‘O impresso vai viver mais tempo do que as pessoas pensam’, aposta Mathias Döpfner, diretor da editora alemã Axel Springer, que recentemente registrou o primeiro trimestre mais rentável de sua história. A margem de lucro dos jornais nacionais é de surpreendentes 27%, e a empresa começa a expandir seus negócios para a Polônia. ‘Se os jornais estão em crise, então eu gosto de crises’, brinca Döpfner.
A revista britânica The Economist publicou, em sua mais recente edição [10/6/10], matéria intitulada ‘A estranha sobrevivência da tinta’, em que traça um panorama da indústria jornalística atual. Em países emergentes, é preciso olhar fundo para encontrar sinal de crise. No Brasil, destaca a revista, a venda de anúncios oscilou apenas brevemente durante a recessão global. A tiragem total dos jornais brasileiros expandiu em um milhão nos últimos 10 anos, para 8,2 milhões. A crescente classe média, por sua vez, está aderindo a títulos novos e mais baratos, cheios de notícias curtas e sensacionalistas. Em 2003, apenas três dos 10 maiores jornais do país eram tablóides. Hoje, há cinco deles no ‘grupo de elite’.
Sinais de recuperação
Já o grandioso mercado jornalístico dos EUA foi atingido fortemente pela crise econômica que teve início no segundo semestre de 2008. Nos últimos anos, a sobrevivência do jornal impresso tem sido posta em dúvida por inúmeras e complexas análises e teorias catastróficas. Os leitores migraram para a internet, onde conseguiam acesso gratuito a notícias. Os anunciantes também começaram a apostar no meio online, mas passavam longe dos sites de jornais. Páginas de classificados na internet, como a popular Craigslist, passaram a representar uma ameaça séria à indústria jornalística. Neste cenário, especulava-se, uma recessão poderia acabar de vez com os jornais, por conta dos altos custos de produção, impressão e distribuição de suas publicações.
A Newspaper Association of America, organização que representa cerca de dois mil títulos nos EUA e Canadá, divulgou que os anúncios impressos e online dos jornais americanos caíram 35% desde o primeiro trimestre de 2008. A circulação também sofreu uma queda drástica. Ainda assim, a maior parte dos jornais sobreviveu, embora com ajuda de cortes de falência nos EUA. Algumas empresas, como a McClatchy, que publica o Miami Herald, mantiveram-se rentáveis, mesmo com as receitas em queda. Algumas valem hoje 10 vezes mais que em 2009.
Para isso, aumentos nos preços dos jornais ajudaram, assim como pesados cortes de custos. No ano passado, a McClatchy reduziu sua folha de pagamento em 25%. Muitas publicações fecharam sucursais e implementaram programas de demissão voluntária. Outras optaram por adaptações, como a Gannett, onde 46 títulos locais publicam notícias nacionais e internacionais do USA Today, maior jornal do grupo. Os gastos com papel – a segunda maior despesa em muitas empresas jornalísticas, após pagamento de pessoal – caíram até 40%. Editoras passaram a usar menos papel, ao imprimir menos palavras, em fontes menores, em páginas cada vez mais finas.
A possibilidade dos preços de capa diminuírem quando a economia acelerar é apenas um dos riscos que as empresas jornalísticas enfrentam. Os leitores podem, por exemplo, se recusar a pagar preços mais altos por produtos menores. Há, no entanto, a possibilidade de a venda dos anúncios começar a se recuperar – se isto acontecer, as margens de lucro podem inflar rapidamente.
Novos focos e ações
A ênfase em dar aos leitores o que eles querem ler, em vez do que eles deveriam ler, faz parte de uma tendência global. Jornais estão cada vez mais focados nos interesses do consumidor, e investem em nichos. Nos EUA, muitos passaram a focar sua produção de conteúdo em notícias locais ou esportivas, deixando informações gerais para grandes agências de notícias, como a Associated Press e a Reuters. Algumas publicações também tomaram a medida polêmica de restringir sua distribuição, concentrando em áreas urbanas – de fácil acesso e mais atraentes para os anunciantes. A tendência, ao que parece, é que jornais menores sejam cada vez mais locais – o que, segundo o analista de mídia Jim Chisholm, pode ajudá-los a longo prazo.
Há, finalmente, a tendência de cobrança pelo conteúdo online dos jornais. Títulos respeitados no setor de economia como o britânico Financial Times e americano Wall Street Journal já cobram, com sucesso, pelo acesso a seus sites. A ideia é que jornais menores tentem fazer o mesmo com relação a conteúdo de interesse local.
Apesar de o cenário não ser tão catastrófico quanto parecia há alguns anos, a sobrevivência dos jornais, ressalta a Economist, não está garantida. Ainda há obstáculos estruturais: não se sabe, por exemplo, se os jovens, que cresceram na cultura gratuita da internet, aceitarão pagar por notícias. É certo que a recessão econômica, que poderia ter dizimado grande parte dos jornais impressos, acabou revelando neles uma habilidade impressionante e inesperada de adaptação. E isso serve de esperança para que, em tempos melhores, os jornais não apenas sobrevivam, mas gozem de uma vida longa e saudável.