Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Lá vai o negão cheio de paixão

Lá vem o negão/ Cheio de paixão/ Te catá, te catá, te catá.” (Cravo e Canela)

A mídia deu bons motivos (aos EUA, em particular) para o mundo inteiro achar que George W. Bush fraudou as eleições presidenciais americanas, em 2001. Naquele momento decisivo os sonhos dos americanos mais pobres foram prorrogados, os avanços obtidos com Bill Clinton foram questionados ou cancelados, e a mudança ficou para a próxima eleição.

As contradições do primeiro governo Bush não demoraram e foram aprofundadas no segundo. não havia dinheiro para a saúde pública nem para a previdência social, mas sobrava para as guerras do Afeganistão, do Iraque etc.

O povo não é bobo, articulou-se melhor e concentrou suas esperanças no bordão Yes, we can (sim, nós podemos), lema da campanha de um fabuloso negão chamado Barack Hussein Obama, aliteração do nome do inimigo público número 1 dos EUA, Osama bin Mohammed bin Awad bin Laden, os dois respectivamente mais conhecidos pelos nomes resumidos de Obama e Bin Landen.

Procedimentos democráticos

Obama matou Bin Laden. Os republicanos, que não conseguiram vencer Bin Laden, querem matar Obama e para isso usam outras armas. No caso de John e Robert Kennedy, foram tiros que exterminaram as promessas e as esperanças. No caso de Clinton as armas foram outras e não dispensaram as calúnias, como antes foi tentado de tudo no episódio de Watergate. A escritora Toni Morrison, Prêmio Nobel de Literatura em 1993, resumiu a luta dos republicanos para derrubar Clinton: “Clinton é o primeiro presidente negro”.

Os republicanos querem os EUA do passado. Eles querem tiros, seja em indivíduos, como foi feito com os dois Kennedy, um elevado à presidência da República, outro a ser elevado em próxima oportunidade, seja em multidões que reivindicam igualdade racial.

Obama está vencendo onde fracassaram Bush e Al Gore. O primeiro por saber fraudar. O segundo por não saber se defender adequadamente.

Obama é aquele pai de família que reconhece os anseios dos filhos, vê o orçamento incapaz de atender às demandas que reconhece justas e parte para empréstimos que reforcem seu caixa e atendam às necessidades reais. Confia em investimentos em saúde, educação, cultura, previdência. Para isso, pede licença, democraticamente, para elevar o teto da dívida.

Lá e cá

Licenças muito maiores já foram dadas no passado sem a celeuma de hoje. Por que, então, a gritaria? Porque Obama é negro. Porque Obama veio de baixo. Porque Obama quer atender a base da pirâmide, não o topo e as camadas mais elevadas. Essas não precisam do governo para nada. Quem precisa do governo é o pobre. Ele não tem hospital, não tem remédio, não tem educação, não tem cultura, não pode pensar em previdência. Férias? Desde quando pobre tira férias?

Luciano Martins Costa lembrou com precisão neste Observatório (ver “EUA, um alívio na crise”) que a resistência republicana foi um ato terrorista semelhante ao de Oslo e afeta todo o planeta. Realmente, são loucos querendo incendiar e ensanguentar o mundo.

Por último não é demais lembrar que o que fizeram com Al Gore na eleição de Bush tentaram fazer com Leonel Brizola no Rio de Janeiro. Nos EUA deu certo. No Brasil, não.

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[Deonísio da Silva, escritor e doutor em letras pela USP, é pró-reitor de Cultura e Extensão da Universidade Estácio de Sá e diretor de Relacionamento; seus livros são publicados no Brasil pela Editora Leya e Novo Século]