Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Dunga e Maradona na hora da verdade

Futebol tem dessas coisas. Ou, como diria Noel Rosa, quem acha, vive se perdendo. Brasil e Argentina saíram da Copa principalmente devido à arrogância dos seus respectivos técnicos. Dunga, que devia se chamar Zangado, passou quase todo o tempo brigando com a imprensa. Maradona, que ganha do nosso técnico em termos de carisma, ficou o tempo todo de salto alto, desfazendo dos adversários. Ambos provavelmente se esqueceram daquela máxima de que o futebol é uma caixinha de surpresas.

Vale notar, no entanto, uma diferença básica entre o estilo dos dois ex-craques do futebol. Enquanto Dunga saiu de campo de cabeça baixa, nitidamente decepcionado com o desempenho de seus atletas diante da Holanda, Dieguito fez questão de adentrar o tapete para abraçar e beijar seus rapazes num gesto de companheirismo e solidariedade frente à derrota para a Alemanha. Verdade seja dita, os jogadores brasileiros entregaram os pontos e saíram do sério na hora do vamos ver, enquanto os argentinos lutaram bravamente e sem perder a cabeça.

Essa diferença resulta principalmente do estilo e da postura de cada um dos dois técnicos. Esse tema, aliás, poderia até inspirar consultores empresariais que lecionam cursos de liderança para executivos de grandes organizações. Dunga, o irritadiço que guarda mágoa no congelador, acabou influenciando negativamente o comportamento de sua equipe.

Mandinga ou superstição

Até mesmo o equilibrado ‘irmão’ Robinho estava nitidamente nervoso, gritando palavrões na cara dos adversários e do juiz durante a partida decisiva. Enquanto isso, conhecidos pela agressividade em campo, os argentinos surpreenderam pelo comportamento esportivo, relativamente ameno. O jogo contra a poderosa Alemanha foi moderado, sem discussões desnecessárias ou cenas de violência e estupidez como a que resultou na merecida expulsão de Felipe Melo do nosso time, no dia anterior.

Curiosamente, em certo momento, o goleiro alemão fez uma defesa extraordinária, esmurrando a bola na pequena área como Júlio César tentou fazer no momento fatídico em que o mesmo Felipe a desviou para a rede marcando gol contra. Diante da derrota iminente já no meio do segundo tempo, Dunga permaneceu paralisado e sequer mexeu no time com a lucidez que a situação exigia. Ele já havia cometido esse erro por não substituir Kaká antes de sua expulsão, na partida contra a Costa do Marfim.

Outro ponto importante a ser observado é que os jogadores brasileiros raramente se saem bem nas partidas em que trocam a camisa amarela pelo uniforme azul e branco. Parece mandinga ou superstição. Esse fato, inclusive, já poderia ter merecido um estudo sobre a influência subjetiva das cores na psique dos atletas em momentos de decisão.

A indelicadeza do tango

De qualquer forma, o ‘cala boca, Galvão’ parece ter surtido efeito, já que o famoso locutor estava rouco durante a partida Brasil e Holanda. Ele certamente pressentia o perigo, pois sabia que aquele era de fato o nosso primeiro grande adversário na África do Sul. No final da disputa, diante do inegável fracasso da seleção brasileira, ficou se desculpando, dizendo que não devemos esquecer que isso é apenas futebol. Vale lembrar que a Rede Globo e boa parte da imprensa alimentaram a ilusão da torcida sem fazer as devidas críticas ao desempenho medíocre de nossos atletas diante de times inexpressivos, que não têm tradição futebolística.

O suposto desentendimento de Dunga com a direção da CBF, no episódio Fátima Bernardes, já atestava a falta de entrosamento e harmonia no comando da seleção. A convocação de alguns jogadores que parecem ser meros produtos de marketing apontava para os riscos de uma derrota decepcionante, o que de certa forma demorou a acontecer. Um time, por melhor que seja, sempre corre o risco de ser derrotado. No entanto, o Brasil jogou pouco e não conseguiu reagir à ação da ‘laranja mecânica’ holandesa, única de suas adversárias que estava à altura do seu futebol.

No circo armado pela mídia e pelos patrocinadores da Copa, novamente a seleção brasileira se destacou mais nos bastidores do que propriamente nos jogos que realizou. Fizemos uma campanha abaixo do nosso dever de pentacampeões do mundo e só mesmo quem não entende nada de futebol poderia supor que chegaríamos à grande final com uma equipe tão acanhada.

A Globo, que dourou a pílula até o último minuto, ainda teve a indelicadeza de azarar os argentinos ao mostrar a reação de Maradona diante dos gols da multirracial seleção alemã ao som de um clássico do tango, logo após a partida. Deviam ter levado a sério as óbvias palavras do Galvão: isso é apenas futebol. Será mesmo?

Escritor e jornalista, Belo Horizonte, MG