A nova-iorquina Leandra Ramm é uma meio-soprano com mais do que música na cabeça. Leandra é assediada e perseguida via internet por um internauta de Cingapura. Seu cyber-stalker já postou cerca de quatro mil mensagens online nos últimos cinco anos, chamando-a de sem talento e trapaceira. Ele também criou um blog com o nome dela e deixou mensagens obscenas em seu site.
Leandra procurou ajuda da polícia americana, que afirma não poder fazer nada a respeito, já que as ofensas são cometidas em Cingapura, e não em território americano. A meio-soprano procurou então a polícia de Cingapura, que, por sua vez, não demonstrou nenhum interesse no caso. Ela afirma que sua carreira, vida social e bem-estar emocional sofreram muito desde que teve início a perseguição online. Leandra recebe ameaças de morte diárias, assim como seus amigos, familiares, colegas de trabalho e até seu chefe. ‘Sinto-me humilhada, desamparada e vítima de abuso’, desabafa.
Uso cada vez maior da rede
Polícia e promotores afirmam que o cyber-stalking – uso persistente da internet, email, redes sociais e programas de mensagens instantâneas para perturbar ou ameaçar outras pessoas – está crescendo no mundo e que ainda não há ferramentas legais para combatê-lo. Um estudo do Escritório de Estatísticas de Justiça nos EUA estima que a prática via web tenha atingido ¼ das 3,4 milhões de vítimas de perseguição registradas na faixa etária de 18 anos no país em 2006. De acordo com Mike Proctor, detetive na Califórnia com mais de 20 anos de experiência em casos de perseguição, há cada vez mais ameaças pela internet.
Rachel MacKenzie, psicanalista que lidera um programa comportamental sobre o tema na Austrália, alega que muitos agressores que usavam de meios tradicionais agora ameaçam suas vítimas pela internet. Para alguns deles, a rede mundial de computadores é apenas uma ferramenta a mais; outros a vêem como único meio de ataque. O que importa é que as vítimas podem ficar tão vulneráveis quanto as ameaçadas fisicamente. ‘Há sempre o medo de que a perseguição entre no mundo real’, afirma Rachel. Birgit Roth, detetive especializada em cibercrimes na Alemanha, diz que as ameaças pela internet estão presentes em 40% dos casos de perseguição investigados por sua equipe. Ela afirma que as vítimas ficam tão traumatizadas como, por exemplo, os sobreviventes de um acidente de avião.
A penúria imposta às vítimas pelos agressores virtuais parece motivá-los. Uma vítima grávida disse que se tranca em casa e tem ‘pensamentos mórbidos’ todos os dias: se sua criança nascerá ou crescerá sem um dos pais. Seu stalker, um ex-colega com histórico militar, a ameaça por meio de redes sociais, prometendo atacar fisicamente sua família. O problema da perseguição online é tão grave que até o presidente dos EUA, Barack Obama, já o abordou publicamente.
Legislação não acompanhou crime virtual
Como ocorre com muitos outros crimes cometidos via internet, ainda não há legislação correspondente para perseguições na rede. O caso da meio-soprano Leandra Ramm mostra que a internet eliminou as barreiras físicas: é comum que os agressores molestem suas vítimas de outros países. Muitos provedores de serviços de internet e empresas com base nos EUA, como Google, Yahoo! e Facebook, requerem ordens de um tribunal para que informações sobre agressores virtuais sejam entregues no país de seus escritórios. Isto pode custar tempo e dinheiro.
Nazir Afzal, da Promotoria Pública da Coroa Britânica, alega que tais pedidos podem demorar até três meses. Já um stalker do ‘mundo real’ pode ser preso em poucas horas. Além disso, Afzal lembra que os provedores de serviço da internet em geral apagam os dados de emails depois de 30 dias. Se a vítima também tiver apagado o email, a evidência pode ter desaparecido para sempre.
Ferramentas tecnológicas dão aos stalkers mais flexibilidade. Softwares especiais permitem que eles enviem e-mails sem serem rastreados. Investigadores alegam que também não conseguem monitorar as mensagens instantâneas. Não é surpreendente, portanto, que as vítimas tenham pouca confiança de que o sistema judiciário criminal possa protegê-las. Segundo a psicanalista britânica Emma Short, quase 1/3 das vítimas alegam que sofreram pelo menos um sintoma de distúrbio de estresse pós-traumático.
Alexis Bowater, executivo-chefe do instituto britânico Network for Surviving Stalking (Rede para sobreviver à perseguição), lançou uma campanha para que países da União Europeia adotem uma conduta comum: hoje, apenas 12 dos 27 países-membros do bloco têm leis específicas contra este tipo de ameaça. Ela quer que outros sigam o exemplo do Reino Unido. Lá, a polícia avalia cada caso para o risco da violência; promotores emitem normas sobre como lidar com os casos e esquemas para que os criminosos recebam tratamento quando condenados. Informações da Economist [22/4/11].