Sim, ambos podem ser jornalistas. Por outras palavras, há blogueiros que se tornaram jornalistas e jornalistas que viraram blogueiros. Alguns blogueiros, que já nasceram dentro da internet, se comportam como excelentes jornalistas – mesmo sem terem sido profissionais em outros veículos. Como? Porque escrevem bem, têm paixão pela notícia, são ágeis, apuram os fatos com rigor, separam notícia de matérias opinativas, buscam informar com objetividade e abrem espaço para excelentes artigos e editoriais.
Há hoje, claramente, um movimento migratório do jornalismo tradicional para o eletrônico. Com isso, muitos jornalistas se tornaram blogueiros, nos últimos quatro ou cinco anos. O oposto também ocorreu: muitos blogueiros passaram a atuar como jornalistas, nos novos espaços que a internet abriu para o jornalismo eletrônico.
Mais do que a caracterização exaustiva do que sejam blogueiros ou jornalistas, interessa-nos compreender o alcance e os novos paradigmas do jornalismo eletrônico, na internet. Minha primeira constatação é de que a web fez nascer em todo o mundo um novo tipo de jornalismo, muito mais interativo e dinâmico, capaz de proporcionar debates online de todos os tipos de assuntos e temas, sejam culturais, políticos, econômicos e filosóficos. Ou ainda, grandes temas nacionais e internacionais.
Tradicionalmente, a grande marca da jornalismo nas sociedades democráticas tem sido sua diversidade. O mesmo deverá ocorrer com o jornalismo eletrônico. Até porque ele é muito mais difícil de ser pressionado, amordaçado ou calado.
Pluralidade da mídia
A diversidade de opiniões e de conteúdos é essencial para a democracia. Assim, para que a mídia seja realmente livre, em seu conjunto, ela precisa refletir as mais variadas tendências e posições. Com a internet, a sociedade ganhou um dos mais poderosos instrumentos para essa diversificação. E mais: tem contribuído de forma inequívoca e significativa para a ampliação do número de veículos de informação, de atores e de conteúdos.
O que nos preocupa no Brasil de hoje é a campanha em favor do ‘controle social da mídia’– mero disfarce para a censura nestes tempos de convergência digital. Nem o ministro Franklin Martins aceita a expressão ‘controle da mídia’ – conforme declarou no Seminário sobre Liberdade de Imprensa, promovido pela TV Cultura de São Paulo, nos dias 25 e 26 de novembro.
No entanto, é bom lembrar que há grupos políticos de esquerda que não apenas usam essa expressão, como a incluem em programas de partidos e ainda dão a esse controle o apelido irônico de ‘democratização dos meios de comunicação’.
Interatividade revoluciona
O que esses cavalheiros parecem ignorar é que a nova mídia eletrônica, criada essencialmente pela internet, permite algo novo e revolucionário: a resposta, o debate, a contestação, a divergência, a retificação, o espaço de debate muito maior e mais justo para a participação do leitor e do internauta. É indiscutível que tudo isso, em princípio, significa avanço, progresso democrático.
Entre tantas outras consequências, esses grupos radicais parecem não perceber que a popularização da internet e dos blogs vai sepultando o velho sonho sindicalista da reserva de mercado profissional exclusiva aos portadores de diploma específico de jornalismo.
Jornalistas sem diploma
Até há poucos anos, antes da expansão global da internet, sem diploma específico, milhares de pessoas, mesmo culturalmente qualificadas, estavam impossibilitadas de atuar profissionalmente como jornalistas, no Brasil. Mas, assim como caiu a Lei de Imprensa, também caiu o decreto-lei do tempo da ditadura que exigia diploma específico para o exercício do jornalismo.
Aliás, há alguns anos, milhares daquelas pessoas antes inabilitadas legalmente, já vinham exercendo, livremente, na internet, as atividades de blogueiros, jornalistas ou comunicadores públicos. Essa ampliação de oportunidades e do número de participantes representou não apenas uma transformação do jornalismo mas, também, uma verdadeira democratização da atividade jornalística. Com todos os problemas transitórios que tenha trazido ou ainda possa trazer, foi uma mudança positiva.
Como tenho ressaltado neste blog, acho que o novo jornalismo eletrônico torna-se a cada dia uma grande escola política e cultural, uma escola de democracia, na qual nós – jornalistas e leitores de todas as formações, de todas as idades – estamos aprendendo a dialogar, mesmo com muitas trombadas e incompreensões. É um aprendizado democrático feito on the job, isto é, no exercício da própria atividade.
Bloggers, welcome
Sou um entusiasta da chegada dos blogueiros, os novos jornalistas eletrônicos, desde que sejam sérios e competentes, porque eles ampliam não apenas o debate e a controvérsia em nossa sociedade, bem como alargam significativamente os horizontes da informação.
É claro que abertura repentina das portas do jornalismo eletrônico a centenas de milhares de blogueiros trouxe uma avalanche de aspirantes a jornalistas totalmente despreparados. O que eles têm de positivo é o seu intenso desejo de participação nesse novo espaço social e político, que é o jornalismo eletrônico. Como milhões de cidadãos em todo o mundo, eles querem que sua voz seja ouvida.
É claro que uma minoria, infelizmente, está despreparada, muito menos por sua falta de escolaridade, e muito mais por seu despreparo cultural, político e ético para o diálogo democrático. Por isso, acaba, com frequência, agindo da forma mais agressiva, primária e ofensiva.
Mesmo assim, não sou pessimista e reafirmo minha confiança em que a internet seja uma verdadeira escola de democracia. Por melhor que tenha sido no passado, a mídia unidirecional não permitia um debate tão vivo, dinâmico e intenso quanto o que temos hoje, neste portal do Estadão. Essa é a face positiva e benéfica do novo jornalismo.
Temos, no entanto, que buscar superar incessantemente os problemas decorrentes daquele despreparo de muitos, do anonimato com que tentam proteger-se aqueles que não têm coragem de aparecer e assumir a autoria de tudo que dizem e pensam.
Esse anonimato tem sido muitas vezes utilizado por patrulheiros hidrófobos, por tropas de choque, que muitas vezes são remuneradas para dizer as coisas mais estúpidas e dar a impressão de que representam grandes parcelas da sociedade. E que insistem em nos fazer crer que suas teses têm o apoio da grande maioria da população.
Com a internet, dispomos de mais um poderoso instrumento de comunicação para combater a mentira populista e a demagogia. É claro que a linguagem de palanque ainda predominará por alguns anos em muitos blogs, em artigos e nos comentários, seja nas intervenções de leitores que, na falta de argumentos consistentes, utilizam a tática muito frequente de atacar o interlocutor, em lugar de refutar suas teses. Isso tudo sem falar nos comentários essencialmente ofensivos, chulos e impublicáveis, que são simplesmente deletados.
De qualquer modo, reitero minha convicção de que essa face negativa do novo jornalismo não se sustentará por muitos tempo e acabará logo desmoralizada. Não tenho dúvida que, com o tempo, com uma experiência mais longa neste novo meio de comunicação altamente interativo, todos os jornalistas aprenderão a dialogar com seus leitores.
Isto interessa a todos
Essa é a grande discussão que deve ser incentivada neste momento de transição e de mudança de paradigmas, para que todos – jornalistas e leitores – superem seus velhos hábitos e condicionamentos, suas deformações do jornalismo unidirecional do passado. Tenho certeza, no entanto, que estamos avançando com uma rapidez impressionante.
Como jornalista, colunista e bloguista, tenho vivido nos últimos anos todas as etapas e transformações da tecnologia digital, do jornal impresso ao jornal eletrônico. Por isso, busco responder a muitos comentários e contestações que recebo, especialmente os respeitosos.
Considero esse diálogo acima de tudo construtivo, porque a grande maioria dos comentários que me chegam, favoráveis ou não, enriquecem o debate. Outros, nem tanto. Uma minoria de comentários e reações, entretanto, nada agregam, nada constroem e se revelam ainda inadequados, por fugir ao cerne da questão e investir contra o interlocutor, por agredir gratuitamente o veículo ou por em dúvida a honestidade do jornalista ou do jornal.
Mesmo assim, reitero meu otimismo. Estejam certos: com a interatividade, tudo tende a melhorar e, num futuro próximo, assistiremos à aproximação cada dia maior entre a mídia e a sociedade.
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Jornalista