Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Perto no comércio, distante na informação

Enquanto um conjunto de dados econômicos demonstra as relações positivas entre Europa e América Latina, que reforçam a proximidade cultural historicamente existente, os meios de comunicação europeus há tempos veem a informação latino-americana como uma de suas últimas prioridades.

Isso contribui para gerar no Velho Continente um novo estado de opinião que distancia a América Latina dos interesses europeus.

Na Cúpula Euro-Latino-Americana, realizada em Madri em maio, foram fechados acordos de livre-comércio com a América Central e alguns países andinos e relançadas as negociações com o Mercosul.

As informações sobre os acordos e sobre a própria cúpula ganharam espaço secundário na maioria dos meios de comunicação europeus, ou passaram despercebidas.

Maturidade política

A União Europeia (UE) é hoje a principal parceira comercial do Mercosul. A UE exporta mais para a América Latina do que para a China, e seus investimentos na região superam os que ela tem nos Brics (Brasil, Rússia, Índia e China). O comércio inter-regional dobrou entre os anos de 1999 e 2008.

Em contrapartida, se observamos os graus de importância atribuídos pela imprensa europeia às diferentes regiões do mundo, o primeiro é ocupado pelo próprio continente; o segundo, pelos Estados Unidos; o terceiro, pela Ásia; o quarto, pela África; apenas depois disso vem a América Latina.

Essa foi a conclusão unânime dos jornalistas especializados em América Latina dos principais veículos de imprensa europeus, reunidos em seminário de diretores de ambas as regiões organizado pelo governo da Espanha e pela agência Inter Press Service (IPS), no contexto da presidência espanhola da União Europeia.

De acordo com alguns analistas latino-americanos, essa região deixou de ser ‘notícia’ para a Europa por não haver mais golpes de Estado, ondas de exilados e violações maciças dos direitos humanos.

Outros consideram o fato resultante da falta de visão de jornalistas europeus, que não notam a tendência de crescimento e integração regional, que reforça o papel da América Latina no plano internacional.

Poucos meios de comunicação europeus têm destacado que a recessão que afeta profundamente os Estados Unidos, a Europa e o Japão pela primeira vez não afetou em grande medida os países do Sul.

Foi assinalado que as crises que afetaram os países latino-americanos -assim como os asiáticos- em períodos anteriores os levaram a adotar um rigor maior, rigor este que se traduziu em situação financeira sólida que, somada à maturidade política, trouxe estabilidade e reforçou o sistema democrático.

Olhando com atenção para a relação entre as agendas da Europa e da América Latina, percebem-se aspectos de coerência e incoerência.

Tendências comerciais

Enquanto elas convergem nos planos da inclusão social, das liberalizações, dos direitos humanos, da repressão ao narcotráfico e do terrorismo, o protecionismo -especialmente o agrícola-, os temas relativos à migração e os rescaldos do colonialismo -como o conflito entre Argentina e Reino Unido em torno das ilhas Malvinas- separam as duas regiões.

A complexidade desses fenômenos exige níveis maiores de preparo dos comunicadores. Alguns dirigentes europeus pensam que seus países estão ‘desatentos’ em relação à América Latina.

Mas um informe recente da Cepal (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe) observa que as relações bilaterais exigem mais atenção, já que, apesar de as duas regiões estarem ligadas pelo passado, o comportamento dos mercados vai determinar os novos tipos de alianças.

De fato, a projeção das tendências comerciais atuais indica que, em 2020, a principal parceira comercial da América Latina será a China, não mais a Europa.

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Diretor-geral da agência de notícias Inter Press Service (IPS)