Thursday, 28 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1316

Direito de autor, internet e democracia

Por mais argumentos que ouça, não acredito que a “flexibilização” dos direitos autorais resulte em democratização da cultura. Estou convencido de que muita gente boa escolheu a bandeira errada e, como inocentes úteis, defendem interesses das grandes empresas de comunicação.

Deslumbrados com os brilhos ilusórios que costumam rondar o conceito de liberdade, não percebem que a peleia bonita, que há décadas deveria congregar a classe artística, seria pressionar rádios e TVs – concessões públicas, nunca é demais lembrar – para que exerçam suas funções educativas, veiculando a produção cultural local. E que paguem pelo uso das canções. Mesmo que um músico decida disponibilizar sua obra para download gratuito na internet – decisão plenamente louvável – ele sempre terá o direito de que a utilização dos fonogramas com fins lucrativos, na rádio, na TV, em uma casa noturna, ou onde for, seja devidamente remunerada. A defesa do não-pagamento dos direitos autorais é tiro no pé que tão somente aos barões pode interessar.

Ainda que acabar com os direitos de autor fosse uma maneira efetiva de democratizar a cultura, seria algo tão estapafúrdio quanto iniciar um processo de reforma agrária pela expropriação das pequenas propriedades. O Estado poderia, isto sim, desenvolver programas para levar a música a todos os cantos do país, envolvendo nisso o manancial de compositores que hidrata nossa cultura. Todos devidamente remunerados. Além de uma forma de socialização da arte, essa política resultaria em incentivo real à cadeia produtiva da música.

Quem se habilita a peitar os graúdos?

Como editor da revista digital ZoomRS, tenho como um dos principais instrumentos de trabalho a internet. No entanto, considero ingenuidade acreditar no “território livre” da rede mundial de computadores, enquanto todos sabem que a coisa nasceu nas mãos do exército norte-americano e que estará sempre sob sua tutela – pelo menos enquanto durar o império. Nesse sentido, promover a não-regulamentação da web resulta em atitude tão neoliberal quanto defender a pseudo-anarquia do livre mercado. A história já ensinou: para os trabalhadores, regulamentar é sempre a melhor opção.

Tratando de evitar mal-entendidos e aproveitando para aclarar conceitos, até para elevar o nível do debate, cabe aqui fazer a devida distinção entre a defesa do software livre e a apologia do software pirata. Enquanto o primeiro realmente traz em si o espírito democrático e colaborativo, o segundo não passa de apropriação indébita. Da mesma forma, se por um lado disponibilizar mp3 gratuito é uma alternativa válida, por outro, renunciar ao direito autoral é uma opção carente de sentido.

Enfim, fazer alarde em nome da liberdade parece atrair bastante gente. Mas quantos se habilitam a peitar os graúdos da comunicação?

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[Carlos Hahn é jornalista, editor da revista digital ZoomRS]