Thursday, 19 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

Para quem estamos falando?

Participei do IV Congresso Brasileiro Científico de Comunicação Organizacional e Relações Públicas, de 20 a 22/5, em Porto Alegre, que debatia a comunicação pública. O tema é relevante e a discussão sobre ele deve necessariamente envolver diversos setores da sociedade, para que possamos implementar meios públicos de comunicação que efetivamente reflitam as necessidades dos brasileiros, contribuindo para a consolidação do direito à informação e, acima de tudo, envolva a população no processo.

Um dos painéis teve a participação de Jorge Duarte, assessor especial da Secretaria de Comunicação da Presidência da República, que fez uma apresentação dos avanços da comunicação governamental. Enquanto ele destacava o momento crucial por que nossa sociedade passa, com a realização de diversas conferências nacionais e, mais recentemente, a possibilidade de participar da formulação do marco civil da internet, por meio da consulta pública aberta até 30 de maio, um participante da platéia levantou a voz e perguntou, em tom de indignação: ‘Como é que nós não ficamos sabendo disso?’

Desconhecimento ou desinteresse?

Confesso que a situação me deixou pasma. Parecia inacreditável que um participante de um congresso sobre comunicação pública não tivesse conhecimento sobre um dos temas mais importantes do momento na área. Eu havia convivido com a consulta pública desde que foi lançada, em 27 de outubro do ano passado, já que nós, da TV NBR (a TV do governo federal) fizemos questão de noticiá-la e mostrar a importância da participação da sociedade no processo (ver NBR Notícias e NBR Entrevista). Além disso, o estabelecimento de regras para a internet estava em fóruns de tecnologia e jornalismo que acompanho. Ao consultar o Google, neste 27 de maio, encontrei 284 notícias sobre o tema, destacando a consulta pública e as propostas de regulamentação do uso da rede mundial de computadores no Brasil.

Depois de uma reflexão, percebi que a manifestação do colega congressista indicava um problema mais grave do que geralmente considerávamos em discussões sobre alcance dos veículos públicos de comunicação. Não é só a população economicamente limitada (sem acesso a jornais, internet ou TV a cabo) que não tem conhecimento de nossa existência, mas também públicos privilegiados, como pesquisadores e profissionais da própria mídia. Afinal, onde estão chegando as informações geradas pelos canais públicos, em especial os do governo federal, onde trabalho? A quem estamos informando, se nem os potenciais interessados em nosso conteúdo, como aquele congressista, têm conhecimento do que veiculamos? Para que tanto esforço em fazer um jornalismo governamental voltado para o cidadão se o próprio cidadão não tem acesso, não tem conhecimento ou simplesmente não tem interesse?

Como cumprir o papel de informar

Coincidentemente, o debate sobre a audiência dos veículos públicos de comunicação também ocorreu no Grupo de Trabalho específico sobre comunicação pública, governamental e política, ainda no congresso da Abrapcorp. Nessa discussão, mais aprofundada e restrita, devido ao número de participantes, constatou-se o desconhecimento sobre o assunto. No geral, quem trabalha em veículo público não sabe até onde ele chega, qual é o perfil de quem ‘o consome’, para quem está se produzindo determinado conteúdo, o que esse brasileiro quer e precisa de informação. O processo de produção de informação é intuitivo e não há medições qualitativas e quantitativas de público-alvo. Sabe-se que a audiência não é comparável – e nem deve ser – a de um veículo comercial, pois os fins são outros. Os públicos comunicam para cidadania (ou assim deveria ser). Os privados, para consumidores.

Há que se considerar que, tradicionalmente, o governo federal se comunica com a sociedade por meio de campanhas de publicidade e veículos privados. Com isso, a população se acostumou a ver a versão governamental dos fatos pelos olhos da grande mídia, ora com destaque porque o assunto interessa à empresa de comunicação, ora aglomerada em mínimos espaços de resposta. Isso quando o tema faz parte da agenda setting. Fora isso, como normalmente acontece com as consultas públicas, o tema é ignorado, mesmo sendo de importância para a sociedade e para o governo.

Tentando furar a intermediação dos meios tradicionais de comunicação, e estabelecer uma comunicação mais direta com a sociedade, surgem (e ressurgem, como é o caso da Voz do Brasil, que teve a parte destinada ao Executivo reformulada editorialmente em 2004) os veículos oficiais do governo federal e dos demais poderes. São jornais, rádios, televisões e sites, publicando notícias e conteúdos (como discursos na íntegra) o tempo todo. As informações estão ali. Mas apenas a disponibilização de dados é suficiente para que os poderes públicos cumpram seu papel de informar?

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Jornalista, coordenadora de produção da redação multimídia da EBC Serviços, responsável pela Voz do Brasil (parte do Executivo) e TV NBR – a TV do governo federal, Brasília, DF