Wednesday, 18 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

Cobertura desanimada do crime organizado

Os jornais de circulação nacional noticiam que a polícia paulista fez nova apreensão da droga conhecida como oxi na região da Cracolândia, centro de São Paulo.


O acontecimento, que se repete há dias em delegacias da capital paulista, chamou a atenção da imprensa por causa da quantidade da droga encontrada com uma mulher hospedada no lugar que se tornou símbolo da incapacidade do governo paulista de estabelecer algum controle sobre o tráfico.


O Globo desta quarta-feira, 11, acrescenta à notícia sobre a apreensão da nova droga a informação de que a polícia investiga uma campanha na internet que divulga a venda de um tipo de cocaína 99% pura, que está sendo distribuida em cidades médias e grandes do interior do Estado de São Paulo.


Na última segunda-feira, dia 9, a Folha de S.Paulo trazia um estudo inquietante feito por pesquisadores de uma ONG internacional e da Faculdade de Direito da Universidade de Harvard, uma das mais prestigiosas do mundo, sobre a corrupção da polícia paulista.


O trabalho faz um diagnóstico das causas que levaram aos ataques cometidos em 2006 pela organização criminosa conhecida como PCC – Primeiro Comando da Capital – na região metropolitana e em outras cidades paulistas.


O retrato é assustador. Levanta a hipótese de que a política de segurança do estado mais rico da Federação é condicionada por relações de autoridades com o crime organizado.


Na terça-feira, dia 10, a mesma Folha de S.Paulo reproduzia notícia sobre ataques organizados contra instalações da segurança pública no estado de Santa Catarina, informando que a ação era muito parecida com os fatos produzidos em território paulista pelo PCC em 2006.


A organização responsável por atentados na região de Florianópolis e em outras cidades seria conhecida como Primeiro Grupo Catarinense, o que insinua se tratar de uma extensão do ‘comando’ paulista.


Segundo a Folha, pelo menos oito instalações de segurança foram atacadas nos últimos 40 dias, supostamente em represália a operações da polícia catarinense contra o narcotráfico, o contrabando e outros crimes.


O noticiário aqui citado, publicado em gotas pela imprensa, revela uma situação sem controle, altamente perigosa e sintoma de que a suposta queda nos indicadores de violência, recentemente festejada pela mídia, esconde fatos muito mais graves.


Há indícios sérios de que o sistema de segurança de São Paulo e de outros estados é refém – ou coisa pior – do crime organizado.


E a imprensa ainda não se animou a colocar seus repórteres nas ruas para tirar essa história a limpo.



Candidato a deputado


Também é parte do noticiário fragmentado sobre o problema da segurança, publicado nos últimos dias, uma entrevista do promotor público Lincoln Gakiya, de São Paulo, na qual ele conta que o PCC domina quase todos os 148 presídios do Estado e pode contar com milhares de integrantes.


O grupo criminoso atua como uma empresa, tendo como principais fontes de recursos o tráfico de drogas e de armas, os assaltos e a lavagem de dinheiro em postos de combustíveis.


Não se trata exatamente de uma revelação bombástica.


A imprensa tem pintado esse perfil do crime organizado em notícias esparsas.


Qualquer cidadão alfabetizado que tenha o interesse e a oportunidade de rastrear diariamente os jornais consegue estabelecer uma lógica para o poder da organização criminosa.


O chamado Primeiro Comando da Capital só tem esse poder porque está associado a policiais corruptos.


Talvez, até, contando com a complacência de figuras importantes do governo.


Mas a imprensa parece desinteressada de fazer uma correlação entre esses acontecimentos e a hipótese de comprometimento do Estado com o crime organizado.


No ano passado, quando a Justiça Eleitoral rejeitou a candidatura do suposto empresário Claudinei Alves dos Santos, que pretendia se eleger deputado federal pelo PSC em aliança com políticos ligados ao governo paulista, revelou-se que ele havia cumprido pena de prisão por roubo.


Em seguida, foi noticiado que Nei Santos, como é conhecido, possui uma fortuna avaliada em quase 100 milhões de reais, controla dezenas de postos de combustíveis e é suspeito de ligação com o PCC.


Ele chegou a ser preso, sob acusação de lavar dinheiro para a organização criminosa em seus postos e em uma empresa de ‘factoring’ – sistema de crédito que no Brasil se confunde com agiotagem.


Um juiz o libertou, ele circula na Zona Oeste de São Paulo a bordo de uma Ferrari e tanto a polícia quanto a imprensa se esqueceram dele.


Está mais do que na hora de se promover por aqui uma ‘Operação Mãos Limpas’, como a que foi feita contra a máfia na Itália nos anos 90.