O site Observatório da Imprensa (OI) é um espaço de discussão e militância sobre as boas práticas jornalísticas. É evidente que esse veículo de crítica sobre a mídia representa um avanço para a sociedade midiatizada. É exatamente o caráter interativo que pode contribuir para uma participação mais eficaz do público no debate sobre o que a mídia produz.
No Brasil, o OI foi um dos precursores a instaurar um debate social explícito das práticas jornalísticas, na plataforma digital, sob a perspectiva dos Meios para Assegurar a Responsabilidade Social da Mídia (Mars). A permanência do projeto se deu tanto pelo emprego e inovação de recursos tecnológicos promissores quanto pelo interesse e uso por parte dos internautas. Ainda em 1996, a internet estava surgindo no país e a estrutura do site já apresentava o caráter de interatividade. O site foi um dos primeiros veículos a fazer o processo inverso de convergência midiática, pois foi criado para a web (1996), passou para o ambiente televisivo (1998) e depois ao radiofônico (2005).
Segundo informações do site, o OI tem como matéria-prima das avaliações e diagnósticos do jornalismo como um serviço público: “A Sociedade Civil deve abranger sucessivos níveis de monitoração e atuação, de forma a diminuir a distância entre os poderes e a cidadania, convertendo-se ela própria numa instância” [“Objetivos: para que serve um observatório da imprensa?” Disponível aqui. Acesso em: 1º de abril de 2011]. Desta forma, o veículo de crítica da mídia propõe-se a funcionar como um atento mediador entre a mídia e os mediados, preenchendo o espaço social, até agora “praticamente vazio”.
Modos de interação
Na sua estrutura digital, o espaço digital do OI é constituído de seções temáticas, blogs, conteúdos transpostos das mídias convencionais rádio e televisão, integração às redes sociais, mecanismos facilitadores de acesso aos conteúdos como Feeds RSS. [Os arquivos Feed apresentam-se no formato RSS – Rich Site Sumary (sumário rico do site) ou Really Simple Syndication (busca realmente simples). O recurso permite que um único leitor concentre notícias de centenas de sites diferentes e receba as atualizações, minuto a minuto, sem ter que visitar cada um deles.] Entretanto, o recurso interativo mais considerável é o lugar para comentário dos internautas, localizado nos rodapés dos artigos.
A característica de ser um fórum permanente de leitores, ouvintes, telespectadores e internautas busca abrir, de acordo com os idealizadores, “um espaço de manifestação e participação ativa, em um processo no qual, até há pouco, desempenhavam o papel de agentes passivos”. A partir desse pressuposto, foi criado um ambiente multimidiático para que o público interaja a partir de perspectivas mistas (especialista e leiga), já que neste ambiente organizado de crítica todos podem expor informações e opiniões.
Entende-se que o serviço oferecido pelo OI é apresentar um espaço de debate sobre as ações dos campos midiáticos e, consequentemente, extramidiáticos, com o intuito de auxiliar o público nas reflexões sobre as práticas e processos jornalísticos. Esta atuação é baseada em princípios éticos do jornalismo, além de ideologias não muito bem definidas, mas diversificadas, embora a organização autodenomine-se entidade civil não partidária. Portanto, este movimento apresentado pelo OI estimula a sociedade midiatizada a refletir em relação aos modos de observação sobre o que a mídia produz e faz circular, podendo fazer com que os sujeitos mudem de postura durante a assimilação dos produtos noticiosos. Isto é, de alguma forma, o veículo se dispõe a colocar em discussão as práticas jornalísticas e conceitos éticos sobre o campo midiático.
A inovação do processo interacional do OI é verificada no formato que obedece ao funcionamento da Web 2.0 [termo utilizado para designar a mudança nos usos da web. Nesse processo, há maior entendimento das regras, por parte dos usuários, para fazer bom uso da plataforma digital, aprimorando a interatividade e consequentemente a comunicação], de caráter interativo, com indispensável participação do leitor/internauta. Esta é uma lógica imposta pelo tipo de dispositivo nos seus aspectos tecnológicos e semiointerativos, frente ao propósito do gênero de crítica de mídia.
Nesses processos deve-se investigar os modos de interação e os vínculos constituídos entre organização de crítica da mídia e indivíduos na internet, ou seja, verificar por meio de que lógicas os levam a interagir nesse dispositivo.
Próximo passo
No mês de junho de 2011, durante o andamento das análises da pesquisa desenvolvida, o site OI sofreu mudanças em aspectos de layout e distribuição de conteúdos. Aos artigos dos especialistas foram integrados, com mais visibilidade, novos elementos que possibilitam maior irradiação da produção crítica: as redes sociais Facebook e Twitter. Esta mudança é uma tendência da internet no mundo inteiro, nas suas operacionalidades de produção e consumo de informações. A novidade de caráter tecnológico expandiu os acessos aos fluxos de conteúdos, gerando maior participação/disseminação da crítica produzida no veículo, a partir de indicações dos internautas nas redes sociais. Esse artigo problematiza exatamente esse ponto de discussão.
Esteticamente, o site já estava defasado e isolado, com estrutura não muito facilitadora e interessante de navegação. As mudanças foram necessárias para explorar as potencialidades oferecidas no ambiente digital, principalmente com os acionamentos e distribuição através das redes sociais, que passaram a convidar mais internautas a ingressar no processo crítico-interacional do OI. Dar movimento ao site e ampliar o tráfego de dispersão e convergência de conteúdos e usos foi uma decisão inevitável, justamente pelas tendências e comportamentos comunicacionais dos sujeitos na internet.
É evidente que a complexificação dos processos semiointeracionais, por meio de recursos tecnológicos, está relacionada ao aumento do acesso ao fluxo comunicacional. No entanto, unificar os conteúdos do site para ampliar quantitativamente o processo interativo do OI não representa a salvação da construção de crítica sobre a mídia na Web 2.0 pois, empiricamente, não há garantia qualitativa da formação de opinião quando não há uma manifestação verbal do internauta sobre o tema em debate.
A partir dessas reflexões, surgem novas proposições, as quais questionam as reconfigurações nos processos semiointeracionais do site, visando os aspectos tecnológicos como uma contextualização comunicacional do dispositivo para a construção da crítica sobre a mídia.
A proposição atual é de que as mudanças nos usos de tecnologias geram outras formas de mediações, por conseguinte, causam reconfigurações nas construções simbólicas, novas lógicas semânticas, de fluxos e acessos. Constata-se que, depois da renovação do OI, em junho de 2011, houve maior proliferação de conteúdos, isto é, um aumento do fluxo das construções críticas do site em outros locais, por meio de recursos de dispersão e irradiação, que passaram a atuar como portas de saída, rompendo limites demarcatórios que antes restringiam a interação quase que exclusivamente no site.
Percebe-se que a integração às redes sociais Twitter e Facebook pode ter diminuído o número de comentários de internautas via postagem nos rodapés dos artigos. Os leitores do site passaram a preferir acionar os interdispositivos de dispersão [interdispositivo é a nomeação categorizada dos elementos que colocam em funcionamento o dispositivo maior] a expor explicitamente suas interpretações e opiniões sobre os assuntos dos artigos.
Pode-se afirmar prescritivamente, frente às observações empíricas que, para a construção crítica legítima é insuficiente o ato compulsivo de direcionar conteúdos para outros espaços, como as redes sociais, já que não se tem a garantia de que o internauta, de fato, leu e refletiu sobre o tema do artigo. Sendo assim, não se considera crítica a reprodução ou simples lincagem que direcione a uma determinada matéria crítica.
Sobre esses processos interativos antagônicos entre reproduzir a crítica já dada e/ou elaborar uma opinião sobre determinada notícia, é feita uma analogia: o primeiro procedimento é como uma repetição e o segundo, uma repercussão da crítica. Essas posturas tomadas pelos internautas estão relacionadas a uma reconfiguração comunicacional, na qual os integrantes das redes sociais têm à disposição os recursos retuitar, no Twitter, e curtir, no Facebook. O próximo passo da investigação é saber que níveis interacionais que ocorrem nesse processo interacional, para verificar que tipo de transformação está relacionada às mudanças tecnológicas do OI.
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[Adriana Domingues Garcia é jornalista, mestranda em Ciências da Comunicação pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos)]