Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Publicidade para tuiteiros

Marco Gomes saiu do Gama, umas das mais violentas cidades-satélite de Brasília, para entrar na UnB e chefiar uma equipe de 15 pessoas em uma agência de publicidade. Abandonou tudo para abrir a própria empresa – aos 20 anos. Hoje, a boo-box atinge 80% dos internautas brasileiros e, no ano passado, expandiu suas operações para o restante da América Latina. Eis o seu depoimento:

“Eu sabia que estava num lugar perigoso, e coisas ruins aconteciam. Era ruim meu pai usar cocaína, era ruim meu primo ser apedrejado. Mas quando você é criança, cara, é mais fácil ser feliz. Nunca senti que precisava superar o Gama. Em 2003, entrei na UnB aos 17 anos para fazer computação. No fim do primeiro ano, fui contratado por uma agência de publicidade. Virei muitas noites até que em dois anos já era líder de uma equipe de 15 programadores. Só saí da agência para abrir minha empresa.

Percebi que a minha geração estava em ambientes até então inexplorados pela publicidade, voltada aos portais de notícia. Minha geração não acessava os portais. A gente entrava nos blogs de amigos para ver vídeos, nos fóruns para conversar sobre jogos. Acessava as redes sociais, o Orkut e o Twitter.

Em 2006, criei um modelo de publicidade contextual que considera o conteúdo publicado na internet para exibir publicidade específica para a audiência dele. Na época, era um mercado dominado pelo Google, faturando US$ 1 bilhão sozinho. Passei quatro madrugadas dormindo uma, duas horas, porque tinha que acordar às 8h para trabalhar. O projeto chamou a atenção do maior site de tecnologia do mundo, o TechCrunch. Eles são difíceis de agradar. Dificilmente falam de ideias de fora do Vale do Silício. Publicaram uma reportagem em janeiro de 2007. É um carimbo do mercado dizendo que o negócio é interessante.

Quarto mofado, cama horrível

Recebi contato de muito investidor querendo ser parceiro de negócio. Quem mais me agradou foi o pessoal da Monashees. Quando fechei com eles, tinha 20 anos, não sabia contratar, nem emitir nota fiscal. Sabia apenas programar. Eu era um programador querendo fazer algo que achava interessante, mas não tinha noção de que ia virar uma empresa que atingiria 65 milhões de pessoas com 3 bilhões de anúncios por mês. Como eu não tinha visão de negócio, eles me apresentaram a Marcos Tanaka, hoje presidente-executivo da empresa. Ele fazia consultoria estratégica para marcas como Itaú e Coca-Cola.

Larguei a universidade e o emprego e fui para São Paulo. Morei na casa de uma amiga durante três meses. Fiquei num albergue por um ano. Lá dividi um quarto por seis meses com quatro pessoas; depois aluguei um só para mim. Morando em um albergue, quarto mofado, a cama horrível, comendo miojo quatro vezes por semana, era isso que eu queria mudar. Coisa que eu nunca pensei quando estava no Gama. Só em 2011 fui morar sozinho. Sozinho, não, porque acabei de casar.

Ora concorrente, ora parceiro

Inicialmente, achei que a boo-box anunciaria produto, não marcas. Nossa ideia era trabalhar com e-commerce, com venda direta de produtos. Mas as agências de publicidade se mostraram mais interessantes. E favorecia a audiência, por causa do conteúdo que eles produzem. Achei que fecharíamos os primeiros contratos em três meses e teríamos receitas sólidas. Mas demoramos 18 meses. Crescemos a ponto de nos tornarmos lucrativos em 2010. Tanto que a Intel Capital nos escolheu para fazer investimento. Foram US$ 77 milhões divididos entre 18 empresas; a boo-box foi a única brasileira. Já não somos uma startup [empresa iniciante]. Temos conselho administrativo. Acabamos de criar o Grupo 42, com a Popego, para, da Argentina, atuarmos na América Latina inteira.

Ser empreendedor é um estilo de vida. Não tem essa de desligar o computador na sexta e só ligar na segunda.

No nosso caso, toda mídia é concorrente. Mas ninguém com um produto semelhante. Cooperamos muito com quem seria concorrente nosso. O Google ora é nosso concorrente, ora nosso parceiro. Essa concepção antiga de competição não funciona bem na internet.”

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[Depoimento concedido a Helton Simões Gomes, da Folha de S.Paulo]