O gol que o americano Donovan marcou no último minuto da partida contra a Argélia teve como decorrência imediata a classificação do time dos Estados Unidos para as oitavas de final da Copa do Mundo. Foi também, pelas reações provocadas no país do beisebol, uma espécie de carimbo a chancelar a inscrição definitiva do último dos grandes mercados – com a possível exceção da China – do esporte no circo do futebol, que sozinho disputa com os multidisciplinares Jogos Olímpicos o título de o maior espetáculo da Terra. Do ex-presidente Bill Clinton ao governador-estrela Arnold Schwarzenegger, passando pelos yuppies de Wall Street, a vibração pelo feito da equipe na África do Sul mostrou que o soccer é uma realidade esportiva – o que, na terra do marketing, é sinal de investimentos com retorno garantido.
Os números comprovam que, desde a antediluviana aventura de Pelé no Cosmos, na década de 70, o futebol tem conquistado um número cada vez maior de adeptos nos EUA.
Na Copa de 2002, a torcida americana ocupava o 13olugar entre as que assistiram à competição. Em 2006, pulou para a oitava colocação, e, este ano, a quantidade de americanos presentes na África é evidência de que o país cresceu no ranking das torcidas.
Fecha-se, assim, um círculo que faz do futebol um grande negócio transnacional, com interesses que transcendem as quatro linhas. A cada Copa, a Fifa põe à prova não apenas a capacidade de uma seleção suplantar as demais para levantar a taça. O Mundial movimenta não só redes e mexe com muito mais do que paixões. Quando um país se candidata a sediar a competição, liga uma máquina que envolve governos, a iniciativa privada, profissionais de marketing e dirigentes esportivos. O caderno de compromissos é uma plataforma de ação que implica pesados investimentos em infraestrutura.
Credibilidade em jogo
As engrenagens não admitem enguiços ou incompetência.
Pela grandeza do evento e pelos interesses nele envolvidos, a Copa do Mundo não é para iniciantes, nem dá lugar a espertezas regionais. É espetáculo importante demais para ficar nas mãos, por exemplo, de cartolas mal-acostumados com pequenezas clubísticas. Com o compromisso de sediar o Mundial de 2014, o Brasil parece não ter despertado ainda para a era do profissionalismo das quatro linhas para fora. Dentro do campo, o país vem se saindo muito bem desde 1950 (salvo um ou outro período de entressafra de craques). Prova disso é que apesar do amadorismo (para dizer o mínimo) na forma como os clubes brasileiros são administrados, continuamos a ser um celeiro de ótimos jogadores – do que o pentacampeonato da seleção é prova irrefutável.
A qualidade do futebol brasileiro está acima de dúvidas. O preocupante é que o selo não pode ser estendido aos cartolas do país, e de maneira geral aos entes envolvidos na preparação da Copa de 2014. O puxão de orelhas da Fifa na CBF, em maio, e mais recentemente a supressão do Morumbi do grupo de estádios para a competição são dois exemplos de que por aqui a competência ainda não entrou em campo (e de que a entidade não brinca em serviço). É bom que o faça o quanto antes, pois no mundo ultraprofissionalizado da bola improvisação e manha não têm vez. E tanto quanto mais um título para o futebol brasileiro, no caso particular do próximo Mundial estará em jogo a credibilidade do país para promover competições desse nível.