Muito se fala sobre a prática do ‘turismo de difamação’ no Reino Unido, em que estrangeiros que se sentem ofendidos por alguma publicação abrem processo no país por conta de suas leis mais rígidas de calúnia de difamação. A legislação, considerada arcaica, é tema até de promessas políticas: no ano passado, o governo de coalizão anunciou planos de reformá-la para tentar aumentar a proteção à liberdade de expressão na mídia. Mas eis que, enquanto se dá bastante atenção ao problema que se resolve nos tribunais, outro ameaça a liberdade na internet. Em artigo [3/5/11] no blog The Lay Scientist, no site do jornal britânico Guardian, o pesquisador Martin Robbins fala sobre como provedores e companhias que hospedam sites se tornaram o calcanhar de Aquiles do jornalismo online.
Ele exemplifica a ameaça. Em janeiro de 2008, a empresa de hospedagem Netcetera recebeu um email de um representante legal de Joseph Obi, que se descrevia como ‘visionário da medicina alternativa’ e ‘o médico mais controverso do mundo’. Obi havia sido expulso do conselho de medicina do Reino Unido e alegava ter liderado uma equipe em uma universidade que não existe, e acabou alvo do blog Quackometer, que investiga sites suspeitos sobre procedimentos médicos e curas milagrosas e era hospedado pela Netcetera.
Irado por ter sido mencionado no blog, Obi pediu a seu advogado para ameaçar a Netcetera a ser obrigada a pagar 1 milhão de libras por dia, além de danos adicionais aos meses em que o material ‘difamatório’ tornou-se acessível por meio do servidor. A empresa optou, então, por remover as páginas que citavam o visionário médico. Por fim, acabou retirando do ar o blog inteiro. O Quackometer foi relançado em outro servidor e a resposta da internet foi espalhar o material na rede.
Tudo a perder
O episódio mostra como é fácil tirar, com uma simples ameaça, um site do ar. Se antes o jornalismo impresso tinha total controle das gráficas e linhas de distribuição, o jornalismo online acabou cedendo o controle a servidores e sites que têm conteúdo gerado por terceiros. Esta perda de controle traz muita vulnerabilidade – o servidor ou a rede social onde está o conteúdo tem o poder de simplesmente apagá-lo.
O problema é que não se pode nem ao menos culpar as companhias de internet – como a Netcetera, por exemplo – por tirar sites ameaçados do ar. Elas não podem se dar ao luxo de arriscar enfrentar caros e longos processos legais por causa de clientes que pagam uma quantia moderada por mês. Ao comprar brigas deste tipo, sites de hospedagem têm pouco a ganhar e tudo a perder – eles são, basicamente, o lado fraco que os acusadores e seus advogados podem facilmente explorar. E exploram.