À medida que o inquérito conduzido pelo juiz (lorde) Leveson e uma série de outras investigações chegam ao clímax, as organizações de mídia da Grã-Bretanha enfrentam um ano crucial que poderia definir a indústria por uma geração, segundo acadêmicos e analistas. A investigação de lorde Leveson sobre os padrões dos jornais é apenas um de pelo menos 13 inquéritos encaminhados pela polícia, pelo parlamento e por medidas regulatórias em 2012 em relação aos escândalos envolvendo ética em 2011 e ao futuro da mídia televisiva, impressa e digital num prazo mais longo.
A primeira delas, conduzida pela parlamentar Elizabeth Filkin, investiga a relação entre a polícia e a mídia e o inquérito de Leveson será retomado na próxima semana, quando editores e proprietários de jornais são considerados as primeiras testemunhas do novo ano.
Outros relatórios irão vazando ao longo dos próximos 12 meses, inclusive um estudo fundamental sobre a propriedade da mídia feito pelo Ofcom, órgão regulador das emissoras, encomendado pelo governo, à medida que os ministros se preparam para divulgar um livro branco no início de 2013 para uma próxima regulamentação das comunicações. Muitos observadores acreditam que esse instrumento de legislação, que pretende responder aos desafios da era digital, pode ser o mais importante jamais redigido para a mídia britânica.
Possíveis ramificações
Nesse meio tempo, advogados esperam uma série de acusações criminais contra algumas das pessoas que foram detidas por ocasião do escândalo das escutas clandestinas – que desencadearam o inquérito de lorde Leveson e cujos julgamentos poderão ocorrer mesmo antes dos relatórios de Leveson sobre suas primeiras descobertas, previstos para o outono. Também nesse meio tempo, espera-se que ações judiciais contra o News of the World, de Rupert Murdoch, comecem em fevereiro, com depoimentos de personalidades famosas, como o ator Jude Law. “Talvez não venhamos a ver a cobertura saturada de 2011, mas haverá muitas manchetes em 2012”, segundo George Brock, professor e chefe do departamento de Jornalismo da Universidade da City e ex-editor administrativo do Times.
Essa alimentação a conta-gotas de assuntos negativos pode ter ramificações junto a alguns dos nomes mais importantes da mídia britânica, como Rupert Murdoch, cuja empresa News Corp. é proprietária dos jornais The Sun, The Times e The Sunday Times, além de controlar a British Sky Broadcasting. Entre eles, seus recursos têm cerca de 13 milhões de clientes permanentes na Grã-Bretanha, mesmo depois do fechamento do News of the World em julho passado, quando irrompeu o escândalo das escutas clandestinas no tabloide dominical.
Relatórios para os próximos 12 meses
** O livro branco do Departamento para a Cultura, Mídia e Esporte sobre a próxima regulamentação das comunicações
** O estudo do Ofcom sobre pluralidade e concentração de propriedade da mídia
** Inquéritos policiais: Operação Weeting, sobre escutas telefônicas; Operação Tuleta, sobre pirataria eletrônica; e Operação Elveden, sobre pagamentos por corrupção a policiais pela imprensa
** O relatório de Elizabeth Filkin sobre as relações entre a polícia e os jornalistas
** O inquérito conjunto (Câmara alta e Câmara dos Comuns) sobre privacidade e mandados judiciais
** O comitê de cultura, mídia e esporte, criado pela Câmara dos Comuns, sobre escutas telefônicas
** O comitê de cultura, mídia e esporte, criado pela Câmara dos Comuns, sobre pluralidade e propriedade da mídia
** O comitê de inquérito de assuntos internos, criado pela Câmara dos Comuns, sobre investigação de escutas telefônicas pela polícia
** O inquérito do comitê de comunicações, da Câmara alta, sobre o futuro do jornalismo investigativo
** O inquérito do comitê de comunicações, da Câmara alta, sobre a governança e regulação da BBC
** O estudo do Ofcom sobre concessões à televisão local
** O estudo do Ofcom sobre o tratamento a ser dado às queixas sobre concorrência e regulação que afetam a mídia
Um serviço ao público
George Brock disse que não imagina a News Corp. em posição de voltar a lançar uma nova oferta pela BskyB em 2012 devido à contínua publicidade negativa em torno da empresa. Nos inquéritos parlamentares do comitê de cultura, mídia e esporte, criado pela Câmara dos Comuns, a serem instalados no início deste ano, espera-se que apresentem suas descobertas sobre o escândalo das escutas clandestinas. Foi perante esse comitê que, em julho passado, Murdoch e seu filho James, presidente executivo da News Corp. na Grã-Bretanha, tiveram uma sessão extenuante.
No mês de novembro, após os depoimentos de dois executivos do News of the World que entraram em contradição com sua declaração, o filho de Murdoch foi informado que se sabia do quanto e desde quando ele conhecia a existência de escutas telefônicas. Desde então, surgiram novas provas documentais sugerindo que ele soubera detalhes sobre o escândalo desde o início, ao contrário do que disse ao comitê, quando afirmou por escrito que não lera esses detalhes. Caso o relatório do comitê o denuncie criticamente, isso causaria novos problemas para a News Corp., que vem tentando restabelecer sua reputação abalada na Grã-Bretanha.
O relatório de lorde Leveson sobre a ética, os padrões e o comportamento da imprensa continuará examinando a relação entre os jornais e o público nas próximas semanas, antes de investigar as relações com a polícia e, por fim, com políticos.
Steven Barnett, professor de Comunicação na Universidade de Westminster, disse que este terceiro “módulo” sobre “a relação conspiratória entre personalidades do primeiro escalão do governo e a imprensa” poderia prestar um importantíssimo serviço ao público. Julian Petley, professor de Jornalismo na Universidade Brunel, disse que não existem provas de que o público seja contrário a uma regulação da imprensa e que se a indústria não fizer importantes concessões em termos de autorregulação o desfecho poderia vir a ser muito pior. Mas Barnett disse que se os jornais se unissem para propor soluções, lorde Leveson dificilmente se oporia a elas.
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[Ben Fenton é correspondente do Financial Times]