Na revista Época desta semana (nº 635) um destaque para os modos de melhorar a educação nacional. Com base nos resultados do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) de 2009, as jornalistas Ana Aranha e Heliana Frazão propõem para o próximo governo federal quatro ideias.
Primeira ideia, ‘a obsessão da leitura’. Alunos que leem mais tornam-se mais curiosos, escrevem melhor, conversam com profundidade. Não é ideia nova, mas precisa sair do mundo das boas palavras e se tornar obsessão coletiva, envolvendo pais, professores, secretários de Educação, prefeitos, comunicadores, empresários.
A ideia, portanto, deve obcecar mais gente, a sociedade inteira. Iniciativas como a da jornalista e escritora Alessandra Pontes Roscoe, por exemplo, merecem ser conhecidas e apoiadas.
A segunda sugestão da revista Época para os candidatos à presidência é ‘foco no professor’. Pressupõe-se que boa parte dos nossos problemas educacionais reside na formação precária do docente brasileiro. Contudo, não basta atentar para o professor e dele cobrar excelência. Existem situações que inviabilizam as mais apuradas ações didáticas.
Bala perdida
A morte do menino Wesley, de 11 anos, vítima de uma bala perdida no Ciep Rubens Gomes (Rio de Janeiro), transformou em número vazio o 4,9 que indicava, apesar de tudo, ter aquela escola atingido a meta do Ideb para 2015. Um tiroteio em plena luz do dia ao lado de uma escola. Não era novidade ou exceção. O Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação tem denunciado que pelo menos outras 200 escolas estão cercadas e invadidas pela violência e pelo tráfico. O foco no professor deve ser precedido e acompanhado por outros focos bem mais desafiadores. Foco no professor, aliás, pode servir como desculpa para não focar as famílias destroçadas e as crianças que se tornaram reféns do crime.
Pequeno detalhe, grandes mudanças
A terceira e a quarta ideias dizem respeito ao acompanhamento de todos os alunos e à valorização explícita e exemplar dos esforços individuais. O pequeno detalhe é que essas medidas requerem grandes mudanças. Uma dessas mudanças é que se aumente o número de professores e se diminua o número de alunos por classe. É assim que se realiza educação personalizada.
Se as prefeituras, os governos estaduais e o MEC privilegiarem o ‘projeto pedagógico’ de criar adultos a serem apenas consumidores e consumíveis do mercado, considerando como perdas ‘normais’ milhares de alunos que ficam pelo caminho, basta empilhar nas salas de aula a maior quantidade possível de corpos, tendo à frente um número limitado de professores mal remunerados, que lutam para conseguir, ao menos, um pouco de disciplina.
Tema complexo
As sugestões, em tese, são boas, e os candidatos Dilma, Serra e Marina devem conhecê-las. Mas que reportagens como esta saibam enfatizar a complexidade do tema. O subtítulo que a revista escolheu, ‘O país já conhece as diversas políticas que melhoram a qualidade da educação. O desafio do próximo presidente é disseminá-las’ desconsidera aspectos políticos que interferem na percepção da educação, especialmente em tempo de campanha eleitoral.
Chama a atenção, para citar um único caso, a irresponsabilidade do Estado de S. Paulo, ao publicar, em matéria do dia 18/7, sem a menor ressalva, declaração do atual secretário de Educação de São Paulo, Paulo Renato, empenhado na campanha do PSDB: ‘São Paulo tem hoje o melhor ensino do país. Temos muitas experiências boas para levar ao Brasil’.
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Doutor em Educação pela USP e escritor – www.perisse.com.br