A sociedade brasileira vive seu momento crucial que poderá ou não definir a identidade política do país e fixar novos paradigmas sociais, uma espécie de itens avaliadores do seu futuro. E qual será o papel da imprensas nesse processo? Fundamental, se exercido com competência, denodo e persistência. Em raras ocasiões esse aspecto da formação histórica da sociedade brasileira veio à baila como esta semana. Embora tenha sido mantido ainda dentro da superficialidade com que os temas sérios são tratados entre nós, foi possível exibir esse tema graças à discussão sobre a caducidade dos documentos históricos. Ou, o tempo em que eles precisarão ficar conservados em segredo, inacessíveis, para que sua acessibilidade não seja prejudicial ao país.
As opiniões manifestadas por congressistas como o presidente do Senado, José Sarney, variam entre 50 anos e a eternidade. A origem de formação política do Congresso brasileiro ainda deixa muito a desejar; ou seja, a formação do poder político no Brasil de hoje traz de forma brutal traços herdados do nosso passado. Por exemplo: como combater ou neutralizar a expansão da criminalidade num país cuja polícia militar tem uma orientação essencialmente patrimonialista? Ou seja, para as polícias militares é mais importante proteger a propriedade privada do que a cidadania.
Os embates políticos, as novas propostas de ação política dos novos governos têm sido um alento na desmitificação de certos conceitos arraigados e pequenas frestas por onde caminharão os novos paradigmas norteadores do futuro.
Novos paradigmas
Qual o papel da mídia nesse contexto? Aprofundar na investigação jornalística e ousar na divulgação de temas petrificados por tabus políticos prejudiciais ao avanço da cidadania. Há um temor generalizado entre as forças componentes do establishment cultural e militar em relação à revisão histórica porque, com ela, a desconstrução de alguns mitos será inexorável. Fala-se até em se reescrever a história do país. Como o desmiolamento de um pedestal em torno de uma figura lendária para a Marinha brasileira, como o almirante Barroso, cuja desmitificação como herói nacional por historiadores está na certeza de que ele nunca navegou sequer uma canoa, quanto mais um navio.
Há uma grande dúvida em relação à participação do Brasil na guerra do Paraguai. Há fundadas razões para acreditar que ela nunca existiu. Mas a exibição de documentos poderia levar à desmitificação total de alguns heróis brasileiros dali originários.
De fato, é iminente a criação de novos paradigmas, mas eles só serão possíveis com novas rupturas políticas, atitude aparentemente ainda distante desse Congresso que aí está.
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[Reinaldo Cabral é jornalista, escritor e editor do site da Aalong]