’17/10/2005
A crise política e as investigações provocadas pelas acusações de corrupção praticamente desapareceram das capas das edições dos jornais e revistas de fim-de-semana. O cardápio está diversificado com a aproximação do referendo, o foco de febre aftosa, a aproximação da gripe aviária e outros tantos assuntos novos. A Folha trouxe, no domingo, a discussão sobre o futuro da crise em duas páginas: ‘Lula vê crise no fim e já prepara campanha’ (A7) e ‘Crise está longe do fim, dizem analistas’ (A8).
DOMINGO:
Folha – ‘Procuradoria suspeita da ação de fundos’.
‘Estado’ – ‘Brasil, Venezuela e Argentina negociam acordo nuclear’.
‘Globo’ – ‘Referendo causa corrida por armas e munição’ e ‘Crianças já vivem na escola guerra de facções do tráfico’.
‘Veja’ – ‘Um fantasma assombra o PT’ [referência ao caso Celso Daniel].
‘Época’ – ‘Stress x Coração’.
‘IstoÉ’ – ‘Como gastar menos para manter a saúde’.
‘Carta Capital’ – ‘Sim ou Não? A questão é outra’ [sobre o referendo].
SEGUNDA:
Folha – ‘Petistas esperam STF para renunciar’.
‘Estado’ – ‘Focos de aftosa aumentam e já afetam balança comercial’.
‘Globo’ – ‘Relatório do Tribunal de Contas põe o Favela-Bairro em xeque’.
‘No Planalto’
Oportuna iniciativa do jornal o lançamento do blog ‘Nos bastidores do poder’, de Josias de Souza (pág. A6 da Folha de DOMINGO). O futuro do jornalismo também passa por esta forma ainda não consolidada de informação e análise de notícias. E o momento não poderia ter sido melhor do que este. Continuamos mergulhados numa crise política que exige um trabalho contínuo de acompanhamento das investigações oficiais e de investigação jornalística dos bastidores da política.
Mas o leitor do jornal impresso perde com o fim da coluna dominical ‘No Planalto’.
Não entendi a lógica da decisão. Não há incompatibilidade em manter uma coluna dominical de informação e análise no jornal, como era a coluna de Josias de Souza, e o blog. Aliás, são trabalhos complementares.
Fundos de pensão
Pareceu-me imprópria a edição do material sobre os fundos de pensão, ‘TCU investiga ação suspeita de grandes fundos de estatais’ (A4), sob o chapéu do ‘Escândalo do ‘mensalão’. Como a reportagem informa, a investigação do TCU vai de 1997 a 2004 e, pelo que pude entender, não faz referência direta às acusações de corrupção em foco. A foto escolhida, que mostra três presidentes de fundos prestando depoimento numa CPI, também faz parecer que as investigações do TCU têm a ver com uma das três CPIs em andamento. Tem? Se tem, a reportagem não informa.
Referendo
O caderno ‘O duelo do referendo’ está bem na parte de serviço e fica evidente o esforço da Redação de fazê-lo o mais isento e equilibrado possível. Conseguiu fugir do maniqueísmo da discussão. Mas, senti falta de:
1 – Mais e diferentes opiniões a respeito da discussão principal que está em jogo, a da liberdade e a dos direitos dos cidadãos. Os dois artigos (de Celso Antônio Bandeira de Mello e de Dalmo de Abreu Dallari) exploram apenas alguns aspectos da questão. Teria valido ouvir mais opiniões. Os artigos, no mesmo domingo, de Janio de Freitas (‘Pelo sim, pelo não’, pág. A5) e do psicanalista Renato Mezan (‘A posse abstrata’, pág. 3 do ‘Mais!’) e, na edição de hoje, de Vinicius Torres Freire (‘Armas, aborto, drogas etc’, pág. A2) e João Sayad (‘A arte de proibir’, A2) comprovam que a discussão poderia ter sido mais rica com mais artigos ou pequenos depoimentos. Aliás, os dois artigos mereciam ter tido extratos na capa do jornal.
2 – Um questionamento das pesquisas, estatísticas e estudos usados pelos dois lados e que parecem manipulados.
As razões para o ‘não’ e para o ‘sim’ estão balanceadas, embora não consiga entender por que são sete argumentos de cada lado, e não três ou dez. Esta fórmula, usada pelo jornalismo sempre que quer parecer isento, é artificial . Tanto que os sete argumentos da Folha são diferentes dos sete escolhidos pelas revistas ‘IstoÉ’ e ‘Veja’, que também elegeram o mesmo número cabalístico.
Pecuária
Continua o embargo à carne de Mato Grosso do Sul, mas está permitido o comércio da carne desossada daquele Estado (‘Incertezas continuam’, pág. B10 de ‘Dinheiro’ de Domingo). Por que uma pode e a outra não? Não vi explicação na Folha.
‘Esporte’
A nota ‘Marcelinho salva equipe’, pág. D2 da Edição de Domingo de ‘Esporte’, não informa contra que time o Braziliense jogou.
Sábado 2
A Folha repetiu, na edição de sábado, o mesmo artigo, com traduções diferentes, de Alan Riding, do ‘New York Times’. Em ‘Mundo 2’ ficou com o título de ‘EUA se isolam em discussão da Unesco sobre cultura’ (pág. Especial A2) e em ‘Dinheiro 2’, com ‘EUA ficam isolados em acordo de diversidade’ (pág. B16).
Falta de matéria e de coordenação.
14/10/2005
As notícias são mais ou menos as mesmas – febre aftosa, condenação dos laboratórios que boicotaram os genéricos, crise política, morte do legisla em São Paulo, Prêmio Nobel de Literatura. Mas as escolhas das manchetes variam.
Folha – ‘Petistas cassáveis vão recorrer ao STF’. ‘Estado’ – ‘Lula culpa fazendeiros por surto de febre aftosa’. ‘Globo’ – ‘Boicote aos genéricos dá a laboratórios multa inédita’.
A Folha fez grandes mudanças na capa da Edição São Paulo para incluir o tumultuado jogo do Corinthians com o Santos e o caderno de moda. Manteve a foto (muito boa) do chão da represa esvaziada no interior de SP, mas esqueceu a seca na Amazônia. Segundo o ‘Globo’, já ‘falta comida’ na região atingida.
‘Painel do Leitor’
Será que nenhum leitor escreveu mensagem ao jornal com pontos de vista diferentes das duas publicadas hoje (‘Direita, esquerda’) a respeito do artigo de ontem de Emir Sader e das quatro com críticas ao governo federal (‘Mais do mesmo’)? Será que os nossos leitores têm todos as mesmas opiniões?
Pelo menos o senhor Celso Balloti teve a oportunidade hoje de voltar a expressar a sua opinião sobre Paulo Maluf.
Escândalo do ‘mensalão’
Embora atrasada em um dia em relação ao ‘Estado’, a entrevista com o presidente eleito do PT, ‘Delúbio induziu petistas, afirma Berzoini’, está bem conduzida, principalmente nas perguntas iniciais. Ali estão, com clareza, os principais pontos da estratégia de defesa do PT em relação às acusações de corrupção.
Segundo o ‘Estado’, o PT protocola hoje o pedido de cassação do deputado Onyx Lorenzoni, do PFL do Rio Grande do Sul e da CPI dos Correios.
Caminho das águas
O jornal dá o devido destaque ao estudo do Bird sobre a transposição do rio São Francisco (‘Bird vê lacunas em projeto de transposição’, pág. A10). O título do infográfico – ‘O estudo do Banco Mundial’ – é , no entanto, inadequado: o mapa e os gráficos sobre a vazão de água ilustram a página mas não mostram as lacunas e os problemas apontados pelo estudo. Poderiam ilustrar qualquer reportagem sobre transposição.
Pecuária
O presidente Lula ‘culpou em parte os fazendeiros pelo foco da doença em Mato Grosso do Sul’, como informa a Folha na capa de ‘Dinheiro’ (‘Lula nega falta de verba para combater aftosa’). Os fazendeiros não deveriam ter sido ouvidos?
Por erro meu, ficou incompreensível a última frase da Crítica Interna de ontem sobre a febre aftosa. A cobrança ainda faz sentido: ‘O jornal já deveria ter enviado um jornalista especializado para Eldorado’. O que diferencia a cobertura do ‘Estado’ de hoje em relação à Folha é exatamente a presença de repórteres na região afetada e seus relatos testemunhais: ‘Gado anda livre pela região isolada’.
Não batem as avaliações da Folha e do ‘Estado’ em relação ao impacto da febre aftosa em MS no preço da carne bovina nos açougues de São Paulo nos próximos dias. A Folha (‘Aftosa deve contaminar a inflação, prevê Fipe’, pág. B4) prevê o aumento dos preços, enquanto o ‘Estado’ (‘Com embargo, carne mais barata’) calcula que os preços cairão. A ver.
Ensino
Não teve o destaque que merecia a entrevista do ministro da Educação, Fernando Haddad, em Portugal, ‘País investe em educação menos do que diz’ (pág. C8 da Edição SP).
Referendo
A Folha agiu corretamente ao não associar a prisão do deputado estadual José Nader Júnior (PTB-RJ) – ‘Acusado de pesca ilegal, deputado do Rio é detido com três revólveres e uma pistola’, pág. A6 da Edição SP – ao referendo, como fez o ‘Globo’. O jornal do Rio publicou a notícia – ‘Deputado do ‘Não’ preso por porte ilegal de armas’ – como a principal informação da página do referendo. É claro que a prisão do deputado não tem nada a ver com a consulta. Como saiu no ‘Globo’, é campanha para o ‘Sim’.
Estiagem
A Folha ainda não se sensibilizou com o drama dos amazonenses atingidos pela seca. O relato da repórter enviada à região atingida está jogado num pé de página, espremido, na Edição Nacional (‘Seca e isolamento fazem custo de vida disparar nas cidades do AM’). Mesmo na Edição SP, onde o tratamento é melhor, a cobertura não faz jus ao impacto do fenômeno. Além da falta de sensibilidade, é um desperdício de recursos do jornal.
O esvaziamento de uma represa no interior de São Paulo acabou tendo mais destaque (com a chamada na primeira página do jornal) do que a seca na Amazônia.
13/10/2005
Folha e ‘Estado’ destacam a cobertura dos estragos provocados pela localização do surto de febre aftosa numa fazendo de Mato Grosso do Sul. O texto da Folha se limita a informações oficiais dos governos federal e estadual.
Folha – ‘Após achar foco, governo quer fundo contra aftosa’. Não entendi a razão do ‘Após achar foco’. O foco foi achado e divulgado na segunda-feira. É uma crítica ao governo? É apenas para encher as quatro linhas da manchete?
‘Estado’ – ‘Aftosa: UE vê descaso do Brasil’ e ‘Preço do boi gordo deve cair 32%’.
‘Globo’ – ‘Febre aftosa veio de área do MST ou do Paraguai’ (a manchete é para a bandidagem na polícia, ‘Quadrilha na PF do Rio era formada por seis policiais’).
‘Valor’ – Ignora o assunto na capa. Manchete: ‘Investimento produtivo será o maior em 11 anos’.
‘Gazeta Mercantil’ – ‘Prejuízo de US$ 1,5 bi com aftosa’ (manchete: ‘Competitividade perde sem a MP do Bem’).
Com os destaques devidos à febre aftosa, à seleção brasileira de futebol e aos fenômenos climáticos (como a seca na Amazônia), a crise política perdeu espaço nas capas dos jornais.
‘Painel do Leitor’
O leitor Celso Balloti apenas manifestou, no dia 12, uma opinião (carta ‘Maluf’). Como o nome indica, o ‘Painel do Leitor’ foi criado para abrir espaço para que os leitores da Folha comentem as reportagens e artigos do jornal e os temas cotidianos. Se as cartas dos leitores também passarem a receber respostas de assessores de imprensa, como na edição de hoje (‘Maluf’), o ‘Painel’ perde de vez o seu objetivo. Se o jornal pretende equilibrar as opiniões sobre o tema, o correto é publicar cartas de outros leitores com posições diversas. Será que nenhum leitor escreveu uma carta entendendo a posição de Maluf ou contestando os argumentos do senhor Balloti?
Pecuária
Achei a cobertura publicada hoje pelo ‘Estado’ sobre o foco de febre aftosa localizado em Mato Grosso do Sul mais completa do que a da Folha. Embora a decisão da União Européia de suspender as importações de carne br asileira seja conhecida desde terça-feira, somente ontem os 25 países aprovaram formalmente a medida e divulgaram as razões, que é o que interessa sob o ponto de vista jornalístico. Segundo o correspondente do ‘Estado’ em Genebra, a União Européia acusou o Brasil de ‘falta de preparo’ por não ter tomado medidas propostas anteriormente.
Li no ‘Estado’ e no ‘Globo’ outras informações que não encontrei na Folha: ‘Vírus da aftosa pode ser mutante’, suspeita-se de que possa ter sido uma contaminação criminosa, suspeita-se que possa ter havido contaminação pela proximidade dos rebanhos do Paraguai e/ou do MST, e o prejuízo final pode ser bem maior do que o que se calculou inicialmente.
A cobertura da Folha, além de menor (menos de uma página), é feita a partir de Campo Grande e se restringe à recuperação da visita do ministro à fazenda atingida (que fica a mais de 400 quilômetros) e a informações oficiais. O jornal já não deveria ter enviado um jornalista especializado para Eldorado.
Nova paisagem
A reportagem ‘Bexiga ganha ‘jardim das árvores decepadas’ (pág. C4) não ouve a Prefeitura de S. Paulo. Segundo a reportagem, como ontem foi feriado não foi possível falar com uma autoridade.
Imagino que a Prefeitura deva ter argumentos técnicos razoáveis para fazer o corte radical nas árvores e a explicação deveria estar na reportagem. O jornal e os seus leitores não perderiam nada se a reportagem fosse adiada por um dia e publicada completa. No caso, não é só o problema da obrigação de ouvir o outro lado. A própria compreensão da reportagem ficou prejudicada. As explicações que saíram são apenas especulativas.
O final do texto da mesma reportagem na Edição Nacional ficou incompreensível por conta dos cortes (jornalísticos) que sofreu. O que o secretário do Verde e do Meio Ambiente quis dizer com a frase ‘Não vou admitir ninhos no chão’? Fora de contexto, a frase não quer dizer nada.’