Thursday, 19 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

José Sergio Rocha

‘O ator Fulano agride o fotógrafo Beltrano porque foi flagrado pelo jornalista numa boate beijando uma amiga. A sentença inteira está errada porque parte da premissa de que estava sendo feita uma reportagem na casa noturna.

Dói essa comparação de um fotógrafo de revista sensacionalista aos profissionais que têm formação jornalística e, por esta razão, são chamados corretamente de repórteres fotográficos.

Igualmente dói ler que o presidente Lula e seu ministro Luís Gushiken elegeram o Dia do Jornalista, 7 de abril, para fazer algo que nem os coronéis assessores de imprensa da ditadura ousaram nos anos de chumbo: repreender uma categoria inteira.

O presidente e o ministro ao qual confiou a tarefa de distribuir os anúncios do governo disseram que a imprensa deve ser leal ao governo. Ao mesmo tempo em que se recusam a revelar a relação dos veículos aquinhoados com a verba oficial, ainda tripudiaram: na greve de 1979, segundo o Planalto, os empresários descobriram que podiam fazer jornal sem jornalistas.

Para início de conversa, jornalista só tem que prestar contas ao editor e aos leitores. Quanto a verbas de propaganda, elas saem do bolso de todos nós e, portanto, jornalistas ou não, todos devem saber como esse dinheirinho é empregado. E, finalmente, mesmo nas paralisações, jornais sempre foram feitos por jornalistas. No caso, pelos que não aderiram às greves, sejam quais tenham sido seus motivos. A propósito, desculpem a primeira pessoa, nunca furei.

Mas o que é que o esporro presidencial tem a ver com paparazzi agredidos em boate? Tudo a ver nestes tempos big brother, em que o sonho de muita gente é ser observada num zoológico e faturar algum com isso. A propósito, existe uma publicação dirigida a esse público e não fomos nós, do Bananão (com a licença de Ivan Lessa), que inventamos essas macaquices.

Com tantos e tão graves acontecimentos pipocando mundo afora e na porta de casa, um tipo de imprensa que já foi malvisto hoje é tido como sinônimo de jornalismo para a maioria dos leitores. O jornalista que se orgulha do papel de fofoqueiro com diploma mereceu ouvir o besteirol do dia 7. E tem mais que ficar quieto.

É o caso dos falsos profissionais que dizem que não inventam, apenas aumentam, bordão de um calejado e oxigenado apresentador de TV.

É também como devem permanecer – quietinhos, enfiando o galho dentro – os colegas até de jornais importantes que chamam Xuxa de ‘rainha dos baixinhos’ nas matérias que assinam.

E aí se incluem, ainda, os ingênuos que apuram e publicam brigas de boates que podem perfeitamente ter sido pautadas pelos próprios envolvidos.

Já a imensa maioria dos que recusam esses papéis nada higiênicos tem todo o direito de espernear. E de lamentar que as pessoas a quem o governo foi confiado pelo voto, mesmo indiretamente, tenham algum ‘papa da auto-ajuda’ como autor de cabeceira.

Isso explica o comportamento deles. Agora vamos procurar uma boa desculpa para o nosso e dizer aos leitores que nos restam. (*) Jornalista’



Ancelmo Gois

‘Nota’, copyright O Globo, 13/04/04

‘Luiz Gushiken, ao pedir à imprensa notícia boa, lembra Costa e Silva. Nos anos 60, o marechal reclamou com a Condessa Pereira Carneiro, dona do JB, dizendo que o jornal fazia muitas críticas ao governo. Ela argumentou que eram ‘críticas construtivas’. No que o marechal rebateu: ‘Pode ser, mas prefiro mesmo é elogio.’’



Paulo Castelo Branco

‘Boas notícias’, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 16/04/04

‘O presidente Lula pediu à imprensa uma ‘relação leal’, e o ministro Luiz Gushiken pediu um pouco mais; pediu boas notícias. A imprensa brasileira não deu bola para os pedidos, mesmo tendo sido feitos no Dia do Jornalista. Ao contrário, vários articulistas ponderaram que é impossível falar de coisas boas se elas não existirem de fato.

Mas as boas notícias, se não surgiram nos jornais nacionais, foram estampadas em noticiário do exterior. O jornal inglês The Sunday Times publicou matéria na qual conta tudo sobre as coisas boas do Brasil, além de apontar nosso País como o ‘mais quente da Terra’. A matéria trata de assuntos que vão desde as cirurgias plásticas até a utilização de motéis. Os ingleses estão muito animados com o País descoberto por um dos seus mais famosos assaltantes, Ronald Biggs, que, fugido das prisões inglesas, tornou-se personagem carioca, adquiriu trejeitos, contou histórias e faturou uma grana para sobreviver. Aqui, tornou-se celebridade, casou-se com uma brasileira e teve um filho que fez sucesso em programas da nossa televisão.

A nova geração de filmes que contam as nossas misérias, como Cidade de Deus e Carandiru, que retratam, com realidade, o cotidiano das grandes cidades, motivam os ingleses a virem assistir, ao vivo, à guerra civil que é travada no Rio de Janeiro. A notícia é boa, pois, apesar dos problemas, a paisagem carioca é linda, e qualquer vendedor de picolé arranha a língua de Shakespeare, estando apto a dar sinal de perigo aos gringos.

O culto ao corpo e a miscigenação das raças encantam os súditos da rainha e os animam com a possibilidade de conquistas fáceis e a rapidinha nos motéis. Os seios siliconados e as bundas reforçadas por exercícios que as deixam redondinhas convidam homens ávidos por prazeres a buscar o Brasil para gozar a vida. Os ingleses estão, realmente, admirados com o País.

Na reportagem de boas notícias são oferecidas dicas de comportamento para os dias de sol forte na praia. Os autores dizem que não se deve usar as toalhas fornecidas pelos hotéis; explicam que basta chegar na areia e pedir um cantinho na canga das moças e atravessar uma conversa para início de um romance. Os ingleses citam as telenovelas como sucesso entre as famílias e, também, o favoritismo das churrascarias na preferência nacional. Constatam que as diferenças de classes sociais favorecem a contratação de empregadas domésticas para os serviços mais simples como arrumar a cama e cozinhar.

O repórter concluiu que a diversidade cultural, racial e social do Brasil, aliada a sua distância geográfica das grandes potências, contribui para tornar as manifestações culturais do País mais interessantes, além de constatar que a eleição de um trabalhador foi boa para mostrar o País à comunidade mundial, e, com fecho de ouro, afirma: ‘O Brasil pode não ser o País do futuro, mas está caminhando para isso’.

Essa reportagem do The Sunday Times, apesar de apresentar boas notícias que podem ser ditas sobre o nosso governo inerte, nos faz retornar à luta do governo que saiu no combate ao turismo sexual que prejudicou vidas de milhares de meninas envolvidas por promessas de um mundo melhor. O discurso que nos chegou, na eleição presidencial, era da geração de milhões de empregos, segurança e paz. Hoje, a notícia boa é que os gastos do governo estão abaixo do esperado. O que não deixa de ser bom, pois, pode-se não fazer nada, mas também não se gasta.

O País está estagnado, mas é bom, como dizem os ingleses e, também, dizia Tom Jobim. O compositor, quando voltava de Nova York, depois de longa temporada ao lado de Frank Sinatra, foi questionado por um repórter: ‘Tom, qual cidade é melhor, Rio ou Nova York?’. Tom respondeu: ‘Nova York é bom, mas é uma m…; o Rio é uma m…, mas é bom’. Como diriam os ingleses: ‘The government is sh…, but it’s great! It’s a good news!’. (*) Advogado.’



Painel, Folha de S. Paulo

‘Últimas Notícias’, copyright Folha de S. Paulo, 13/04/04

‘Não estava nos planos do ‘Jornal Nacional’ de sábado entrevistar FHC. Mas o correspondente em Recife teve a atenção despertada pela imprensa local, que se deslocou em peso até Porto de Galinhas para registrar a nova fornada de restrições do ex-presidente ao governo Lula.

Celebridade

Antes de falar à Globo, FHC deu entrevistas aos principais jornais de Pernambuco. Em dois deles ganhou página inteira. No terceiro, quase isso.’



Zero Hora

‘A verdade oficial’, Editorial, copyright Zero Hora, 9/04/04

‘O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o chefe da Secretaria de Comunicação de Governo e Gestão Estratégica, Luiz Gushiken, aproveitaram a passagem do Dia do Jornalista, na última quarta-feira, para emitir algumas críticas ao trabalho da imprensa. Gushiken foi mais contundente, sugerindo que os meios de comunicação dêem mais atenção à agenda positiva do governo e menos destaque ‘à exploração do contraditório’, que no seu entender pode fomentar discórdias e conflitos de egos. Em tom mais ameno, o presidente da República cobrou da imprensa que se paute pela verdade dos fatos e não pelos interesses dos proprietários dos meios de comunicação.

Em primeiro lugar, é muito bom para a democracia brasileira que os governantes tenham queixas da imprensa. Significa que os meios de comunicação estão cumprindo o papel que lhes compete na vigilância da administração e na defesa dos interesses da sociedade. Seria preocupante para o país, em relação à imprensa, se o governo estivesse plenamente satisfeito e a população contrariada.

Mas as observações dos homens do governo também são oportunas para que se compartilhe com a opinião pública uma reflexão sobre as relações da imprensa com o governo. Equivoca-se o presidente da República quando supõe que os meios de comunicação defendem apenas os interesses de seus proprietários. Estes são os primeiros a saber que um veículo de informação descomprometido com o interesse público será sempre um mau negócio. Jornais e emissoras que não informam corretamente perdem audiência e publicidade. A prosperidade de uma empresa de comunicação está diretamente relacionada com a sua capacidade de satisfazer os interesses e as necessidades de seus públicos. Também por isso, as empresas responsáveis procuram formar seus quadros com profissionais competentes e éticos.

A busca da verdade é um desafio permanente para os jornalistas e para os veículos de comunicação. Mas não a busca da verdade oficial, como parece sugerir o senhor Gushiken ao defender a divulgação da agenda positiva do governo. O que cabe à imprensa é examinar a agenda governamental e divulgá-la na sua totalidade, incluindo aspectos positivos e negativos, de modo a oferecer aos cidadãos todos os elementos para que eles formem livremente o seu próprio juízo sobre o país.

O governo, por sua natureza, é uma fonte geradora de notícias, boas e más. Não há como tirá-lo do foco da mídia. A imprensa brasileira, como a de outros países, comete erros e possui as mesmas deformações de outros segmentos sociais. Mas sua sobrevivência está diretamente ligada às instituições democráticas e à credibilidade junto à opinião pública. Até por isso, não pode conspirar contra o governo, nem se dedicar à busca de coisas negativas, como desconfiam alguns integrantes da atual administração.

A relação de lealdade da imprensa – reclamada pelo presidente – tem que ser estabelecida prioritariamente com a sociedade, à qual cabe julgar qual a verdade que melhor satisfaz os seus interesses.’