Paul Maritz já testemunhou muitas brigas por patentes. O executivo-chefe da VMware passou 14 anos na Microsoft, grande parte disso na década de 90, quando a companhia ampliava rapidamente seu domínio e ameaçava potências tecnológicas mais antigas. Ele se lembra de quando visitou a Hewlett-Packard (HP), a Digital Equipment Corp. e outras gigantes, basicamente para render homenagem a elas, pagando por acordos de licenciamento que davam à Microsoft acesso a propriedades intelectuais essenciais – e que mantinham a companhia de Redmond afastada de batalhas legais prolongadas. “Tínhamos que fazer aquilo. Éramos novos no pedaço”, diz Maritz.
O executivo vê uma dinâmica parecida em ação na indústria tecnológica hoje. Até agora, as estrelas ascendentes do Vale do Silício – companhias como Facebook, Twitter, Zynga, LinkedIn e outras queridinhas de mídia social – têm em sua maioria evitado se tornar vítimas nas guerras por patentes em andamento, que estão centradas no mundo dos dispositivos móveis. Mesmo assim, afirma Maritz, “quando as coisas mudam e novos concorrentes herdam um espaço, isso resulta em uma situação instável”. Segundo especialistas em direito e executivos do setor de tecnologia, muitos confrontos por patentes estão por vir.
Companhias de tecnologia mais antigas como Oracle, IBM e Microsoft mantêm carteiras sólidas de patentes que cobrem tecnologias essenciais usadas pelo conjunto da internet, especialmente aplicativos de bancos de dados e gerenciamento de arquivos. “As companhias da nova geração, como Google, Facebook e LinkedIn em algum momento entrarão em conflito com as companhias estabelecidas”, afirma Timothy D. Casey, um ex-advogado da Apple especializado em patentes e cofundador do SilverSky Group, uma consultoria de estratégias de negócios e propriedade intelectual. “Esse é um padrão familiar no setor de tecnologia.”
Rótulo inútil
Parte do risco para a nova geração de companhias da internet vem de suas carteiras de patentes fracas. O Facebook tem apenas 12 patentes em seu nome, enquanto os totais do Twitter, Zynga, LinkedIn e Groupon vão de zero a duas cada uma, segundo registros no Departamento de Patentes e Marcas Registradas dos Estados Unidos. Isso as coloca em posição parecida com a do Google no começo do ano, quando a empresa tinha um número muito menor de patentes relacionadas às comunicações móveis do que seus concorrentes.
Segundo um estudo do banco de investimentos MDB Capital Group, o Google requereu ou recebeu um total de 307 patentes relacionadas às comunicações móveis até o começo de agosto, comparado com 3.134 da Research In Motion (RIM), 2.655 da Nokia e 2.594 da Microsoft. Essa fraqueza relativa levou a gigante das buscas na internet a pagar US$ 12,5 bilhões pela Motorola Mobility e suas 17 mil patentes, em 15 de agosto, na maior aquisição de sua história. Companhias mais novas da internet poderão acabar adotando medidas parecidas para reforçar suas posições. “Se você quiser ter uma posição permanente no cenário, é melhor conseguir meios de se defender”, afirma Maritz.
Um possível campo de batalha está nos centros de dados. Oracle, IBM e Microsoft em particular passaram décadas patenteando tecnologias de gerenciamento de arquivos e armazenagem de informações. Em vez de pagar por produtos oferecidos por essas companhias, a tendência entre Facebook, Twitter e outros tem sido usar softwares de código aberto que se apropriam, pelo menos conceitualmente, desse trabalho do passado. Essas empresas usam muito programas como os bancos de dados MySQL e Cassandra, por exemplo, e o sistema de gerenciamento de arquivos Hadoop. Com frequência, as companhias de internet chegam até a construir novos aplicativos de código aberto e os lançam ao público, enfraquecendo algumas das franquias mais lucrativas das empresas da Velha Guarda.
Até agora, detentoras de patentes de bancos de dados como a Oracle e a IBM tiveram pouca motivação para mover processos contra os produtos de código aberto. A maior parte de seus maiores clientes, que incluem grandes empresas de Wall Street e grupos varejistas, também usa programas de código aberto, e as batalhas por patentes apenas criaria um desconforto entre elas. No entanto, as mesmas leis de combate podem não se aplicar em suas relações com as gigantes da internet.
Essa nova geração orgulha-se de não comprar tecnologia das empresas estabelecidas do Vale do Silício, afirma Jonathan Schwartz, ex-executivo-chefe da Sun Microsystems, que foi adquirida pela Oracle em 2009. “Tanto isso é verdade que elas são alvos muito atraentes”, diz ele. (IBM, Oracle e Microsoft não quiseram fazer comentários sobre o assunto.) O rótulo de código aberto pouco serviu para manter o software Android, do Google, longe de problemas. O sistema operacional está no coração da recente batalha de patentes no setor de tecnologia que atraiu processos da Apple, Microsoft e Oracle.
“Apólices de seguro”
A ascensão da computação em nuvem complica ainda mais a questão. Companhias voltadas ao consumidor, como a Amazon.com e o Google, agora estão oferecendo serviços na internet para empresas, entrando no campo da Microsoft, IBM, Oracle e outras. Com os centros de dados se transformando no ponto focal da inovação, muitos novos conflitos poderão surgir. O Google, por exemplo, tem numerosas patentes que cobrem a maneira como a empresa armazena e analisa informações por meio de centenas de milhares de servidores.
Em julho, o Google pagou uma soma não revelada por mais de 1.000 patentes da IBM – muitas delas cobrindo inovações importantes em centros de dados. A empresa tornou público parte de seu trabalho com bancos de dados e o Facebook, entre outros, pegaram carona nessas informações para construir suas próprias tecnologias de centros de dados. “Será que o Google vai perseguir o Facebook por causa disso agora?”, pergunta Maritz. O Google e o Facebook não quiseram comentar o assunto.
Mark F. Radcliffe, um advogado especializado em propriedade intelectual da DLA Piper, de Palo Alto, Califórnia, duvida que a guerra por patentes de centros de dados envolverá as companhias mais novas. Ele afirma que as batalhas ocorridas até agora estiveram confinadas às comunicações móveis por um bom motivo. “Você pode desmontar um telefone e dizer quando alguém está infringindo uma patente”, diz ele. “Com um centro de dados, você não sabe realmente o que está acontecendo e é difícil determinar danos com tanta especulação.”
Além disso, muitos dos produtos de código aberto usados pelas novas companhias da internet – softwares como o OpenStack e o Hadoop, que são aplicativos essenciais na computação em nuvem e na análise de dados, respectivamente – tomam ideias emprestadas de um conjunto muito diverso de criadores, com cada companhia personalizando e contribuindo para o ponto central da tecnologia. “Há um ambiente bem mais colaborativo para o desenvolvimento de produtos”, afirma Radcliffe. Mesmo assim, ele acrescenta: “As pessoas ainda não chegaram a um acordo em questões de responsabilidade que surgem quando você tem múltiplas pessoas acrescentando coisas aos produtos.”
Casey, o ex-advogado da Apple, observa que a companhia de Cupertino, Califórnia, registrou apenas uma patente quando ele trabalhou lá, no fim da década de 80. Com o tempo, a fabricante de computadores desenvolveu mais patentes e firmou acordos de licenciamento cruzado. O conjunto das empresas de internet provavelmente fará o mesmo, diz ele, à medida que passar a ver as patentes como “apólices de seguro” – ou o que os veteranos preferem chamar de fontes de receita.
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[Ashlee Vance é da Bloomberg Businessweek]