Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Economia, política ou esporte?

Boa parte do material econômico e político mais quente – e com frequência mais escandaloso – tem sido proporcionado pela cobertura do Congresso Nacional. Numa semana a Veja mostrou como a Medida Provisória 517, conhecida como Frankenstein, permitiu a banqueiros quebrados entregar papéis podres para quitar débitos com a União. Na semana seguinte a Folha de S.Paulo noticiou, em manchete, a inclusão, em outra MP, de uma cláusula de sigilo sobre os orçamentos da Copa 2014 e da Olimpíada 2016.

No caso do sigilo, pode-se qualificar a manchete da Folha como um furo. No mesmo dia, quinta-feira (16/6), outros grandes jornais ou falharam em dar a notícia ou a publicaram meio escondida, como se fosse desimportante. Seria impossível, nos dias seguintes, ficar longe do assunto.

Na sexta (17), o Globo deu uma cobertura discreta, dedicando ao tema a segunda metade de uma reportagem sobre regras para a Copa no caderno econômico. A Folha manteve o material na primeira página do primeiro caderno, como grande tema político. Nem política, nem economia, foi a decisão do Estado de S.Paulo. Até o fim da semana o leitor encontraria os textos no caderno de Esportes.

Sigilo até o fim das licitações, por prazo pouco maior ou por tempo indefinido? Políticos deram respostas diferentes a essas perguntas. Os meios de comunicação reproduziram as interpretações. Mas faltou, como é frequente, a apresentação dos textos. Em algumas notícias tinha havido referência a trechos da MP, mas sem citação literal e completa das passagens mais importantes, O leitor curioso teria sido beneficiado, se as coberturas, além de citar as opiniões das autoridades interessadas, houvessem reproduzido as palavras da MP. Bastaria citar as passagens onde houvesse referência ao sigilo e indicar, num auxílio ao leitor, se prazos e condições de divulgação eram ou não mencionados.

Este é um problema recorrente quando se cobre a tramitação de projetos de lei ou de MPs. Gasta-se muito espaço com a reprodução de opiniões e de interpretações, em geral de políticos interessados, e dá-se ao leitor pouca informação textual sobre os documentos. Neste caso, um dos consultados declarou desconhecer o texto, mas assim mesmo opinou.

Desinformação técnica

Nessa mesma semana os pauteiros de Economia tiveram pouco trabalho para descobrir assuntos. A crise grega continuou a agravar-se. A cada dia o país ficou mais perto do calote, enquanto se repetiam os protestos de rua contra as medidas de austeridade – até agora, pouco eficazes para tirar do buraco as contas públicas. De modo geral, o noticiário dos grandes jornais foi suficiente para manter o leitor informado.

No Brasil, a presidente Dilma Rousseff lançou a segunda etapa do programa Minha Casa, Minha Vida. Mais uma vez as dificuldades políticas do governo e seus projetos polêmicos ofuscaram a chamada “agenda positiva”.

Outro fato importante, o lançamento do Plano Agrícola 2011-2012, também não provocou grandes emoções. O assunto é irrelevante, especialmente por causa das perspectivas do mercado internacional, mas só um jornal, o Valor, tratou extensamente de política agrícola durante a semana.

A maior parte dos grandes jornais cobre pouco e mal o agronegócio. Dão alguma atenção a certos investimentos, fusões e compras de empresas, mas passam longe, na maior parte do tempo, dos assuntos ligados à produção agropecuária. Quanto tocam no assunto, frequentemente demonstram desinformação técnica. O tema ficou relegado a cadernos semanais, como se pudesse interessar somente aos profissionais da área. É uma avaliação discutível.

Mais cobertura

O superávit comercial brasileiro só é garantido pelas exportações do agronegócio. A produção agropecuária de tipo comercial é uma das mais eficientes do mundo e, por seu conteúdo tecnológico, só por um hábito muito enraizado se pode chamá-la de atividade primária.

Num mundo carente de comida e com demanda crescente de proteínas – consequência da urbanização de centenas de milhões de trabalhadores nas economias emergentes –, a produção do campo assume uma importância insuspeitada há vinte anos. É hora de repensar o assunto e de investir um pouco mais numa cobertura atenta e competente da agropecuária.

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[Rolf Kuntz é jornalista]