Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

População hostiliza soldados no Complexo do Alemão

A ocupação militar do Complexo do Alemão, iniciada no final de novembro de 2010, vem apontando claramente os limites que a solução militar encontra na resolução dos conflitos urbanos ligados ao tráfico de drogas nos bairros pobres das grandes cidades. Soldados do exército são obrigados a uma convivência cotidiana violenta com a população local que potencialmente tende a desgastar o moral da tropa. Para os não-cariocas, o Alemão é um bairro da cidade do Rio de Janeiro, de urbanização muito precária. Oficialmente, para a administração carioca, não é uma favela, ou atravessa vários bairros, como às vezes certas leituras sugerem.

Situa-se a menos de dez quilômetros do centro do Rio, na outrora chamada “Zona da Leopoldina”. Faz limites com os bairros de Ramos,Penha, Olaria, Inhaúma e Bonsucesso.O jornalista Tim Lopes encontrou seu terrível fim no Alemão. É uma área imensa, situada na Serra da Misericórdia, que abriga uma população muito pobre e que necessita urgentemente de atendimento social para reforçar a presença do Estado no local. Só assim as tropas poderão deixar o local.

Quase 50 moradores já foram denunciados por desacato, resistência, ameaça ou desobediência aos militares desde o início da ocupação. O Último Segundopublicou uma reportagem, no dia 29 de julho, contando o tenso e violento convívio entre a população local e os militares. Os conflitos vêm aumentando perigosamente. A população local e os soldados estão a envolver-se em conflitos localizados que levam à desmoralização gradual da tropa. Pedras e paus contra munição não-letal e sprays de pimenta são sinais inequívocos do desgaste dos militares no local.

Entre um e outro “arrastão”

O Complexo do Alemão originou-se do parcelamento das terras de um polonês chamado Leonard Kaczmarkiewicz em 1951, conforme publicou o Globo onlineno primeiro dia de outubro de 2007. Seu nome vem de um equívoco: o povo tomou o polonês por alemão e batizou o lugar. Hoje, a área é um imenso conjunto de treze favelas e alguns prédios populares feitos em tempo que se acreditava ser possível conter a ocupação desordenada do solo urbano através da construção de conjuntos habitacionais. A presença desses prédios entre as habitações precárias é o testemunho mudo e imparcial de uma antiga e fracassada política habitacional.

O Ministério Público Militar, através de sua assessoria de comunicação, confirmou o indiciamento de 49 pessoas. E reconhece que “a presença permanente de militares, as abordagens, as revistas geram, muitas vezes, o descontentamento de parte da população local, que considera as ações da Força de Pacificação uma restrição à liberdade”.

A solução militar já mostrou seus limites. A construção do número suficiente de UPP´s segue em ritmo lento, para o número de favelas que a cidade tem. Enquanto isso, tudo o que temos, entre um e outro “arrastão” na Linha Vermelha (menos de seis quilômetros do centro da cidade), é a garantia do ministro Jobim, publicada na Folha.comno dia 22 de julho de 2011, de que “as tropas ficam até que a presença do Estado seja suficiente para substituí-las”.

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[Sergio da Motta e Albuquerque é mestre em Planejamento urbano e regional, consultor e tradutor]