Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

De baixo para cima

Raul Juste Lores critica na Folha de S. Paulo (4/1), coberto de razão, a investida do Ministério Público Estadual contra a “prioridade dada ao pedestre” na Avenida Paulista nas noites do período natalino. Ninguém, argumenta, contestou as políticas públicas que, nos últimos 70 anos, privilegiaram o automóvel, com as consequências conhecidas.

O jornalista celebra a multidão, pois “o paulistano está sedento de espaço público, de bater perna e de ter programas que não saiam a R$ 100 o ingresso”. Menciona os exemplos das Ramblas de Barcelona, da Times Square de Nova York, da Florida de Buenos Aires e da Trafalgar Square londrina.

Lores não busca explicação para o fenômeno. Simplesmente o registra. Mas a disposição de ocupar as calçadas da Paulista não surgiu como raio em céu azul. Foi consequência da obra, há muito planejada e outro tanto adiada, que restaurou e desimpediu as calçadas, alguns anos atrás.

O móvel da boa ação

A imprensa chegou a registrar o aumento notável da circulação de pedestres na Paulista, favorecido também pela interligação de novas linhas do Metrô com o antigo trecho Clínicas-Ana Rosa. Não chegou a dizer que se trata de um dos espaços mais democráticos da cidade, onde se cruzam indivíduos de muitas camadas sociais.

O que também não se disse é que a decisão da Prefeitura de finalmente fazer a restauração tem relação com planos do mercado imobiliário, entre os quais se destaca o futuro shopping e prédio de escritórios em construção no terreno de esquina com a Pamplona onde existia a mansão da família Matarazzo, dinamitada supostamente pelos proprietários quando estava sob “ameaça” de tombamento.

Há também um prédio erguido em velocidade recorde ao lado do famoso Masp (ambos do lado par) e outro em construção no quarteirão entre Ministro Rocha Azevedo e Padre João Manuel, lado ímpar, perto do Parque Mario Covas, cuja criação, no lugar de antigo terreno baldio, funcionou positivamente.

O bom senso da CET

As calçadas mereceriam material mais nobre do que o usado pela Prefeitura, mas ainda assim os frequentadores da Paulista reagiram muito positivamente às melhorias. O policiamento ostensivo, após alguns latrocínios e muitos roubos, foi reforçado.

É possível que essa nova vibração tenha animado as empresas que montam cenários natalinos a gastar mais na decoração e na iluminação. E veio tamanho congestionamento humano que o trânsito de veículos andou sendo interrompido, o que mostrou bom senso da CET.

Mas essa história começou na base, no chão. Se alguém tinha previsto toda essa consequência humana, parabéns. O mais provável, porém, é que o comportamento dessas centenas de milhares de pessoas tenha sido um desdobramento inesperado — e virtuoso — de providências mínimas, embora dispendiosas, como tudo em São Paulo, tomadas pela Prefeitura.