Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A má fama de nossa democracia

‘Hoje todos os jornais do país têm o mesmo pensamento. E até mesmo o estilo começa a ser igual para todos.’

Estes e outros alertas de Fábio Konder Comparato estão na revista Insight Inteligência (Ano XII, número 49, junho de 2010, disponível aqui).

Diz o professor e profissional de Direito:

‘Eu sou um homem marcado pelos meios de comunicação de massa. Meu nome é absolutamente banido. Briguei com o Estadão por uma causa nobre no começo dos anos 70 do século 20. Naquela época, o jornal publicou um artigo deprimente sobre um padre francês que era meu amigo e eu usei o direito de resposta, via Lei de Imprensa, que ainda não havia sido revogada pelo Supremo Tribunal Federal. Entrei com uma ação judicial, ganhei, e eles foram obrigados a publicar. A partir dali, nunca mais mencionaram o meu nome.’

Pode um jornal, por mais poderes que tenha – e o Estado de S.Paulo é um dos maiores do país – ser acusado de prejudicar um intelectual do porte de Fábio Konder Comparato por ‘não mencionar o nome’ dele? Se o professor fizer jus a ser objeto de matéria da imprensa, por mais prestigioso que seja um jornal que resolva censurar a simples menção de seu nome, todos os outros, grandes, médios ou pequenos, não precisam acolher a restrição.

Ele prossegue:

‘Na Folha de S.Paulo, escrevi durante trinta anos, graças ao convite de Octavio Frias [de Oliveira], um sujeito muito interessante, que não tinha nada de democrata, mas era muito inteligente. Ele gostava muito do que eu escrevia e pediu ao filho (Otavio Frias Filho), de quem eu fui professor na Faculdade de Direito, para eu escrever regularmente no jornal.’

Falhas geológicas preocupantes

O tempo passou. Em fevereiro do ano passado, a Folha de S.Paulo publicou um editorial polêmico, no qual afirmava, criando um insólito neologismo, que ‘o regime militar brasileiro tinha sido uma ditabranda‘.

Fábio Konder Comparato mandou uma carta ao jornal dizendo que o autor daquele editorial e o diretor de Redação deviam pedir desculpas ao povo brasileiro. E de joelhos. A carta foi publicada, mas com a seguinte resposta, referindo-se a ele e à também professora Maria Victoria Benevides: ‘Esses professores são cínicos e mentirosos, pois nunca atacaram regimes ditatoriais como o cubano.’

O professor publicara no mesmo jornal, fato reconhecido pelo ombudsman, uma carta criticando o regime cubano. Ele processou o jornal, perdeu em primeira instância, recorreu e aguarda uma decisão final.

No depoimento, Fábio Konder Comparato diz também que defende ‘a criação de ouvidorias populares para acompanhar os trabalhos do Judiciário’, que ‘não se tem ideia do grau de corrupção dos tribunais’ e que ‘o dia em que o grande público tomar conhecimento do nível de corrupção, a casa do Judiciário cai’.

Suas afirmações merecem mais do que réplicas ou tréplicas. Merecem repercussões na mídia para que os temas ali levantados sejam amplamente discutidos sem qualquer tipo de censura, pois, a julgar por suas reflexões, a democracia que praticamos tem falhas geológicas preocupantes.