‘O leitor Marcelo Martine escreveu: ‘Tanta coisas boas estão acontecendo no Egito e vocês informam isto: ‘Quartel de Segurança do Estado no Egito é invadido por multidão’?’ a respeito da cobertura da Agência Brasil sobre os acontecimentos naquele país árabe.
É uma cobertura bastante limitada, tanto em termos de contextualização quanto dos fatos propriamente ditos. Feita a milhares de quilômetros de distância, com base em informações fornecidas pelas agências internacionais com as quais mantém parcerias: BBC Brasil, do Reino Unido e Agência Lusa, de Portugal, com autoridades do governo brasileiro e da embaixada do Egito, sem correspondentes na região, toda informação publicada pela ABr, nestas circunstâncias, deve ser lida com certa precaução.
Sem dúvida é uma tentativa de manter os leitores informados sobre os conflitos e suas possíveis soluções a partir da visão das fontes acima referidas, mas longe de significar um retrato completo e fiel dos acontecimentos, são apenas flashes que chegam até nós depois de passarem pelo filtro de diversos intermediários.
Tentar cobrir os fatos que acontecem nos países árabes pode ser uma tarefa inglória para os jornalistas e de pouco significado para os leitores da ABr. Talvez tentar explicar a origem histórica dos acontecimentos e dos fatores da geopolítica internacional que influenciam a região seja uma pauta mais indicada para a agência pública. Há muitos interesses em jogo como podemos observar no caso líbio onde a mídia internacional deflagrou uma campanha sistemática de ridicularizarão de seu líder Muammar Khadafi. Não vemos referência alguma aos feitos de seu governo que conquistou, entre outras coisas, o melhor Índice de Desenvolvimento Humano do continente com sua Jamahiriya, uma pratica de democracia direta e participativa que se contrapõe à democracia representativa (*).
Só para citar um exemplo de como os atores em conflito estão sendo tratados de maneira tendenciosa pelas agências internacionais, seguidas pela Agência Brasil, o exército líbio é designado como ‘as forças de Khadafi’, enquanto que os rebeldes são genericamente tratados como ‘a população’.
Achar que todas as manifestações que estão ocorrendo na região tenham as mesmas motivações é uma generalização perigosa – há indícios de que, pelo menos na Líbia, há mais petróleo em jogo do que ‘aspirações democratizantes’ (**). A artilharia de guerra de que está munida parte da oposição ao regime supera em muito as pedras, paus e coquetéis molotov que estamos acostumados a ver. Mesmo distantes nem todos os gatos são pardos – o clamor do povo árabe por liberdades democráticas tem nuances locais e regionais que precisam ser analisadas caso a caso, ditadura a ditadura.
Em nossa coluna Agência Brasil na guerra de informações, publicada dia 2 de fevereiro de 2009, destacamos:
‘Na sociedade da informação, a política internacional não é somente feita por meio da utilização da mídia, mas também percebida por intermédio dela. Ressalta-se que essa percepção oferecida pelos meios de comunicação não é uma pintura fiel de como o mundo é, mas, uma construção estruturada em todos os tipos de subjetividade inerentes ao homem. Por isso, considerar a mídia como um ator relevante no cenário internacional implica a responsabilização das suas atitudes nesse cenário. Com efeito, existe a necessidade de discursos mais plurais serem construídos. E quando o assunto é guerra, essa necessidade é ainda mais urgente, devido ao fato de que, quando não questionadas, a utilização de manipulações e propagandas não forma somente um consenso ou uma convenção entre os membros da sociedade internacional, mas injustamente legitimam a morte de milhões de seres humanos. O papel da mídia como ator deve igualmente ser
responsabilizado por participar, junto com outros fatores, dessa configuração.’ (***)
Até a próxima semana
(*) – disponível em: Líbia: onde se pratica a democracia direta
(**) – disponível em: Líbia: Toda a verdade
http://port.pravda.ru/russa/26-02-2011/31317-libia_russia-0/
(***) – Ecos do fragor: A invasão do Iraque em 2003 – A mídia internacional e a imprensa brasileira , tese de mestrado defendida por Julia Faria Camargo no Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília.’