Thursday, 28 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1316

O MST da G

Isso, o Jornal Nacional não deu: invadiram uma gleba de 12 mil metros quadrados no bairro do Brooklin, na Zona Sul de São Paulo, uma das regiões onde o terreno é dos mais caros do país. Avaliado em 12 milhões de reais, o cobiçado pedaço de chão está localizado na Avenida Água Espraiada, esquina com a Avenida Dr. Chucri Zaidan, numa região que sofreu a mais radical intervenção urbana da cidade nos últimos anos, transformando-se num grandioso polo de desenvolvimento.

Desta vez, os invasores não pertencem ao Movimento dos Sem Terra – MST. Neste caso, os posseiros ou grileiros – como eram chamados no passado aqueles que se apropriavam de terra alheia – são integrantes da família Marinho. A família é dona de um grande conglomerado de mídia no Brasil, que inclui, entre seus empreendimentos, a Rede Globo de Televisão, uma das cinco maiores empresas de comunicação do mundo e a maior da América Latina.

Os invasores (a seguir denominados MST da G, ou seja MST da Globo) foram mais longe. Avançaram para a rua. Conseguiram, antes do início de uma edificação no local, onde era uma praça pública, mudar o nome da Avenida Água Espraiada para a do patriarca da família, o ‘companheiro jornalista’ Roberto Marinho. E nesta esquina começaram a erguer um prédio, que já está com fundações e subindo pavimentos.

Há dez anos, depois que abandonou a pocilga que ocupava na Praça Marechal Deodoro, no centro, e construiu sua sede paulistana na Avenida Dr. Chucri Zaidan, a Rede Globo de Televisão vinha limpando e mantendo a praça pública invadida, cercada como se fosse propriedade particular, com acesso apenas para seus funcionários.

Local não resiste a uma simples vistoria

Incansável e utilizando como slogan o principal objetivo da plataforma política do MST, que é ‘lutar pela terra’, o MST da G pressionou politicamente, forçou e conseguiu do governo de São Paulo a doação da área para construção de uma escola. Agora, o MST da G é literalmente dono do pedaço. Já está construindo no terreno, depois de invadi-lo por vários anos, uma escola técnica voltada para a mídia eletrônica. Os cursos, com 240 vagas por semestre, serão de multimídia e produção de áudio e vídeo. Instalada ao lado dos estúdios da Globo, a escola deverá ficar pronta em 2011.

É de se espantar. Não se tem notícia até hoje na cidade de São Paulo de uma doação de terreno de tais proporções (12 mil metros quadrados), numa área tão valorizada, para a iniciativa privada construir um curso técnico. Nem mesmo uma escola, uma faculdade ou até uma universidade.

Resta ainda uma dúvida fundamental. O novo prédio do MST da G será utilizado só pelos alunos do curso técnico? Não há garantias. Quem conhece a primeira edificação da Avenida Dr. Chucri Zaidan, ao lado da futura escola, sabe que tanto para atender o jornalismo, como as produções dos programas gravados em São Paulo, as instalações globais não são suficientes para abrigar o número de profissionais que ali trabalham. Sobra programa e gente e o local não resiste a uma simples vistoria da prefeitura.

O mesmo que tirar o sofá da sala

Num voto de confiança, porém, vamos admitir que o governo de São Paulo acreditou e o MST da G pretende mesmo destinar a nova construção apenas para cursos técnicos voltados ao público externo. Ainda assim, considerando o número de alunos e a duração dos cursos, a Globo despejará num mercado saturado quase 500 novos técnicos a cada dois anos. Ou seja: também não se justifica mais uma escola com tais características.

O argumento é simples. Num rápido percurso por São Paulo, da Cantareira, na Zona Norte, até Campo Limpo, na Zona Sul, passando pelo centro da cidade e seguindo até a divisa de Osasco, na Zona Oeste, e Itaim Paulista, na Zona Leste, encontraremos mais de 20 faculdades de Comunicação, com ofertas de cursos de jornalismo, rádio e TV. Se, por hipótese, cada uma dessas instituições de ensino formar 100 profissionais por ano, temos 2 mil novos técnicos a cada 12 meses no mesmo mercado disputadíssimo ao qual a Globo deseja entregar mais 500 profissionais a cada 24 meses, para justificar a posse de um nobre terreno que invadiu.

Essa Malhação é o mesmo que tirar o sofá da sala, segundo a velha anedota de uma grande Passione. O assunto devia render mais ti ti ti, mas em clima de zorra total o caso soa mais como piada do Louro José.

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Jornalista