A filósofa Marilena Chaui não está mesmo em silêncio. Depois de falar ao Observatório da Imprensa na TV nº 349, em 18 de outubro [ver remissão abaixo], ela protagoniza a ‘entrevista explosiva’ da edição de novembro da revista Caros Amigos, nas bancas a partir de hoje, 10/11. Se o debate do Observatório manteve-se, como não podia deixar de ser, no foco do programa, que é a crítica da mídia, na Caros Amigos Marilena fala de tudo. A equipe econômica, por exemplo, não é mal-intencionada: ‘Ela é autista’, resume, ‘incapaz de levar em conta o mundo exterior’.
A professora defende programas polêmicos do governo, como o ProUni (‘não vai um grama de dinheiro público’), e analisa os possíveis rumos do PT: ‘Estamos no interior de um processo que implica desmantelar a forma da organização partidária, repensar a questão da participação eleitoral, se reorganizar para que seja um partido de militância’. E fala abertamente sobre a ‘crise política’ que, para ela, é produto da mídia, além de episódio marcante da luta de classes no país: ‘Como o governo e o partido não percebem a forma que a luta de classes tomou e são incapazes de dar um resposta verdadeiramente política ao que está acontecendo?’, questiona.
Abaixo, trechos da abertura e da longa entrevista – prova concreta de que Marilena Chaui está falando. Como nas democracias, quando quer e com quem quer.
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A mais famosa filósofa do país, Marilena Chaui, sempre polêmica, diz nesta entrevista exclusiva que a crise das CPIs foi inventada pela mídia e é um episódio marcante da luta de classes no Brasil. E que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva está se saindo muito melhor do que o retrato pintado pela grande mídia. Questionada sobre suas posições, ela afirma que o PT realmente fugiu às suas tradições, mas opina que o partido está em processo de efervescência e vai se renovar. Na sua visão, a margem para a política econômica é muito estreita, pois tem de obedecer à lógica do capital, mas o governo Lula falhou ao não aproveitar a sua grande popularidade, assim que tomou posse, para realizar de imediato uma reforma política e uma reforma tributária.
Marina Amaral – Professora, qual é a sua análise da crise política, como ela chegou até você?
A chegada dela até mim foi muito peculiar, porque, por razões de ordem estritamente pessoal, fiquei desligada do mundo do dia 24 de fevereiro até quase o final do mês de maio. E quando comecei a ler e ouvir as notícias fiquei completamente atordoada, não só pelas coisas que eram narradas, mas porque não conseguia me sentir informada. Eu tinha três sentimentos: o primeiro era que a notícia não me dava o começo de alguma coisa e o final do que estava sendo noticiado. Ou seja, eu não sabia de onde aquilo estava vindo e pra onde ia. A segunda coisa é que os noticiários desmentiam a si mesmos. Não é que um jornal dava notícia de uma maneira, o outro de outra, uma rádio de outra. Não era a pluralidade na forma de apresentar, mas o mesmo veículo de comunicação dava uma informação no dia e dava a oposta no dia seguinte, então não era possível formar um quadro porque as informações não batiam umas com as outras. E a terceira é que a minha perplexidade foi diferente da perplexidade dos meus companheiros petistas e mesmo de eleitores do PT, porque a perplexidade geral era: ‘Como o PT pode ser corrupto? Como o governo pode ser corrupto?’ E a minha perplexidade não era essa, era: ‘Como o governo e o partido não percebem a forma que a luta de classes tomou e são incapazes de uma resposta verdadeiramente política ao que está acontecendo?’ Ou seja, a minha perplexidade veio do que considero a despolitização da resposta partidária e governamental à crise que estava posta, e então eu me sentia da seguinte maneira: ou repito o que todo mundo está dizendo e, portanto, não há nenhuma contribuição a dar e fico em silêncio; ou tento compreender o que está se passando e quando me sentir em condições proponho uma análise do que está se passando. (…)