Com o objetivo de contribuir para o debate sobre o novo marco regulatório para as comunicações no Brasil, o Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social apresenta um levantamento sobre o funcionamento de órgãos reguladores que atuam sobre sobre a radiodifusão em 10 países. O estudo revela a tendência de os países adotarem órgãos independentes para regulação do setor, com ênfase nas questões de garantia de competição, gestão do espectro e de regulação de conteúdo.
Foram pesquisadas as estruturas reguladoras de Reino Unido, França, Canadá, Estados Unidos, Bósnia e Herzegovina, Argentina, Uruguai, Alemanha, Espanha (incluindo um capítulo especial sobre a Catalunha) e Portugal. Sem a pretensão de ser um estudo aprofundado sobre a dinâmica dos conselhos e agências, a pesquisa do Intervozes tem como objetivo compreender, para cada país observado, as características gerais e atribuições do ente regulador, as estruturas organizativas (incluindo composição e forma de escolha), a descrição dos poderes fiscalizadores, punitivos e mecanismos de enforcement, as dinâmicas de transparência, controle público e accountability, os espaços de participação civil e fazer um breve mapeamento dos organismos de fomento. Foram utilizadas fontes primárias e secundárias, especialmente estudos prévios de organismos do governo brasileiro e de pesquisadores dedicados ao tema.
O foco na radiodifusão se justifica pelo momento de debates sobre um novo marco regulatório para o setor no país. Diferentemente dos países pesquisados, o Brasil não tem um órgão regulador independente para a radiodifusão. A responsabilidade pela aplicação das regras está no Ministério das Comunicações, que praticamente não tem atribuições de regulação, apenas de fiscalização e sanção. Por conta dessa ênfase, ficaram de fora do escopo da pesquisa os processos de regulação da imprensa e aqueles específicos de telecomunicações, assim como as questões ligadas a fomento das atividades.
Principais conclusões
O estudo revela características comuns entre os órgãos reguladores da maioria dos países. A primeira delas é a busca de independência em relação ao setor regulado e aos governos. Nenhum dos países pesquisados adota estruturas de autorregulação como instrumento central para a radiodifusão. Todos eles têm participação dos Poderes Executivo e Legislativo nos processos de indicação de seus componentes, mas sempre com mecanismos de equilíbrio e contrapeso entre os poderes ou de indicações prévias por parte da sociedade, à exceção do caso uruguaio, que todavia discute mudanças no marco regulatório do setor audiovisual. A maior parte dos países proíbe que os órgãos tenham como diretores pessoas com interesses econômicos ligados direta ou indiretamente ao setor regulado.
A reunião das questões de telecomunicações e radiodifusão no mesmo órgão é uma realidade no Reino Unido, Estados Unidos, Canadá, Bósnia e Herzegovina, Uruguai e Portugal (embora este último tenha um órgão específico para lidar com comunicação social, incluindo imprensa). Já França, Espanha, Argentina adotam órgãos específicos para o setor audiovisual, modelo próximo ao da Alemanha, que regula rádio e televisão, mas conta com 14 entidades reguladoras estaduais com algumas regras comuns nacionais.
Com algumas variações entre os países, as entidades reguladoras cuidam tanto da regulamentação, por meio de normas infralegais, quanto do licenciamento (alocação de frequências, por exemplo) e regulação, com monitoramento do mercado e tomada de decisões a partir de situações dinâmicas – em alguns casos, promovem arbitragem entre atores privados. Entre as funções dos órgãos reguladores está também cuidar do monitoramento e fiscalização e aplicar sanções. Vários deles elaboram pareceres e estudos, funcionando como órgão consultivo para outras instâncias. É possível ainda encontrar nos países pesquisados órgãos reguladores que definem diretrizes para políticas públicas e promovem o fomento do setor.
As três principais áreas de incidência dos órgãos são as questões de competição e combate à concentração, organização do espectro e regulação de conteúdo. As regras adotadas entre eles para cada uma dessas áreas são distintas, mas sempre com foco no interesse público. Em todos os órgãos, as punições aplicadas são crescentes, podendo chegar à cassação das concessões. Vários países, contudo, ressaltam que o objetivo da regulação é fundamentalmente solucionar os problemas encontrados, e não manter processos para simples punição. Assim, são encorajadas soluções extra-judiciais, seja para conflitos do público com as emissoras seja para conflitos entre empresas.
O estudo revela ainda uma tendência de atualização periódica do marco regulatório do setor. Alemanha, Espanha e Argentina atualizaram seu marco regulatório no último ano. O Uruguai promove discussões para transformações que devem acontecer 2011. Todos os outros países realizaram modificações na década de 2000, à exceção de Estados Unidos e Canadá, que o fizeram na década anterior. Ainda assim, esses países têm estruturas historicamente consolidadas e trabalham continuamente na atualização de suas normas infralegais.
Conteúdo e participação
Sete dos dez países pesquisados atuam na regulação do conteúdo veiculado pelas emissoras de rádio e TV: Reino Unido, França, Alemanha, Bósnia e Herzegovina, Espanha, Portugal e Argentina. Mesmo EUA e Canadá, cujos órgãos reguladores não têm essa atribuição, também recebem denúncias em relação às regras de conteúdo (como os que impedem conteúdos obscenos ou indecentes nos Estados Unidos) ou aprovam códigos de autorregulação em relação a essas questões (caso do Canadá).
Os temas tratados na regulação de conteúdo variam de país para país, mas todos eles trabalham com denúncias diretas do público ou monitoramento dos programas para avaliação a posteriori, não se configurando em nenhum caso como censura prévia. Todos eles têm medida de proteção a crianças e adolescentes, restrições a ofensas pessoais e violações de privacidade, garantia de direito de resposta, promoção de conteúdo nacional, diversidade regional interna ao país e de grupos linguísticos minoritários, acessibilidade de pessoas com deficiência, além de regras para publicidade comercial, em especial de bebidas alcoólicas, medicamentos e daquela voltada ao público infantil. Reino Unido, França, Alemanha, Catalunha e Bósnia e Herzegovina trabalham ainda com questões de imparcialidade e pluralidade de visões na cobertura jornalística e com a promoção da diversidade de conteúdo.
Todos os órgãos reguladores pesquisados têm, em maior ou menor grau, mecanismos de transparência e espaços de participação da sociedade civil em sua dinâmica de funcionamento. Entre eles estão ouvidorias, consultas e audiências públicas, conselhos consultivos ou mesmo conselhos de supervisão.
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Pesquisa: ‘Órgãos reguladores da radiodifusão em 10 países’
Pesquisadores responsáveis: Sivaldo Pereira e Ramênia Vieira
Coordenação: João Brant
Apoio: Fundação Ford
Confira os relatos de cada país:
– Portugal (em breve)
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