Tornei-me amigo de um jovem empresário de Santa Catarina, do setor de comunicações, que administra suas empresas pelo velho estilo da pressão desmedida. Certa vez, por puro atrevimento, chamei atenção dele para as consequências nefastas desse seu jeito de gerir suas empresas, advertindo que a primeira e principal delas é a fuga de talentos, pois cada vez mais os profissionais talentosos se recusam a trabalhar em ambientes de cobranças excessivas e muitas vezes desrespeitosas. Respondeu-me com uma informação e uma pergunta:
“Minhas empresas cresceram 10% no semestre. Você acha que se eu não tivesse pressionado teríamos alcançado esse resultado excepcional?” “A pergunta que você deve fazer não é essa”, respondi, “e sim o quanto você teria crescido se tivesse criado um ambiente mais tranquilo e mais adequado ao talento empreendedor.”
Lembrei-me desse diálogo ao ler nos jornais da semana os resultados de uma pesquisa do Instituto Verificador de Circulação – IVC (Folha de S.Paulo, 22/07, B4) que mostra que os jornais diários brasileiros obtiveram um crescimento de 4,2% neste primeiro semestre de 2011, em comparação ao mesmo período do ano passado. Os donos dos 98 títulos pesquisados devem ter concluído: se crescemos, é porque estamos no caminho certo; há que persistir nele. Não se perguntam, certamente, o quanto poderiam ter crescido se fizessem jornais mais atraentes e mais empáticos com seus leitores. Aqui e ali, deste ou daquele jeito, a história se repete: há comemorações para um feito, sem observar que de outro modo o feito poderia ser muito maior. Dentro da tradição de baixa tiragem dos jornais brasileiros, o crescimento inferior a 5% num semestre é pífio. Tem de haver espaço para expansão bem maior, ainda que saibamos que lá fora, nos países europeus e nos EUA, o movimento seja inverso: os jornais perdem leitores ao invés de conquistarem novos.
As páginas de esportes do JT
Assino dois jornais de grande porte. Leio jornais pela manhã. Primeiro passo os olhos pela primeira página e se encontro alguma chamada que me atraia procuro pela matéria nos respectivos cadernos. Coincidência ou não, embora dispusesse de tempo, no dia em que publicaram as pesquisas sobre o crescimento dos jornais só me interessei em ler a matéria da pesquisa. Nem cheguei a desmontar os jornais. Depositei-os quase intactos sobre o balcão da cozinha para disponibilizá-los às demais pessoas da família. Infelizmente, cada vez mais, os jornais depositados intactos sobre o balcão da cozinha ali permanecem intactos até que alguém se lembre de colocá-los no lixo.
Um dos meus filhos é apaixonado por esporte. Acompanho aflito a sua relação com a mídia-papel esvair-se. Só recorre aos cadernos de esporte hoje em dia para saber se a TV vai ou não transmitir o jogo de seu time. Muitas vezes obtém ali, devido à desinteligência entre jornais e TV, a informação errada. Nada pior para um jovem do que preparar-se para assistir a uma partida de futebol à noite pela TV e descobrir, quase no início do jogo, que a TV não irá transmiti-la.
É, aliás, espantoso o divórcio que a mídia-papel estabeleceu com o público jovem. Não há nela, a meu ver, nada que possa interessar esse público, nada que seja capaz de atraí-lo e emocioná-lo. Fui também apaixonado por esportes, quando jovem. Lembro-me com melancolia dos meus encontros – emocionantes – com as páginas do caderno de esportes do Jornal da Tarde. Uma das reportagens que mostrava o movimento das duas maiores torcidas mineiras (Atlético e Cruzeiro) a caminho do estádio para ver uma decisão de campeonato marcou-me, profundamente. Não me lembro, infelizmente, de seus autores. São falhas de memória de um jornalista que chegou aos 63 anos de idade.
Emoção e ousadia
A cobertura esportiva dos jornais tornou-se burocrática, enfadonha, tediosa. Os cadernos esportivos com certeza perderam grande parte de sua audiência para a internet, onde, pelo menos, conseguimos encontrar informações mais quentes e instantâneas. Os jovens se interessam por surfe, mas não há cadernos especializados nesse esporte. Os jovens se mostram perdidos e desorientados na escolha de sua profissão, mas não há cadernos especializados para mostrar as novas e novíssimas profissões que surgem a cada ano no mundo globalizado e altamente influenciado pelo impacto das tecnologias digitais.
O crescimento de 4,2% – ou 5%, como no caso da Folha – num semestre não esconde a meu ver a dramática realidade dos jornais brasileiros, que há muito tempo se dedicam a enxugar gelo. Se quiserem sobreviver, terão de voltar a atrair os jovens com emoção e ousadia e tornarem-se bem mais atraentes para os adultos, muitos dos quais, como eu, não desistem por puro hábito – precisamos folhear os jornais do mesmo modo que precisamos tomar algumas xícaras de café durante o dia.
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[Dirceu Martins Pio é jornalista e ex-diretor da Agência Estado e da Gazeta Mercantil]