Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Há chances para política especulativa?

Inegavelmente, as discussões sobre estratégias especulativas têm ocupado um espaço importante nas ciências políticas. Na verdade, este é o grande artifício das campanhas eleitorais no contexto político brasileiro atual. No nosso entender, algumas dessas estratégias são fáceis de serem identificadas; no entanto, há outras que necessitam de maior atenção por parte dos eleitores.


Nosso objetivo, seguindo a jornada na cobertura eleitoral, é discutir as características da especulação política, sua visão psicológica dos fenômenos. Para fins didáticos, num primeiro momento explicaremos o que entendemos por estratégia especulativa e em seguida refletiremos a relação entre especulação e política.


Dificilmente acharíamos um arranjo institucional capaz de moldar e cultivar características de como uma pessoa deve se comportar na política. Mais do que isso, não acreditávamos haver um pacote de instruções determinando um conjunto de ações indicando o que precisa ser incentivado e o que necessita ser reprimido no comportamento cotidiano de um candidato. Todavia, fazendo um balanço das últimas campanhas eleitorais, somos obrigados a pensar que, dependendo do caso e da frequência, há a implantação de um guia determinando a pertinência de certas atitudes. Para alguns analistas, essa seria a ‘vontade política’, a qual não teria problema nenhum em ser e estaria correta, porém essa visão fundamentada na promoção progressiva ou na própria manutenção representativa das escolhas eleitorais pode ter uma origem disciplinar e especulativa.


Explicando melhor: quando um candidato exige uma modificação social abrupta muito abrangente e a sua aparente falta de ousadia no que se refere a propostas extingue qualquer possibilidade de diálogo, alegando descontentamento com as instituições existentes, culpabilizando a tudo e a todos, buscando repetidamente insinuar que só ele tem a verdade e que nada mais vale, nesse contexto estamos diante de um político especulativo com uma estratégia especulativa.


A lógica da preocupação


Mas, de fato, quem é o político especulativo? Segundo John Stuart Mill, o político especulativo é aquele que trabalha com uma teoria ampliada para dar conta das motivações emocionais – não olha a experiência específica, mas a abrangência das notícias: ‘Deve ficar satisfeito em não tomar nenhuma parte na política prática; em não ter nenhuma opinião ou sustentá-la com extrema modéstia, nas aplicações que devam ser feitas de suas doutrinas às circunstâncias existentes’ [retirado do artigo ‘Transformando ‘verdades abstratas’ em ‘verdades concretas’: Uma análise sobre a metodologia econômica de Stuart Mill‘, acessado em 10/09/2010].


A estratégia especulativa é como a posse de títulos de crédito de uma empresa estrangeira sem obrigações com o Estado, ou seja, não se tem certeza, nem ao menos segurança, do comprometimento da empresa com os interesses da nação. De fato, o papel das instituições sociais na manutenção da ordem social descarta qualquer tentativa de modificar de forma repentina e generalizada as principais regras da organização social. Os custos associados a uma eventual ruptura da ordem social seriam incalculáveis e poderiam significar a perda das principais conquistas de uma nação e a volta a um estado de risco indesejado.


Para ser capaz de prever estratégias especulativas em uma campanha eleitoral é necessário levar em conta outras leis psicológicas além das consideradas nas ciências sociais, ou colocando de outra forma, a ciência a ser usada na aplicação é a da própria política especulativa.


Não cabe aqui e foge a nossa competência estabelecer os termos de um confronto entre uma análise conceitual e histórica do princípio da política especulativa, que moldou e acompanhou, decisivamente, a modernidade política, mesmo quando ela foi instrumento de emancipação na sociedade. Entretanto, acreditamos estar contribuindo com essa discussão porque a escolha eleitoral e os rumos da política brasileira seguem fundamentados na lógica especulativa da preocupação com o contexto institucional e como ele influencia os resultados econômicos, de um lado, e as constantes tentativas de incorporar a ética à sensação de satisfação e bem estar social, do outro.

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Psicólogo social, Porto Alegre, RS