Surgiu então a idéia de fazer páginas, em português, com o conteúdo de fontes internacionais que tratassem de questões sobre o conflito. O Bitterlemons – que ganhou o nome de Bitterlemons/BR na versão brasileira – é o primeiro a participar da iniciativa.
A empolgação com o projeto é mútua. Yossi Alpher ressalta a importância de se informar a população de língua portuguesa sobre as diferentes visões do debate e, ao mesmo tempo, mostrar que é possível haver uma discussão civilizada sobre o tema. Já Storch destaca que a competência e a diversidade dos comentaristas do Bitterlemons fazem com que ele seja, hoje, ‘uma fonte indispensável de informações para ações pacifistas concretas’.
Outro aspecto importante apontado pelo coordenador do Paz Agora/BR é a possibilidade de se ter tão próximo – e, ao mesmo tempo, longe da cobertura oficial da grande imprensa – as impressões e experiências de quem vive diariamente o conflito. ‘À distância, nós achamos, por vezes, que aquela guerra é um absurdo. Mas, para eles, tanto palestinos como israelenses, muitas vezes o outro simboliza uma ameaça à própria vida’, afirma. ‘A maneira de sentir e pensar que aparece nas entrelinhas de muitos artigos do Bitterlemons é de alguém submetido a uma rotina diária de medo, desconfiança e violência.’
A contribuição do Bitterlemons/BR, conclui Storch, é ajudar a frutificar – sem medo de parecer clichê – a semente da paz. ‘Esta semente já está plantada entre israelenses e palestinos, com gente corajosa e disposta ao diálogo e à concessão mútua. Eles contam conosco.’
Os textos do Bitterlemons/BR podem ser lidos em (www.pazagora.org/bitterartigos.cfm).