O New York Times não costuma publicar nomes de vítimas de crimes sexuais. No entanto, um artigo publicado no dia 22/11 sobre um garoto envolvido no caso de abusos cometidos por Jerry Sandusky, ex-assistente do técnico de futebol americano da Universidade da Pensilvânia, continha detalhes biográficos que o identificavam para qualquer um que saiba fazer uma busca na web, alegaram críticos e advogados do jovem.
Segundo o ombudsman do NYTimes, Arthur S. Brisbane [17/12/11], Michel Boni, advogado da “Vítima 1”, como o garoto é conhecido no grande júri, afirmou que o jornal deveria ter tido mais cuidado. Editores do diário contaram a Brisbane que sabiam que a matéria era delicada e discutiram-na com atenção, antes de publicá-la. Eles concluíram que era importante escrever as consequências dos crimes pelos quais Sandusky foi acusado e os detalhes biográficos da Vítima 1 precisavam ser incluídos. “Eu argumentaria que há grande valor na matéria que fizemos. Ela contou ao leitor tanto sobre como a situação evoluiu, assim como as acusações e o impacto na suposta vítima”, afirmou Philip B. Corbett, subeditor de padrões. Para Joe Sexton, editor de esportes – seção que produziu o artigo –, o jornal tentou respeitar a privacidade do jovem ao mesmo tempo em que dava credibilidade à matéria.
Perfil
A questão não é fácil para as organizações de mídia. Enquanto editores e repórteres geralmente protegem a identidade das vítimas de crimes sexuais, há situações em que estas identidades são reveladas. Um exemplo recente foi o caso contra o ex-presidente do FMI, Dominique Strauss-Kahn. A identidade da mulher que o acusou, a camareira de hotel Nafissatou Diallo, não foi revelada até que ela começou a dar entrevistas, em um esforço para pressionar promotores a levar Strauss-Kahn a julgamento.
No caso do artigo sobre a Vítima 1, o NYTimes não identificou o garoto, mas publicou detalhes que poderiam identificá-lo. O diário entrevistou dezenas de amigos, treinadores e outros envolvidos no caso para preencher o perfil da vítima, suas experiências, sua vida antes e depois de ele se tornar parte de uma investigação. Os detalhes controversos referiam-se a um acidente de carro sofrido por ele, sua recuperação e seu sucesso atlético pouco depois – elementos que atraíram mídia na época.
David Newhouse, editor do jornal The Patriot-News, que cobriu amplamente o caso Sandusky, também criticou o NYTimes, escrevendo uma coluna em 23/11 na qual afirmava que seu jornal sabia a identidade da Vítima 1, mas optou por não divulgar os detalhes para protegê-la. “Não é por acaso que a Vítima 1 foi apenas a segunda vítima a ir às autoridades, em supostos 15 anos em que Sandusky comete abusos. Matérias como estas desencorajam vítimas a falar”, opinou.
Editores do NYTimes defenderam o artigo, alegando que a identidade da Vítima 1 – que teria sofrido abusos por quatro anos, até 2009 – já era amplamente conhecida em sua comunidade. O jornal também notou que a mãe do garoto havia concedido diversas entrevistas – às redes ABC e CNN, ao Patriot-News e a um freelancer cujo artigo apareceu no site Huffington Post. Para Brisbane, tais entrevistas não justificam que o NYTimes dê detalhes que identificassem a vítima, pois a mãe manteve seu anonimato e o do filho.
Na matéria do Huffington Post, ela afirmou que está preocupada com o fato de o filho ser vítima de críticas, mas decidiu ser entrevistada porque queria que sua versão da história fosse ouvida. Ela aproveitou a entrevista para criticar o modo como a escola lidou com o caso, contestando a caracterização favorável do procurador geral da Pensilvânia em relação às ações da escola e sugerindo que um funcionário contribuiu com os ataques verbais a seu filho após ele ter revelado os abusos. Ainda assim, nada na entrevista mostrou, observa o ombudsman, que ela queria expor a identidade do filho. Pelo contrário, ela reclamou que um funcionário expôs seu filho a outros pais de alunos.