’04/07/2005
A reportagem de capa da ‘Veja’, com a revelação de que Marcos Valério foi avalista em um empréstimo bancário feito pelo PT e de que ele pagou parte do empréstimo, complicou ainda mais a vida da direção do PT e condicionou as manchetes dos principais jornais no DOMINGO e na SEGUNDA-FEIRA.
‘Veja’ – ‘O elo se fecha – Documento é a peça que faltava para provar que Marcos Valério e o PT são um só quando o assunto é dinheiro’.
‘Folha’ – ‘Marcos Valério pagou dívida do PT’ (Dom.) e ‘Lula quer renúncia da cúpula do PT’ (2ª).
‘Estado’ – ‘Valério avalizou e pagou dívida do PT’ (Dom.) e ‘PT decide saída de Delúbio; Lula tenta salvar Genoino’ (2ª). O ‘salvar’ do título foi substituído, na última edição do jornal, por ‘manter’.
‘Globo’ – ‘Empréstimo complica situação de Genoino, Delúbio e Valério’ (Dom.) e ‘Empréstimo deve levar Genoino e Delúbio à CPI’.
‘Época’ – ‘Entrega garantida’. A revista continua com o foco nas irregularidades nos Correios, fonte das primeiras denúncias que geraram a crise. Segundo a revista: ‘Aparece a conexão entre o caixa da campanha de Lula e as fraudes nos Correios. Fraudadores doaram R$ 800 mil e ganharam contrato de R$ 104 milhões’.
‘IstoÉ’ – ‘É hora da faxina’.
‘Carta Capital’ – A revista ignora as novas acusações de Roberto Jefferson e as investigações no Congresso e se concentra na figura do ministro da Fazenda, Antônio Palocci: ‘Homem forte’.
Escândalo do ‘mensalão’
A Folha de DOMINGO tem uma reportagem muito bem apurada que reforça a relação estreita entre a direção do PT e o publicitário Marcos Valério, ‘Agendas de Delúbio e Valério coincidem’. O trabalho de reportagem acabou ofuscado pela revelação da ‘Veja’, que também comprova a relação entre as partes, mas com documentos mais comprometedores.
A principal arte do jornal de DOMINGO, ‘Resumo da Semana’ (pág. A8), deveria ter outro objetivo. Ela me pareceu redundante porque os fatos da semana foram repetidos à exaustão pelas TVs, sites na Internet e pelos próprios jornais. Faltou, na minha opinião, um outro tipo de resumo em forma de arte.
O que os leitores estão esperando é um quadro que consolide as dezenas de acusações já feitas, que mostre o que está sendo investigado em relação a cada acusação, quem são os acusados, e que crimes foram cometidos. O que continua confuso para a maioria das pessoas é o ambiente de avalanche de denúncias e de várias frentes de investigações que se cruzam. Ninguém sabe mais, nesta altura da cobertura, que denúncias são importantes e quais são secundárias; o que é crime, o que é irregularidade e o que é imoral; quem é acusado e de que crimes; o que já existe de prova em cada acusação. As informações vão surgindo aos poucos em função dos depoimentos, dos documentos enviados por órgãos do próprio governo (como Coaf e, agora, BC) e do trabalho da imprensa. São pequenas peças que deveriam estar sendo juntadas para que o leitor possa perceber o que é fato, o que ainda está para ser provado e o que não tem importância.
Segundo o ‘Estado’, ‘já são 15 crimes para o país investigar’. O jornal traz um quadro, mas incompleto.
A arte se refere duas vezes à ‘reportagem’ publicada pelo jornal na quinta-feira com o relato de Roberto Jefferson sobre um esquema de desvio em Furnas. Acho que o termo mais adequado seria ‘entrevista’, e não reportagem.
As reportagens ‘Para relator, Valério superfaturou contratos’ e ‘Agências movimentaram mais de R$ 500 milhões no ano passado’, ambas editadas hoje na pág. A5, tratam do mesmo assunto e deveriam ter sido transformadas em uma única reportagem. Separadas, parecem incompletas e redundantes.
O que os irmãos e os pais do tesoureiro do PT, Delúbio Soares, têm a ver com as ações suspeitas que lhe são atribuídas? A foto da família numa Festa de Reis, na página A6 de hoje, é injustificável sob o ponto de vista jornalístico. Os parentes não são citados na reportagem, não existe nada contra eles até o momento e não poderiam ter sido expostos desta maneira. É, na minha opinião, um erro grave.
Igreja
Segundo o ‘Estado’ de DOMINGO, ‘Igreja demite autora de livro sobre padres e abuso sexual’. A professora Regina Soares Jurkewicz, autora de ‘Desvelando a política do silêncio: abuso sexual de mulheres por padres no Brasil’, lançado terça-feira, teria sido demitida do Instituto de Teologia da Diocese de Santo André na quinta. Este é um assunto que continua difícil para a Igreja Católica e merece toda a atenção. Não vi na Folha.
01/07/2005
O assunto, como não poderia deixar de ser, é o depoimento do deputado Roberto Jefferson na CPI dos Correios e a repercussão da manchete de ontem da Folha sobre Furnas.
Folha – ‘Governo afasta diretores de Furnas’.
‘Estado’ – ‘Jefferson: esquema do PT é maior que o de PC Farias’; depois mudada para ‘Jefferson: mensalão continuou a ser pago após denúncias’.
‘Globo’ – ‘Jefferson diz que na CPI todos sonegam gastos de campanha’.
Segundo o ‘JB’, ‘Jefferson amplia a linha de tiro’. Segundo o ‘Correio Braziliense’, ‘Jefferson nocauteia o governo. De novo’.
Escândalo do ‘mensalão’
Estão errados, nas duas edições, o item ‘Outro lado’ do quadro ‘Conexão Furnas, segundo Roberto Jefferson’ (pág. A4) e a legenda da foto da página A5. Não é verdade que o deputado José Dirceu ‘não quis se manifestar’. Sua manifestação está no ‘Painel do Leitor’, na pág. A3 (‘Furnas’): ‘… afirmo que são falsas as declarações atribuídas a mim pelo deputado Roberto Jefferson’.
A omissão indica falta de comunicação dentro do jornal ou a concepção, na minha opinião errada, de que a carta para o ‘Painel do Leitor’ não é notícia.
Aliás, são duas cartas hoje, no ‘PL’, em que seus assinantes reclamam de que não foram ouvidos pelo jornal: José Dirceu e a TV Globo.
As coberturas dos três grandes jornais estão muito parecidas: depoimentos na CPI e nas outras comissões do Congresso, declarações do governo e da oposição, investigações da PF e a continuação do levantamento patrimonial de Marcos Valério.
Receita ortodoxa
O jornal precisava arranjar um jeito de aproximar o noticiário da crise política, que está em Brasil, do noticiário sobre os reflexos desta crise na economia. Isso pode ser feito na primeira página, em remissões ou mesmo jogando parte do noticiário econômico em Brasil.
O caderno Dinheiro de hoje, por exemplo, tem duas páginas (B6 e B7) que tratam destes reflexos, como deixam claro alguns títulos: ‘Economia resiste à crise política, afirma Bevilaqua’, ‘Meirelles defende proposta de redução a zero do déficit público’, ‘Lula quer mudar BC para diminuir juros – Com provável saída de Meirelles, presidente planeja mudar tom da política do Banco Central e priorizar crescimento’.
A proposta de zerar o déficit público nasceu no bojo da crise política gerada pelas acusações de corrupção. É lógico que o debate que segue terá sempre um enfoque político. As declarações feitas ontem por Henrique Meirelles e pelo ministro Luiz Fernando Furlan deixam claro como também este assunto já está dividindo o governo petista.
Justiça
O juiz da 28ª Vara Cível de São Paulo liberou ou não o aumento do plano de saúde SulAmérica? Este é o tipo de serviço em que não pode caber dúvida e nem faz sentido o uso do condicional. Ou ele liberou, e a Folha tem de informar com todas as letras, ou não liberou. Por isso, estranho tanto os títulos da reportagem da pág. C4 da Edição Nacional (‘Juiz recua e libera reajuste de 26% em planos, afirma SulAmérica’) e da pág. C5 da Ed. SP. (‘SulAmérica diz ter conseguido derrubar decisão que baixou reajuste a 11,6%’) quanto a falta de precisão do texto. Não é possível que a Folha não tenha conseguido uma posição oficial para esclarecer seus leitores e tenha de usar a informação de uma das partes interessadas, exatamente a que se beneficia da informação.
30/06/2005
A terceira entrevista do deputado Roberto Jefferson à Folha contém novas acusações ao governo do PT e é a manchete do jornal: ‘Furnas faz caixa para PT, diz Jefferson’. A revelação abre nova frente de investigações.
Como a entrevista foi feita na noite de terça-feira, o jornal teve tempo de sobra para ouvir a versão do governo e/ou buscar alguma evidência que comprovasse as acusações, além de procurar o diretor de Furnas. Se não o fez, foi por estratégia editorial. Foi um erro, na minha opinião. O jornal tinha a obrigação de ouvir os envolvidos por Jefferson e enriqueceria o conteúdo jornalístico se não ficasse apenas no relato do deputado.
O ‘Estado’ alterou a manchete para antecipar o relatório do Coaf que o Ministério Público enviará hoje para a CPI dos Correios e para a Polícia Federal. O jornal começou a rodar com ‘Governo e oposição duelam com novas CPIs’ e mudou para ‘Valério movimentou mais de R$ 40 milhões’.
O ‘Globo’ também teve acesso ao relatório do Coaf (‘São R$ 50 milhões sob suspeita’) mas preferiu destacar uma informação conhecida desde a tarde de ontem: ‘CPI quebra sigilo de Valério’.
E ‘Valor’ chama a atenção para problemas em outra frente, a economia: ‘Inadimplência cresce e já preocupa o comércio’.
Escândalo do ‘mensalão’
Os jornais de hoje abrem duas novas frentes de acusações que deverão ser investigadas.
1 – Na Folha, o deputado Roberto Jefferson revela a existência de um esquema que envolveria Furnas Centrais Elétricas.
2 – E no ‘Valor’, a coluna ‘Brasil’ (‘Crédito consignado, pomo da discórdia’, pág. A2) informa: ‘Duas instituições [bancárias] de grande porte confirmaram que, para fazer o cadastramento [para o empréstimo especial para os aposentados], dirigentes que hoje não mais estão no INSS cobravam uma colaboração em nome do partido ao qual são filiados, o PMDB. Para uma delas , o pedido foi de R$ 4 milhões. Ambas dizem que se negaram a fazer o pagamento da tal ‘colaboração’.
Ainda segundo a coluna, o presidente Lula tomou conhecimento do caso via o senador Aloizio Mercadante. Dias depois a cobrança teria sido suspensa e no fim de março houve troca de dirigentes no INSS.
Segundo ‘Globo’, ‘Agência DNA é investigada por evasão de divisas’.
Reforma política
A Folha tirou da pauta diária a discussão sobre a reforma política, que tem quatro pontos importantes e sobre os quais não existe consenso: fidelidade partidária, lista fechada, cláusula de barreira e financiamento de campanha.
O papel do jornal é provocar este debate através de artigos e reportagens. A crise política deve ser coberta à exaustão, assim como as investigações de corrupção, mas o debate sobre os rumos do país não podem ser deixados de lado. E não é uma discussão teórica ou distante: ela está no Congresso e pronta para ser votada. Não é possível que o jornal não tenha fôlego para tocar simultaneamente os três pontos da agenda: a crise política, as denúncias de corrupção e a reforma política.
Gaza
A reportagem ‘Gerente da retirada de Gaza ataca plano’ (pág. A15) informa que uma comunidade israelense na fronteira com a faixa de Gaza vai erguer um muro de concreto para proteger-se de disparos a partir do território palestino e que o custo do muro será US$ 40 milhões. Será isso mesmo, um muro de US$ 40 milhões?
29/06/2005
O foco dos três grandes jornais é o mesmo da PF e da CPI: Marcos Valério, o publicitário apontado por Roberto Jefferson como um dos operadores do esquema do ‘mensalão’. Cada jornal tenta acrescentar uma pecinha nova neste quebra-cabeça que ainda está longe de ter sido montado. Mas as ‘coincidências’,como as apontadas pelo ‘Globo’, vão se avolumando. A manchete do ‘Correio Braziliense’ resume esta etapa de pequenos mas sucessivos avanços: ‘Cada vez mais quente’.
Folha – ‘Fisco multa empresa de Valério em R$ 63 mi’.
‘Estado’ – ‘Valério sacava dinheiro antes de reuniões com PT, diz Karina’. Ainda segundo o jornal, ‘Agências do publicitário têm dez fazendas’, todas no interior da Bahia.
‘Globo’ – ‘Saques coincidiam com idas de Valério a Brasília’.
E a crise política desapareceu das capas dos jornais econômicos. No ‘Valor’, ‘Morgan Chase decide voltar ao varejo no Brasil’. E na ‘Gazeta Mercantil’, ‘Importações ganharão impulso no 2º semestre’.
Publicidade
O ‘Globo’ deu seqüência, e destaque, às notas publicadas ontem na coluna de Mônica Bergamo (‘Bom exemplo…’ e ‘…Essa moda pega’) sobre o ministro Gushiken. O jornal do Rio confirma as informações da colunista, com mais detalhes: ‘Publicidade estatal nas revistas do cunhado’. O ‘Estado’ também recuperou a notícia. A Folha, no entanto, ignorou-a na edição de hoje.
Editoriais
Folha e ‘Estado’ recorrem à mesma imagem nos editoriais que publicam hoje sobre as negociações frustradas do governo do PT com o PMDB. Na Folha, ‘Desastre político’; no ‘Estado’, ‘Crônica de um desastre’.
Mensalão
O texto ‘Mentira, grita Dirceu ao ver Karina’ (pág. A6) não traz a conversa do ex-ministro com os repórteres no café da Câmara. Embora não tenha nenhuma novidade em relação ao ‘mensalão’, o relato (‘Eu desencarno rápido. Descobri que sou dois, eu e o personagem Zé Dirceu’) se justifica por se tratar, segundo o ‘Estado’, da primeira conversa dele com um grupo de repórteres. E o deputado parecia descontraído.
A Folha tem obtido bons resultados nas apurações em Minas. No domingo, publicou o levantamento de bens de Marcos Valério, ‘Patrimônio de Valério dobra no 1º anos de Lula’. E hoje consegue novas informações relevantes sobre uma das empresas do publicitário, ‘DNA foi multada por dinheiro sem origem’. O ‘Estado’ também conseguiu em Minas um ótimo material, fruto de pesquisa no Sistema Nacional de Cadastro Rural (SNCR), ‘Agências de Valério são donas de 10 fazendas’.
Alvo civil
A coluna Rio de hoje (‘Guerras perdidas’, de Claudia Antunes, na pág. A2) e a reportagem ‘Me sinto como um rato, diz pai de menino morto a tiros na Rocinha’ (pág. C6) chamam a atenção para um detalhe que o jornal deveria insistir na continuação da cobertura: as falhas nos procedimentos da perícia. O ‘Globo’ de ontem já tinha mostrado como vai ser difícil identificar quem atirou no rapaz, se foram traficantes ou policiais, porque o local não foi preservado. No Rio, como em quase todos os outros Estados, as falhas da polícia técnica resultam sempre em inquéritos mal feitos ou inúteis e, portanto, em impunidade. A melhor maneira de mostrar isso é acompanhando de perto os procedimentos da polícia e apontando os erros e as omissões.
Censo
Segundo a reportagem ‘Morador de favela consegue posse de área particular’ (pág. C5 da Edição SP), a favela Pullman tem cerca de 6.000 habitantes, ‘segundo dados da associação de moradores da área’. O jornal deveria adotar como norma usar sempre que possível os dados do Censo 2000 do IBGE, como fez hoje no texto ‘Morador queima ônibus em ato no Leblon’ (pág. C6). Segundo o Censo, 4.000 pessoas vivem na Cruzada São Sebastião. Se o jornal dispõe destes dados sobre o Rio, e regularmente os usa, deveria fazer o mesmo em relação a qualquer outra localidade. É mais preciso.
Energia
Não faria mais sentido ter editado juntas as reportagens sobre energia que estão em Ciência (‘Reator de fusão nuclear ficará na França’ e ‘Britânico quer vender Iter ao Brasil’) e em Dinheiro (‘Energia limpa atrai investimentos nos EUA’)?’