Caco Barcelos, o ex-brilhante jornalista brasileiro que há anos se dedica a um programa jornalístico da TV Globo, Profissão Repórter, deve estar precisando tirar umas boas férias ou mudar de profissão. O desperdício de tempo e espaço no programa de terça-feira (19/4) sobre alcoolismo no meio universitário foi a prova contundente dessa necessidade.
Primeiro, a impressão que o programa deixou é de que não havia palavras a pronunciar – as imagens da embriaguez dos estudantes nas portas nas faculdades já falavam por si mesmas. Segundo, o caráter didático que o espaço televisivo permite foi completamente anulado pela ausência de inquietação jornalística que deve nortear um assunto tão palpitante quanto o alcoolismo que domina a juventude brasileira, hoje entre os 17 e 25 anos, e não apenas os estudantes universitários.
O vácuo provocado por essa ausência de inquietação jornalística produziu uma pergunta que o jornalista responsável pelo programa deveria se fazer toda vez que pautasse um assunto para levar ao ar: para que serve este programa ou esta matéria? Quais são seus objetivos? Apenas levar a informação ao grande público ou instigar as autoridades da área a tomarem alguma iniciativa para enfrentar os problemas apresentados?
Um grande hábito rotineiro na grande mídia é a discussão da pauta. Custa acreditar que a forma precária como se fez a reportagem para o Profissão Repórter tenha passado antes por uma discussão de pauta. A discussão de pauta serve para se identificarem os principais focos das matérias. Daí, pergunta-se: quais os focos principais da matéria sobre o alcoolismo entre os jovens universitários? O tamanho do porre de cada estudante ao sair da sala de aula? O atendimento médico aos estudantes alcoólatras? O que a direção das universidades e faculdades e os pais podem fazer para evitar a queima dos neurônios dos jovens pelo álcool?
Sinal de despedida
Se forem esses os focos, o programa tentou responder, mas deixou o vácuo em relação a outros pontos fundamentais, como a denunciar a ausência de discussão da equipe antes da execução da gravação do programa. Senão vejamos: o que diz a legislação brasileira em relação ao consumo de álcool por menores? Qual o prejuízo ao país causado pelo consumo de álcool para a formação da inteligência brasileira? De que forma o Brasil chegará perto da Coreia do Norte em produção de inteligência e tecnologia na universidade com estudantes que saem apressados da sala de aula e dos laboratórios para tomar uma pinga urgentemente na porta da escola? Como o Brasil se tornará a primeira economia do mundo com uma juventude dominada pelo alcoolismo – e em várias ocasiões, também pelas drogas?
De qualquer maneira, estamos diante de uma questão-chave que o programa nos trouxe, já que esse comportamento dos universitários parece de norte a sul e de leste a oeste – coisa que o programa não mostrou. Que sistema educacional é esse que financia estudantes para tomar porres depois das aulas e ainda fornece atendimentos médicos e hospitalares gratuitos com gastos adicionais do erário público quando o povo brasileiro é castigado com um sistema de saúde deficiente? Cadê os programas culturais capazes de direcionar a juventude para práticas educativas e de lazer capazes de trazer benefícios à população?
O jornalismo é a janela através da qual uma grande fatia da inteligência brasileira ainda vê a Globo, que busca nas novelas manter seu público cativo. A queda de qualidade de programas jornalísticos como o Profissão Repórter pode ser o sinal da despedida da estação do seu público mais qualificado.
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Jornalista e escritor, editor do portal da AALONG