Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Google+ levanta debate sobre relações humanas

A chegada super celebrada da rede social Google+ abriu um debate sobre a diferença entre amigos e conhecidos. Qual é exatamente a diferença?

“Se um homem não faz novos contatos à medida que avança pela vida, rapidamente se verá sozinho”, disse Samuel Johnson, escritor inglês do século 18. “Um homem deve cultivar constantemente suas amizades”.

O comentário ganha novo significado na era do Facebook, quando é comum que pessoas tenham centenas de “amigos”. Mas estes não são amigos no sentido convencional.

A principal novidade do Google+ é que o site exige que os usuários arrumem seus contatos em categorias diferentes, ou “círculos”. O novo usuário tem a opção de ter amigos, família ou conhecidos, e é encorajado a criar novos círculos sob títulos que ele próprio escolhe.

Aficcionados pelo Facebook diriam que é possível criar grupos no Facebook, mas alguns acham que essa opção é um pouco complicada. O Google+ parece guiar o usuário por este caminho, para que ele possa enviar mensagens a contatos específicos.

“Entendo a lógica da divisão do Google. Amigos e família são grupos bastante isolados um do outro, com os quais você se relaciona de formas diferentes”, diz o professor Robin Dunbar, autor de De quantos amigos uma pessoa precisa?.

Ele argumenta que acima de 150 pessoas – grupo feito de “íntimos”, familiares e amigos – o que as pessoas realmente têm são “conhecidos que cumprimentamos com um aceno de cabeça”.

Amigos, pero no mucho

O escândalo de escuta ilegal na Grã-Bretanha, com sua rede de jornalistas, magnatas da mídia, políticos e policiais, chamou atenção para a natureza de redes de contatos.

John Yates, que pediu demissão esta semana do cargo de vice-comissário da Scotland Yard, referiu-se ao ex-executivo do tabloide News of the World Neil Wallis como “amigo”, mas não “um amigo do peito”. David Cameron, por sua vez, não teve problemas em chamar seu ex-assessor de mídia Andy Coulson de “amigo”. Mas alguns acham que ele precisa explicar o que isso significa.

Jeff Jarvis, que escreve o blog BuzzMachine, diz que a distinção entre conhecidos e amigos não faz diferença online. “Conhecidos é só um rótulo. Eu não uso”.

Os círculos no Google+ são nada mais do que mailing lists modernas, diz ele. Ele organiza seus contatos no Google+ em círculos com títulos como “Alemanha”, “Mundo” ou “Celebridade”.

Ele afirma que se trata de relevância, mais do que privacidade ou intimidade. “A idéia de que você pode usar esses sites como cofres para seus pensamentos privados é absurda. Se você tem um segredo, deixe-o guardado na sua cabeça”.

As diferentes redes sociais se sobrepõem, mas priorizam coisas diferentes. Na verdade, o Facebook já permite que os usuários agrupem seus contatos; apenas é “um saco” fazê-lo, diz Jarvis. O Facebook é para manter relações, o Twitter para divulgação, o Tumblr para citações e o Google+ para compartilhamento, diz ele.

Amigos e conhecidos são categorias diferentes no Google+, mas mídias sociais “não dão conta da complexidade humana”, dizem analistas.

“O Twitter é como um pub cheio de pessoas gritando. O Google+ é mais como sentar na sala de fumantes com amigos”.

Moran usou a capacidade de ter cículos distintos oferecida pelo Google+ para manter uma distinção muito clara. Após importar os contatos de suas redes sociais pré-existentes, ela estabeleceu dois círculos. “Um é para pessoas com quem eu tolero conversar. A outra é para todas as outras que posso jogar no mesmo poço”.

Mas na era do Facebook, é fácil se confundir sobre amizades, diz Gladeana McMahon, ex-comentarista do programa de TV GMTV. “Um amigo é alguém com quem se tem uma relação frequente, hoje ou no passado. Você mantém contato e se envolve na vida deles”.

Um conhecido, por sua vez, é alguém que você conheceu mas com quem não teve a chance de desenvolver uma amizade. Pode se tornar uma amizade. Mas quase sempre não irá além de um rápido olá.

Mas redes sociais jamais serão capazes de entender a multiplicidade das relações humanas, adverte ela. “Uma coisa que nunca se encaixará é o ser humano”.

Jarvis diz que Mark Zuckerberg entendeu essa questão. O criador do Facebook acredita que todas as pessoas têm uma identidade autêntica, em vez de várias personas diferentes. Em entrevistas para o futuro livro de Jarvis, Zuckerberg disse que estava cada vez mais difícil para as pessoas manter identidades separadas.

Essencialmente, nossas personas do trabalho, de casa, sociais e familiares são apenas uma. Se você encontrar com seu advogado no supermercado no fim de semana, ele provavelmente estará usando shorts e estará com seu filho. Ele é uma pessoa completa, não apenas a pessoa que você conhece do trabalho, diz Jarvis.

SMS, o nicho da intimidade

Dunbar, professor de antropologia evolutiva da universidade de Oxford, diz que isso pode funcionar enquanto você está na universidade. Mas depois dos 20, não é mais possível manter esta dinâmica. Não apenas vemos as pessoas em contexto diferentes – como trabalho ou lazer – mas também temos amigos espalhados pelo mundo, que não necessariamente se misturam ou interagem.

E há ainda a forma com que nos comunicamos online. Atualizações de status no Facebook quase sempre são banais, diz ele. “Você escreve ‘Comi cereais no café da manhã’, algo com que seu melhor amigo pode se importar, mas muitos dos outros, não”.

Isso acontece porque as pessoas não mudam a maneira com que conversam online. Pesquisas mostram que as pessoas se comportam como se estivessem se dirigindo a um máximo de três pessoas, apesar de seus posts poderem chegar a centenas.

E amizades de redes sociais requerem um enorme esforço se forem ser mantidas. Se não, elas fenecerão em uma questão de meses, uma vez que a proximidade emocional for perdida, diz Dunbar. Quando se trata de usar tecnologia com nossos amigos mais próximos, são mensagens de celular, e não sites, que contam, diz ele.

Pesquisas realizadas por um de seus estudantes de pós-doutorado com 30 estudantes em Sheffield mostraram que 85% dos SMSs que enviavam iam para uma ou duas pessoas – quase sempre namorado ou namorada ou para o melhor amigo. Isso mostra que há coisas que queremos dividir apenas com as pessoas mais queridas e próximas, diz ele.

Mas como nos lembra Oscar Wilde, amizade misturada com a natureza humana é uma questão delicada. “Qualquer um pode ter empatia com o sofrimento de um amigo, mas é preciso uma natureza muito especial para ter empatia com o sucesso de um amigo”. Ou, talvez, com o que ele comeu no café da manhã.