Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Amelia Gonzalez

‘Há algo de mágico no humor ingênuo. E há algo de surpreendente quando dois comediantes como Ronald Golias e Moacyr Franco conseguem, com quase meio século de estrada, fazer rir e dar ao SBT uma audiência como há muito tempo a emissora não via. ‘Meu cunhado’, sitcom cujo segundo episódio vai ao ar hoje às 21h30m, registrou média de 21 pontos na estréia, quarta-feira passada. A trama? Washington Cantapedra (Moacyr), homem viúvo, rico e solitário, apaixona-se por Simone (Guilhermina Guinle), a bela irmã de um trapaceiro irreverente: nada mais nada menos do que Bronco, personagem eterno de Golias.

‘Meu cunhado’ parece que vai ser desses fenômenos inexplicáveis que acontecem na televisão e incitam a nossa vã capacidade de teorizar. O seriado fez sucesso assim: no vídeo que o personagem Cantapedra produz para mandar à sua família na Itália, ele apresenta Corina (Cláudia Mello), a secretária, com o eterno chavão: ‘Ela é meu braço-direito’. E Bronco, que trocou o boné com aba para trás por uma gravata mal posta, retruca na frente da câmera, só para irritar: ‘Ela é canhota’… Pode?

Seriado tem origemem projeto argentino

O saudosismo pode explicar. Quando Golias aparece em cena, o público com mais de 40 se lembra logo do grito: ‘Ô Crides!’, que ele dava sempre que entrava no ‘A praça é nossa’, humorístico que entrou no ar em 1956. É uma audiência cativa, sim, mas não segura ninguém na poltrona por muito tempo.

Já a vontade de relaxar e rir… Isso funciona desde que mundo é mundo. Daí o sucesso dos humorísticos. Os mais sofisticados satirizam e trazem para a telinha fatos estressantes do dia-a-dia com uma linguagem engraçada. Desopila, faz graça da raiva, transforma em risadas a indignação contra guerras, violência urbana e maus políticos.

Pelo que se pôde ver no primeiro episódio, ‘Meu cunhado’ não tem esta proposta. Quando a atabalhoada secretária solta a porta de mola atrás de si com uma bandeja na mão e deixa o traseiro no caminho, ela está reproduzindo uma cena do dia-a-dia, sim. Mas da rotina caseira, que pode acontecer com qualquer um e é engraçada.

‘Meu cunhado’ aposta na ingenuidade e parece ter acertado o alvo. Quer seja pela quantidade excessiva de dramas que o brasileiro anda presenciando na vida real, quer seja por uma necessidade milenar de escapismo, rir é um bom remédio. Golias, que começou em 1954 sua carreira de humorista, sabe disso e não esconde que sabe quando fica zarolho de raiva, imposta a voz para bancar o galã e encarna o malandro que apronta todas e se dá bem no final. É o protótipo do herói nacional.

E querem saber a melhor? Bronco, ou melhor, o Cunhado, nem brasileiro é. Na verdade, o seriado é uma produção argentina. Em 1996, Silvio Santos comprou 13 capítulos da emissora argentina Telefe, mas engavetou o projeto. Há cerca de três anos Moacyr Franco recuperou-o e fez uma produção independente junto com o filho Guto Franco. Deu no que deu.’



MISS BRASIL 2004
Artur Xexéo

‘Barraco nos bastidores do concurso de misses’, copyright O Globo, 21/04/04

‘O concurso de misses que Marlene Mattos promoveu na Rede Bandeirantes há uma semana já tinha motivos de sobra para entrar na História. Por exemplo, foi o primeiro concurso de todos os tempos – e deve-se incluir aí os certames que escolhem a mulher mais bonita do país em todo o planeta – em que as misses desfilaram de óculos escuros. Deu para entender? Um concurso que, teoricamente, pretende mostrar como as candidatas são bonitas arranja um jeito de esconder a beleza das moças. Genial, não?

Outra sacada sensacional da equipe de Marlene Mattos: o tradicional desfile de trajes de gala fez com que todas as misses desfilassem de preto e branco, com predominância do preto. A inspiração era óbvia: Cecil Beaton e as corridas de Ascot no filme ‘My fair lady’. Só que o que era bonito no filme ficou triste no Miss Brasil. Quando todas as candidatas se juntaram no palco, dava a impressão de a TV Bandeirantes estar transmitindo um velório concorridíssimo. (Seria uma metáfora? O enterro definitivo do Miss Brasil?)

A rede de TV tentou vender para o público a idéia de que a transmissão deste ano consagraria ‘o resgate do glamour’. Agora, me explica, dá para resgatar glamour com Alexandre Pires fazendo o show do intervalo? Ou Zezé di Camargo e Luciano fazendo brincadeiras no palco? Ou Wanessa Camargo no júri? Ou um apresentador que chama Adalgisa Colombo de Adagisa? Ou uma série de VIPs na primeira fila formada por Astrid, Preta Gil, Viviane Shoptime?

Quem não acompanhou o concurso nos últimos anos – isto é, praticamente todo mundo – pode ter estranhado também a participação de Nayla Misherif como apresentadora. O que é Nayla Misherif? Bem, Nayla foi uma Miss Brasil daquele tempo em que ninguém mais sabia quem era a Miss Brasil. Como uma Miss Brasil dos bons tempos, seu principal prêmio foi um bom casamento. Nayla casou-se com um empresário que, de presente, deu-lhe os direitos do concurso. Moral da história: já há dois ou três anos, Nayla é a apresentadora. Tudo indica que faz parte do contrato que ela assina com as estações de TV que acham uma boa idéia transmitir o certame. Já foi a CNT. Agora é a Bandeirantes. Também deve estar no contrato a exigência de Nayla mudar de roupa a cada vez que é focalizada por uma câmera. É o que tem de mais divertido no programa. Como é que Nayla Misherif vai aparecer na próxima cena? Ela nunca decepciona.

Mas havia uma verdadeira boa idéia no plano de Marlene Mattos de ‘resgatar o glamour’. A nova toda-poderosa da Bandeirantes imaginou uma homenagem a todas as 50 misses que já ganharam o Miss Brasil. Nem todas apareceram. Mas muita gente estava lá: Martha Rocha, Adagisa… opa! Adalgisa Colombo, Ana Cristina Ridzi, Gina McPherson, Eliane Thompson, Vera Lucia Couto…

Não foi fácil reuni-las. A coluna Gente Boa contou alguns dos problemas que antecederam o encontro no palco de toda aquela mulherada. Algumas tiveram que receber uma ajuda de custo para ir a São Paulo. Outras reivindicaram cachê. Marlene explicou que pagar cachê seria como pagar para um convidado ir a uma festa.

No palco – excetuando-se o improviso que marcou toda a transmissão do desfile – tudo parecia bem com as misses homenageadas. Mas, na verdade, todas estavam insatisfeitas. Ana Cristina Ridzi, a candidata que venceu uma irmã gêmea no concurso de Miss Guanabara e acabou ganhando o Miss Brasil, é a porta-voz do grupo:

‘O convite para participarmos de ‘uma celebração prazerosa’ foi o maior embuste que aconteceu nesses 50 anos de Miss Brasil. Desorganização completa: fomos destratadas, a começar pela hospedagem sem direito a nada (telefone-mudo, frigobar vazio – não tinha nem água). A muito custo, foram liberadas ligações telefônicas internas e a água’, reclama em carta a Marlene Mattos.

‘Parecíamos estar pagando para participar da sua festa ( de Marlene Mattos ), onde os únicos amigos bem-vindos eram os seus ( de Marlene Mattos ) agenciados Wanessa Camargo, Zezé di Camargo e Luciano e outros, que têm interesses financeiros em aparecer’, continua.

E Ana Cristina solta o verbo: ‘Quando se convida para a casa de um amigo, como foi dito pela senhora ( Marlene Mattos ) em nota publicada ( na coluna Gente Boa ), não se cobra, tem razão, mas pelo menos o dono da casa que convida deve recepcioná-lo bem e fazer as honras da casa, como um bom anfitrião, e jamais ganhar dinheiro/audiência em função destes. Amigos não são deixados durante cinco horas em pé nos bastidores do evento, sem cadeira, sem água, sendo empurrados de um lado para o outro, quando o convite teria sido uma suposta celebração e homenagem. Nosso nome foi usado por sua assessoria de imprensa, divulgando a homenagem às misses do Brasil. De forma jocosa, sugeriu-se a ajuda de custo às misses ‘quase falidas’. Usaram a nossa imagem durante 28 dias, em vinhetas comunicando a data do evento. Não fomos convidadas para a casa de amigos, e sim para receber uma homenagem de uma rede aberta de televisão, que estava ganhando dinheiro com o evento.’

Cinco horas em pé? Sem água? Sem frigobar no hotel? Sem telefone? Marlene Mattos expandiu o conceito de ‘resgate do glamour’.’



FUTEBOL NA TV
Daniel Castro

‘Paulista do ‘fiasco’ foi bom para Globo’, copyright Folha de S. Paulo, 21/04/04

‘O Campeonato Paulista em que o Corinthians (time de maior ex posição na TV) quase foi rebaixa do e que teve finais sem grande audiência não foi ruim para a Glo bo. A rigor, foi melhor do que o de 2003, marcado pela disputa judi cial entre a Globo e o SBT pelo di reito de transmissão do torneio.

Levantamento exclusivo obtido pela Folha mostra que a Globo te ve média de 22,2 pontos com o campeonato de 2003. Neste ano, a média subiu para 25,6. Cada pon to no Ibope equivale a 48,5 mil do micílios na Grande São Paulo.

Esse crescimento se explica pela saída do SBT das transmissões. No ano passado, a Globo não transmitiu todos os jogos.

Neste ano, a Record, que só transmitiu jogos exibidos pela Globo, teve média de 4 pontos com o Paulista, menos da metade do que no ano passado (8,5).

Em 2003, o SBT teve 10 pontos de média com o Paulista. A soma das três emissoras em 2003 dá 41,1 pontos, contra 29,6 pontos de Globo e Record em 2004. A com paração com esses números não é correta porque as redes não exibi ram os mesmos jogos tanto em 2003 como em 2004.

Mas o Paulista-04 deu, sim, me nos audiência. Neste ano, o jogo mais visto foi Paulista x Palmeiras (34 pontos na Globo). Globo e Re cord somaram 32 pontos com São Caetano e Paulista. Em 2003, Glo bo e SBT tiveram 52 com a dispu ta pelo título entre Corinthians e São Paulo.

OUTRO CANAL

Batizado

Vai se chamar ‘Casos de Família’ (caso venha a ser exibido) o projeto secreto desenvolvido para o SBT por um grupo de peruanos contratados por Silvio Santos. Com esse nome, o programa foi classificado como livre pelo Ministério da Justiça, em despacho publicado ontem no ‘Diário Oficial’.

Sem mistério

Nos bastidores do SBT, ‘Casos de Família’ é descrito como um programa que discute temas comuns nas melhores famílias, como conflitos entre noras e sogras e caçulas e primogênitos. Empolgante, não?

Cadeira

Ex-diretor do ‘Domingão do Faustão’ nos anos 90, Deto Costa foi contratado pela Record, onde será diretor de criação. Na Globo, ele também atuava em núcleo criativo.

Moribunda

Não há mais plástica que salve ‘Metamorphoses’, da Record, que pretendia o segundo lugar no Ibope, com médias de 20 pontos. Anteontem, a novela perdeu até para o ‘TV Fama’, da Rede TV!, por 5 pontos a 3. E derrubou o ‘Jornal da Record’ (também 3 pontos), de Boris Casoy, que mudou de horário para ajudá-la.

Trash

Quem acha que já viu de tudo na televisão não pode perder o ‘Tarde Quente’, que estreou anteontem na Rede TV! com um julgamento ‘fake’ de um estuprador e 1,2 ponto no Ibope.’



CRÍTICA / TV PÚBLICA
Esther Hamburger

‘TV pública deve mostrar independência’, copyright Folha de S. Paulo, 21/04/04

‘A TV pública no Brasil é mais importante do que parece e deveria oferecer parâmetros independentes de governos e anunciantes.

Em um momento em que as emissoras comerciais, em crise financeira, se dedicam a repetir fórmulas superficiais e sensacionalistas, caberia às TVs públicas -estaduais e federais- atender o interesse dos espectadores.

Acompanhamos apreensivos mais um capítulo na crise da TV Cultura. O conselho da Fundação Padre Anchieta, que mantém o canal de televisão e as emissoras de rádio, optou, na última segunda-feira, por evitar o confronto entre o atual presidente, candidato a um terceiro mandato, e o ex-Secretário da Cultura do Estado, seu antigo superior, que lhe opôs resistência.

O que chegou a ser anunciado como um embate entre defensores de concepções diferentes da coisa pública acabou em um acordo de cavalheiros.

Uma rápida mudança de estatutos garantiu a criação de remuneração para o Presidente do Conselho, abrindo a possibilidade de acomodação dos dois candidatos. As eleições foram adiadas para o dia 10 de maio.

Certamente bem-intencionado, o Conselho Curador composto por representantes de organismos estaduais e municipais ligados à educação e à cultura, além de personalidades, se dispôs a colaborar mais intensamente com a emissora.

O comunicado oficial da reunião, à qual compareceram 32 dos 40 membros, menciona comissões consultivas de trabalho compostas por profissionais idôneos e de reconhecida competência. Uma lista completa dos membros do Conselho Curador está disponível no site da emissora (www.tvcultura.com.br).

Infelizmente, no entanto, nada foi mencionado quanto ao programa de gestão e/ou o conceito de programação que se pretende com a reformulação. O modelo de parceria funciona? Programações de qualidade como ‘Contos da Meia-Noite’ deveriam ser pensadas para o horário nobre?

Na ausência de conteúdos substantivos, a criação do cargo remunerado aparece como a informação mais relevante, o que é constrangedor.

A sociedade espera que o Conselho da Fundação Padre Anchieta e os candidatos à direção tomem a iniciativa de propor rumos substantivos para superar uma crise que se arrasta.

Esther Hamburger é antropóloga e professora da ECA-USP’