Folha de S. Paulo, 14/4 Oposição de fato Três de cinco ex-presidentes brasileiros se encontram no Senado, sem que se tenha notícia de contribuições relevantes suas para o debate nacional. Luiz Inácio Lula da Silva, recém-saído do cargo, mantém temporário e bem-vindo silêncio, neste início de mandato da sucessora e correligionária petista, Dilma Rousseff. Diante de tal pasmaceira, coube ao tucano Fernando Henrique Cardoso agitar a cena política. A contribuição veio com o artigo ‘O Papel da Oposição’, publicado na revista ‘Interesse Nacional’. O foco do texto está em provocar a oposição -PSDB à frente- para sair da letargia diante do petismo. Para isso, ela precisa de uma estratégia, de um público-alvo e de um discurso (ou programa), que FHC se põe a alinhavar. A situação atual seria análoga à do MDB no início dos anos 70, quando o ‘milagre econômico’ angariava forte apoio popular à ditadura. Outro artigo de FHC, publicado na época com o mesmo título, apontou a necessidade de organizar uma frente antiautoritária para lutar pela redemocratização. Hoje, os êxitos do governo Lula parecem prostrar o PSDB e demais legendas oposicionistas. FHC, contudo, vislumbra uma plataforma para que superem a perplexidade, caso se mostrem capazes de transcender a política institucional e falar diretamente com a classe média em expansão. O ex-presidente dá como inócua a tentativa da oposição de disputar com o PT o apoio das ‘massas carentes e pouco informadas’. O governo, assinala com razão, dispõe de mecanismos de concessão de benesses mais eficazes que discursos no Congresso. O trecho pode ser entendido como uma crítica velada à emulação de políticas sociais lulistas. Seria o caso de programas de renda como o do governador paulista Geraldo Alckmin, ou da defesa irresponsável, sob o ângulo fiscal, de um salário mínimo de R$ 600, na campanha eleitoral de José Serra ou por parlamentares tucanos. A alternativa FHC é priorizar a nova classe média, cerca de 20 milhões de brasileiros incorporados nos últimos anos ao mercado de consumo. Esta seria mais receptiva a críticas da oposição à hegemonia petista, sobretudo às práticas de corrupção e cooptação de grupos econômicos escolhidos para receber benesses do BNDES. Como bem lembrou o diretor-geral do Datafolha, Mauro Paulino, o acesso a uma renda um pouco mais elevada não garante adesão automática a novos valores. Além disso, quase metade da população permanece nos estratos inferiores de renda e consumo, contingente de votos que não pode ser desprezado. Em outras palavras, a estratégia delineada por FHC demanda ousadia e implica risco eleitoral. É uma aposta em discurso que, diante dos limites e contradições da política petista, pode até provar-se correto. Fazer oposição de fato, alerta o ex-presidente, seria a única chance de sobrevida para o PSDB e os poucos partidos ainda não alinhados com Dilma. O Estado de S. Paulo, 14/4 Gustavo Uribe Para Alckmin, avaliação negativa sobre artigo de FHC foi ‘equivocada’ O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), considerou hoje ‘equivocada’ a avaliação negativa feita sobre o artigo escrito pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e divulgado na segunda-feira, sob o título ‘O Papel da Oposição’. No texto, feito para a revista Interesse Nacional, o tucano criticou o que chamou de ‘falsidades ideológicas’ do PT e ressaltou que o PSDB deve se aproximar da classe média e parar de disputar com o PT a influência sobre ‘os movimentos sociais e o povão’. Após evento na capital paulista, o governador elogiou o ex-presidente como o grande responsável pela inclusão social no País e ressaltou que as iniciativas de um governo precisam ser sempre voltadas aos mais carentes. ‘Eu acho que o texto foi tirado do contexto, uma avaliação equivocada’, afirmou. ‘Ele (FHC) é o grande responsável pela inclusão social no Brasil, por atender a população mais pobre’. O governador citou iniciativas do ex-presidente que, segundo ele, ajudaram a população de menor renda. ‘O Plano Real, por exemplo, à medida que tirou o imposto inflacionário, melhorou a renda da população’. Alckmin destacou a criação de uma rede de proteção social na gestão do ex-presidente, que incluiu programas como o Bolsa Escola, o vale-alimentação e o vale-gás, entre outros. ‘O governo trouxe a rede de proteção social que o Brasil não tinha. Ela mudou de nome, passou a se chamar Bolsa Família, mas na realidade começou com o Bolsa Escola’. De acordo com Alckmin, no artigo, o ex-presidente criticou o aparelhamento do Estado e o monitoramento dos movimentos sociais. ‘É evidente que o trabalho com a sociedade civil organizada e voltado à população de menor renda é extremamente necessário e é o nosso compromisso’, afirmou. O Estado de S. Paulo, 14/4 Daniela Milanese ‘Não sei como alguém estuda tanto para esquecer o povão’, diz Lula sobre FHC O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva criticou nesta quinta-feira, 14, em Londres, o artigo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso intitulado ‘O papel da oposição’, publicado na internet, na segunda-feira, pela Revista Interesse Nacional. ‘Não sei como é que alguém estuda tanto e depois quer esquecer do povão’, afirmou Lula, após participar de uma palestra a investidores da Telefónica. Para ele, fazem parte do povo as classes média e rica e os mais pobres. ‘O povão é a razão de ser do Brasil.’ Lula disse que o Brasil já teve político que disse preferir o ‘cheiro de cavalo ao do povo’, referindo-se a uma célebre frase do general João Batista de Oliveira Figueiredo, presidente durante o regime militar. Agora, afirmou Lula, tem ex-presidente ‘que fala que é preciso não ficar atrás, esquecer o povão’. ‘Eu não entendo, não sei o que ele (Fernando Henrique Cardoso) quis dizer.’ Lula discorda da avaliação de que o governo ‘engoliu’ a oposição no País. De acordo com ele, o Poder Executivo saiu fortalecido da eleição. ‘É assim mesmo, já fui oposição com 16 deputados’, disse. O ex-presidente avalia que a oposição não ‘capta’ o desejo do povo. ‘O povo não aceita mais oposição vingativa, com ódio, negativista. O povo brasileiro quer gente que pensa no Brasil’, declarou. ‘A oposição quer que tenha desgraça para poder ter razão.’ Após realizar a conferência aos investidores, Lula conheceu a Arena O2, área multiuso coberta localizada no centro do The O2, um grande complexo de entretenimento situado na Península de Greenwich, e deparou-se com a churrascaria brasileira Rodízio Rico. O ex-presidente provocou surpresa entre os funcionários brasileiros ao entrar no restaurante acompanhado do presidente mundial da Telefónica, César Alierta, do ex-ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior Luiz Fernando Furlan, do embaixador do Brasil na Grã-Bretanha, Roberto Jaguaribe, além de assessores. O Estado de S. Paulo, 14/4 Agência Estado FHC rebate críticas: ‘venci o Lula com o voto do povão’ O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) considerou ontem ‘precipitadas’ as reações a seu artigo O Papel da Oposição – publicado na revista Interesse Nacional e divulgado anteontem pela internet. ‘Me espantei com o tamanho da repercussão. Achei também precipitadas algumas reações, sobretudo da oposição que, pelo que pude perceber, disse coisas que acabam fazendo o jogo do PT’, afirmou ele ao jornal O Estado de S. Paulo. No artigo, o ex-presidente aprofunda uma análise sobre o que chama de ‘lulopetismo’, defende seus oito anos na Presidência (entre 1995 e 2002) e faz fortes críticas ao seu PSDB. No trecho que se tornou o foco central dos críticos e de incômodo para seus correligionários, ele sustentou que se os tucanos continuarem tentando dialogar com o ‘povão’ acabarão ‘falando sozinhos’, pelo fato de ‘as massas mais carentes e pouco informadas’, em sua opinião, terem sido ‘cooptadas’ pelo PT. Por isso, aconselha o partido a priorizar ‘as novas classes médias’, gente mais jovem e ainda não ligada a partido nenhum. Portanto, suscetível de ouvir a mensagem da social-democracia. ‘O que estou dizendo’, explicou Fernando Henrique, ‘é que o PT e o governo dispõem de poderosos meios em amplos setores de camadas pobres, mas cooptadas por sindicatos e centrais sindicais’. E acrescenta: ‘Também existe, é claro, um ?povão? na nova classe média’.