Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Outro estrondoso silêncio

Alguém se perguntou por que as grandes revistas, os jornalões e as redes de TV não deram o mínimo destaque à política no fim de semana?

Pois a CartaCapital deu. Em matéria que não recebeu atenção alguma na imprensa, ao contrário do que vem sendo feito há quatro meses contra Lula e o PT.

Por que será?

CONFRARIA TUCANA

ECT superfaturou R$ 48 milhões no governo FHC, revela CartaCapital

A revista CartaCapital desta semana denuncia que um empresário acusa a Empresa de Correios e Telégrafos (ECT) de superfaturamento de R$ 48 milhões em licitação promovida no governo de Fernando Henrique Cardoso (FHC). Veja o texto de Leandro Fortes:

Há cinco anos, repousa em uma gaveta do empresário catarinense Edson Maurício Brockveld um envelope lacrado de papel pardo. Em uma das faces do invólucro estão registradas cinco assinaturas de membros da Comissão Especial de Licitação dos Correios. Dentro, segundo ele, está a prova de que a corrupção na ECT começou — ou tinha prosseguimento — ainda no governo Fernando Henrique Cardoso.

Dono da Brockveld Equipamentos e Indústria Ltda., o empresário espera a hora de abrir publicamente o envelope. Quer provar ter sido preterido em uma concorrência, em 2000, em favor de duas empresas estrangeiras, a alemã Siemens e a francesa Alstom, ambas com propostas supostamente superfaturadas.

Brockveld alega ter calculado em R$ 48 milhões o contrato de compra de equipamentos de movimentação e triagem de carga interna oferecido à ECT. A dupla vencedora cobrou quase o dobro. De quebra, diz o empresário, as escolhidas passaram a gerenciar outros três contratos no valor de US$ 100 milhões (R$ 280 milhões).

Em 22 de dezembro de 1999, a ECT abriu a concorrência internacional 016/99 para compra e manipulação de equipamentos de sistemas de movimentação e triagem interna de carga. Interessado no negócio, Edson Brockveld conta ! que, nos dois anos anteriores à licitação, desenvolveu, junto ao setor de engenharia dos Correios, diversos equipamentos e realizou testes em parceria com as empresas Portec e Buschman, ambas dos Estados Unidos.

Segundo ele, a pedido da diretoria da ECT, a Brockveld Equipamentos chegou a trazer engenheiros americanos para fazer as demonstrações e, assim, ganhar a confiança da direção da estatal. O presidente da empresa era Hassan Gebrin, ligado aos grupos políticos do governador do Distrito Federal, Joaquim Roriz (PMDB), e do então senador, atual deputado, José Roberto Arruda (PFL-DF). A indicação havia sido avalizada pelo então ministro das Comunicações, Pimenta da Veiga.

Para garantir uma boa posição no processo licitatório, a Brockveld fez um consórcio com a japonesa NEC, uma das gigantes mundiais do setor de tecn! ologia de ponta. Pelo acordo, cada empresa seria respons&aacut! e;vel po r um setor. A empresa brasileira cuidaria do maquinário de movimentação postal e a NEC dos equipamentos de comunicação e segurança. Dois dias antes da licitação, no entanto, sem nenhum sinal prévio, conta Edson, o então diretor da NEC no Brasil, Marcos Sakamoto, informou à Brockveld que não poderia participar da licitação. Alegou, segundo o empresário catarinense, atender a um pedido da direção da Siemens, que não queria a participação das duas empresas na licitação.

No dia da abertura das propostas, Edson Brockveld diz ter sido diretamente convidado pelas empresas Mannesmann Dematic Rapistan, Siemens e Alstom a não participar da concorrência da ECT, pois estaria tudo certo que as duas últimas seriam as vencedoras da licitação. Brockveld alega ter ignorado a oferta e participado, ! assim mesmo, do processo.

No dia da licitação, o edital previa que fossem abertos os envelopes relativos à habilitação técnica e comercial. Porém, ao ser constatado que a Brockveld Equipamentos iria participar da licitação, e pelo fato de os concorrentes não saberem se a empresa estava ou não com os documentos em ordem, foi feita uma proposta à ECT de emissão de um parecer único da proposta técnica e de habilitação, em desacordo com o estabelecido no edital de licitação.

Feito isso, a Brockveld e a Mannesmann acabaram sumariamente inabilitadas tecnicamente. A Mannesmann imediatamente recorreu, mas teve o pedido indeferido. Ambas receberam, lacrados, os envelopes com as propostas de volta. Siemens e Alstom foram as escolhidas. Detalhe: a empresa francesa embolsou US$ 15 milhões e deu o cano na ECT. Está sendo ! processada pelos Correios, mas foi substituída, em segu! ida, pel a NEC.

Logo depois, a direção da Brockveld foi procurada pela empresas vencedoras. Teriam pedido para que ela não entrasse com recurso administrativo. Em troca, os executivos da Siemens e da Alstom dariam parte do projeto para a perdedora. Ou seja, comprariam da empresa brasileira os equipamentos previstos no contrato.

Com a Alstom, o acordo foi assinado na noite do dia 23 de fevereiro de 2000. A empresa foi representada, segundo Edson Brockveld, por um diretor chamado Jean Bernard Devraignes. A Siemens, no entanto, esperou a data-limite para entrada de recurso, 24 de fevereiro de 2000, para assinar o acordo, em Brasília. Naquele dia, para ter certeza de que tudo sairia conforme combinado, Hélcio Aunhão, diretor da Siemens, foi ao aeroporto da capital federal encontrar com Brockveld, então disposto a entrar com o recurso administrativo contra o resultado da licitação, o que nunca aconteceu. Depois de assinados os contratos, no entanto, as empresas vencedoras não honraram os acordos.

Edson Brockveld, então, esperou o momento certo de se vingar. A crise desencadeada a partir das denúncias de corrupção, justamente nos Correios, lhe pareceu a oportunidade ideal. Na quinta-feira 22, o empres&aacu! te;rio foi ao Congresso Nacional para entregar toda a documentação sobre o caso à senadora Ideli Salvati (PT-SC).

Disse a ela ter tomado a iniciativa de denunciar o caso agora porque, impedido de participar da licitação e traído por empresas internacionais, achava que a CPMI dos Correios iria se interessar pelo caso. Por isso havia decidido ir pessoalmente ao Senado. Ele disse à senadora que, em princípio, não tem interesse em entrar em briga judicial contra a ECT, mas pretende acionar a Siemens e a Alstom por quebra de contrato.

A NEC, substituta da Alstom, teve, em 2004, o contrato aditivado nos porcentuais previsto na Lei de Licitação, o que não ocorreu com a Siemens. A empresa alemã, então, entrou com uma ação contra os Correios. O processo está correndo na Justiça Federal de Brasília. A decisão dos Correios levou ! o deputado José Roberto Arruda a procurar o ex-ministro! das Comunicações Eunício de Oliveira e registrar protesto em nome da Siemens.

******

Jornalista, Jundiaí (SP)