Oportuna e sugestiva a publicação – ou republicação – da Declaração de Princípios das Organizações Globo no último fim de semana (O Globo e Época).
A crise de identidade que assola globalmente a indústria, suas precipitações, vacilações e, agora, a lama que Rupert Murdoch jogou no ventilador, impõem algum tipo exposição – ou expiação – mesmo naqueles que não compactuam com suas idéias e métodos.
A imprensa que legitimamente exige tantas explicações deve dispor-se a oferecê-las. Esta mutualidade dá credibilidade à relação dos veículos jornalísticos com os respectivos públicos. O leitor/espectador deixa a sua condição passiva para tornar-se observador.
A partir do momento em que a Associação Nacional de Jornais (ANJ) assumiu o compromisso público de adotar algum tipo de autorregulação, e diante do vexame que a entidade autorreguladora do Reino Unido ofereceu à opinião pública mundial como cúmplice dos ilícitos praticados pelo News of the World, esse exercício de auto-análise propiciado pela maior empresa jornalística do país deve ser saudado. E entendido como passo inicial de um salutar processo de transparência.
Conceito ausente
O documento, além de longo, é ambíguo: em alguns momentos defende princípios e valores, em outros se revela indeciso em questões cruciais, inclusive no tocante à definição da sua própria razão de ser. A “breve definição de jornalismo” é imensa, imprecisa, antiquada e maçante. Jornalismo é algo vivo, eletrizante; se a sua definição não consegue ter os mesmos atributos algo está errado – na ontologia ou na formulação.
Partes dele nada têm a ver com princípios editoriais ou profissionais: são normas funcionais preparadas por especialistas em Recursos Humanos. Na seção II afirma-se em certo momento que as Organizações Globo não relativiza seus rígidos compromissos com o público. Mais adiante, porém, admite que “cenas chocantes receberão o tratamento devido de acordo com as características do público-alvo”. Será isso uma preparação para as inevitáveis concessões à Sua Majestade, a classe C?
Na seção III, onde se examinam os valores defendidos pelas Organizações Globo, está dito que estas são laicas. Não são. Este observador dispõe-se a prová-lo, desde que no espaço ou tempo da sua qualificada veiculação. Neste Observatório esta questão tem sido tratada pelo menos desde 2008.
O que nos remete à seção I, item “Isenção”, parágrafo “d”, onde está dito de maneira cabal e insofismável: “Não pode haver assuntos tabus”.
O importante, transcendental, é que as Organizações Globo acenderam o sinal verde para o debate. Mesmo que a palavra “pluralismo” não tenha aparecido ao ser acionado o mecanismo de busca.