Não é de hoje que pululam situações em que a grande imprensa agiu contra a vontade da população brasileira com sucesso incontestável. De tão recorrente o assunto foi tema de meu artigo ‘A paixão conservadora‘, neste Observatório da Imprensa. O fato é que a grande imprensa parece estar vivendo seu momento de eclipse, situação em que já não brilha tanto e sua luz parece perder potência, força, influência. Sinal disso é a luta desfraldada por liberdade de expressão no Brasil, um país em que, sejamos honestos, pode faltar qualquer coisa, menos liberdade de expressão.
É que travestido como liberdade de expressão, na verdade, temos nada menos que a hodierna luta para manter o status quo midiático por liberdade de pressão, liberdade de impressão. E tudo isto, em análise preliminar, não passa da luta por liberdade absoluta visando promover o pensamento único das classes dirigentes, as chamadas ‘zelites’, com seu verniz exalando trocentos anos. E isto acontece como elemento aglutinador de veículos que deveriam ser vistos ao menos como concorrentes na missão de informar a população. Assim como governos desastrosos – sejam de direita ou de esquerda – para não ser derrubados precisam eleger um inimigo externo, também na luta midiática há que se eleger como inimigo comum a defesa da liberdade de expressão. E qual parte desta última frase o leitor não entendeu?
Comitês de campanha
A última semana foi marcada pela Batalha Twitter 2010: o senador Álvaro Dias foi anunciado para brevíssimo vice-reinado na chapa da oposição capitaneada por José Serra; batalhas antigas foram reencenadas pelos generais-de-campo Roberto Jefferson, Cesar Maia, Rodrigo Maia, Ronaldo Caiado. Em cada conjunto de 140 caracteres ficamos sabendo que o Democratas ameaçava deixar o barco tucano; que o presidente de outro partido aliado postara que o Democratas era um partido ‘menor’ (a palavra por ele usada não cai bem neste texto); que a convenção do Democratas foi suspensa a maior parte do dia; que Álvaro Dias foi desalojado sumariamente da função e que o deputado carioca Índio da Costa estava na cabeça da chapa.
Tantas voltas e reviravoltas e tão pouco espaço midiático! Ler o que a imprensa publicou nos dias 29 e 30/6 – e mais os do dia 1/7 – oferece-nos robustas pistas para entender como é a dinâmica de uma imprensa profundamente partidarizada: colunistas, comentaristas políticos e editoriais proclamavam soluções por eles mais adequadas a fechar a chapa de José Serra. Diziam os nomes de seus preferidos e elencavam o potencial eleitoral de cada um, a beleza física não era nem descartada – como escreveu conhecido jornalista, ‘poderia trazer beleza à chapa e até mesmo servir como âncora no programa eleitoral, além de ser mulher’ – etc., etc. Foram dias em que as grandes redações tornaram-se apêndices de comitê de campanha eleitoral. E pensar que 1/10 dessas trapalhadas se ocorressem no quintal do vizinho o mundo viria abaixo…
Diretriz clara
A verdade é que há quase um ano a grande imprensa vem atuando intensamente para levar o presidente Lula à frigideira e… não consegue. O óleo de dossiês parece não facilitar a fritura do governo. Muito ao contrário, Lula vem mantendo popularidade impressionante e, mais que isto, provando ser possível fazer a transfusão dessa popularidade para benefício de sua candidata, ex-poste, ex-boneca de ventríloquo, ex-sem idéias, jejuna de eleições.
Não sei se seria sensato inferir que a população parece vacinada contra esses artifícios eleitorais apresentados como atividade jornalística regular. Parece que a população criou anticorpos que anulam qualquer armação produzida em laboratórios da grande imprensa. Não obstante tudo isto, a diretriz é clara: há que se manter o discurso que a grande imprensa é imparcial e isenta.
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Mestre em Comunicação pela UnB e escritor; criou o blog Cidadão do Mundo; seu twitter