O presidente Lula, em carreata em Belo Horizonte, avisou sua candidata: é preciso enfrentar o medo que uma parcela da população tem de ver uma mulher governando o país. O mesmo medo, segundo ele, que as ‘elites’ tinham de ver um metalúrgico no poder.
A notícia foi publicada em todos os jornais. Mas os jornais, como parece ser norma hoje em dia, se limitaram a publicar a declaração do presidente sem dar uma interpretação – por mais rasa que fosse – da fala de Lula. Poderiam ter lembrado que mais de 60% dos eleitores deram seus votos a duas mulheres candidatas à Presidência, que sua candidata ainda é a líder de intenções de voto e que, em momento algum da disputa, o fato de Dilma ou Marina serem mulheres foi tema de campanha ou tirou votos delas.
Mas não é só isso que os jornais devem aos seus leitores. Devem, por exemplo, uma matéria detalhada explicando quem é, afinal de contas, a elite neste país. Seria interessante mostrar aos leitores como se classifica a elite, do ponto de vista econômico, social, intelectual e, principalmente, do ponto de vista do presidente Lula – que tem mais de 70% de aprovação na população. Essa aprovação, com toda certeza, inclui parte da tão citada ‘elite’ de presidente. Ou o conceito de elite varia conforme os votos dados à candidata presidencial?
Outro ponto interessante, que não motiva o presidente, as candidatas ou a mídia, é a presença das mulheres na Câmara e no Senado. Destaque só receberam Marta Suplicy, eleita senadora por São Paulo (muito mais porque o partido andou brigando com o namorado dela e pela foto de Marta usando um discreto biquíni na praia), Roseana Sarney, reeleita governadora e algumas jovens bonitas em primeiro mandato.
Bancada feminina
Está mais do que na hora de discutir a ‘bancada feminina’ no Congresso e o papel que essas deputadas e senadoras desempenham no Congresso Nacional. Hora também de explicar por que, apesar de duas candidatas à Presidência terem praticamente monopolizado a eleição, o número de mulheres no Congresso continua o mesmo. As previsões, feitas pelo pesquisador Demóstenes Alves em entrevista à Rádio Câmara, eram otimistas antes das eleições. Com base no aumento do número de mulheres candidatas, ele profetizava que haveria 63 deputadas na próxima legislatura, 18 a mais do que as eleitas em 2006, ‘constituindo o maior aumento absoluto da história’.
Um estudo do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) previa que seriam renovadas 40% das cadeiras da Câmara Federal com uma presença maior das mulheres: ‘Com as projeções de crescimento, pode-se esperar para a próxima legislatura, em 2011, uma bancada feminina mais fortalecida para manter e ampliar seus direitos, principalmente pela igualdade de gêneros’.
E as outras 38?
No dia 6 de outubro último, a rede Brasil Atual voltou ao assunto para revelar que a bancada feminina apenas manteve as 45 vagas que já tinha na Câmara e aumentou levemente sua participação no Senado, de dez para doze senadoras. Diz a matéria – que, aliás, não mereceu repercussão na grande imprensa:
‘Estudo do Diap destaca parentes de nomes tradicionais da política nacional. Entre as novatas no Senado, duas têm parentesco com políticos tradicionais: Marta Suplicy (PT-SP), ex-mulher do também senador por São Paulo Eduardo Suplicy (PT), e Gleisi Hoffman (PT), mulher do ministro do Planejamento e ex-deputado federal Paulo Bernardo (PT).’
Entre as eleitas para a Câmara, a matéria destaca sete que são mulher (ou ex-mulher), mãe ou filha de políticos. As outras 38, que com toda certeza chegaram lá por méritos próprios e militância anterior, não mereceram destaque na Rádio Câmara e poderiam ser uma boa escolha para a grande imprensa. Seria interessante saber o que as deputadas e senadoras podem fazer – além de pedir sessões solenes para comemorar o dia disso ou daquilo – que as diferencie de seus colegas.
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Jornalista