O índice elevado de analfabetismo no país (22,8 milhões de brasileiros, o que corresponde a 13,8% da população com mais de 15 anos de idade, além dos 30,5% de analfabetos funcionais, aqueles com menos de quatro anos de escolaridade, de acordo com o IBGE), a carência de parte do sistema educacional e a desigualdade social e econômica mostram um quadro preocupante há anos. Promover transformações urgentes e necessárias em diversos níveis depende da atuação de bons educadores. De preferência, amparados por um projeto de aproveitamento de impressos (jornal e revista) na educação.
Utilizados como mídia coletiva, auxiliando alunos, professores, pais e demais integrantes da sociedade, podem servir como ferramenta de aproximação dos envolvidos com temas do mundo contemporâneo, auxiliar como instrumento de formação continuada, além de tornar-se meio para a busca por oportunidades de melhorias, inclusive, nas condições de vida de uma comunidade. Segundo Joana Pontual em O jornal como proposta pedagógica, ler uma notícia é também poder olhar um pouco para si mesmo. É tornar-se mais consciente de seu papel no mundo’. Por isso, chega em boa hora CartaCapital na Escola, revista dirigida aos professores brasileiros, das escolas públicas e privadas, com tiragem de lançamento de 25 mil exemplares, distribuídos aos professores de 2.647 escolas públicas de ensino médio de 26 cidades brasileiras.
De acordo com a Associação Mundial dos Jornais, que reúne 18 mil empresas de comunicação, existem projetos de jornais na educação em 52 países. O primeiro jornal a ser usado como instrumento didático foi The New York Times, que em 1932 montou um programa educacional. No Brasil, o pioneirismo foi de Zero Hora, no Rio Grande do Sul, em 1981. Segundo a Associação Nacional dos Jornais (ANJ), existem hoje no Brasil em torno de 40 jornais com projetos educacionais, espalhados por 16 estados brasileiros. Eles atendem a 8.500 escolas e cerca de três milhões de estudantes.
Apesar de dados aparentemente significativos, pesquisas divulgadas recentemente por algumas entidades, inclusive internacionais, apontam que alunos de vários cursos no país não lêem jornal e que professores da maioria das escolas do ensino médio não utilizam exemplares em sala de aula como apoio didático. No caso brasileiro, de acordo com dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), o índice de leitura é de 1,8 livro por habitante/ano. A Alemanha têm um índice anual de leitura de 25 livros por habitante. São 14 milhões de brasileiros vivendo em cidades onde não há uma biblioteca sequer. Cerca de 67% dos estudantes tiveram desempenho abaixo do esperado em interpretação de texto no Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica – diagnóstico realizado pelo governo federal.
Processo pedagógico
Em compreensão de leitura e escrita, só 7% dos estudantes do Sudeste alcançaram níveis ‘adequados’. Os motivos mais apontados por especialistas são a desunião família-escola, falta de estímulos e de tempo por parte dos alunos. Outras pesquisas obtiveram resultados parecidos. O Programa Internacional de Avaliação de Alunos aplicou exames de leitura e interpretação em alunos de 15 e 16 anos. O resultado do desempenho dos estudantes brasileiros não foi diferente. De maneira geral, os jovens não entendem as questões para poder responder. Não é à toa que o jornalista Carlos Heitor Cony desabafou que freqüentemente recebe e-mails indignados de leitores que não entenderam o que ele escreve: ‘No fundo, eles nada entendem realmente de nada’.
O jornalista Gilberto Dimenstein cita pesquisa do DataFolha em seu livro Aprendiz do futuro que revela algumas pérolas de estudantes paulistanos acima dos 16 anos: 61% não sabem qual é a capital do Rio Grande do Sul; 18% apontaram o México como país vizinho; 92% não sabem dizer quantos estados tem o país. Ele alerta que pouco adianta gerar informação sem conhecimento crítico do mundo em que se vive. Segundo a professora Arilce Cardoso Tomaz, coordenadora do curso de Jornalismo da Universidade Monte Serrat, de Santos (SP), a falta de leitura atinge todos os níveis. ‘Infelizmente, o brasileiro culturalmente não lê. O incentivo da leitura de impressos em salas da Educação Fundamental e Média pode ser uma alternativa para mudar esse quadro.’
Um dos mandamentos do bom jornalismo é justamente o de educar. As pessoas utilizam jornais e revistas para se instruir, buscando em suas páginas conceitos, dicas, orientações que vão auxiliando na formação de opiniões e ajudando nas decisões diárias. Os impressos, quando bem-utilizados, podem se inserir num processo pedagógico fundamental para o avanço da sociedade.
Decisivas escolhas
Mas a jornalista e professora Rossana Gaia tem uma preocupação: a utilização do impresso na educação é um trabalho voltado para a cidadania ou mais uma entre tantas estratégias de marketing das empresas jornalísticas? Segundo Gaia, autora do livro Educomunicação & Mídias, a Asssociação Nacional de Jornais (ANJ) garante que o objetivo da proposta é incentivar o uso do impresso em sala de aula, introduzindo e estimulando o hábito de leitura entre crianças e adolescentes.
CartaCapital na Escola, nova publicação da Editora Confiança, reunirá uma seleção mensal de matérias publicadas na CartaCapital, seguida de propostas de atividades pedagógicas elaboradas por professores de universidades, cursinhos, escolas e autores de livros didáticos. Segundo a jornalista Silvia Costa, são três as metas normalmente estabelecidas pelos veículos que se propõem a desenvolver este tipo de projeto: empresarial, com o objetivo de formar novos leitores; educativa, com o objetivo de otimizar a educação; social, permitindo que os alunos tenham acesso a um produto, muitas vezes distante das possibilidades econômicas dos grupos sociais nos quais circulam.
Na opinião de Rossana Gaia, se a escola tem o objetivo de preparar alunos para serem pessoas sabedoras da permanente necessidade de atualizar seus conhecimentos, é fundamental que professores tenham a percepção de que também precisam exercitar-se de modo contínuo e que a leitura dos impressos pode ser um caminho inicial, independentemente dos objetivos das empresas jornalísticas.
O atual estágio mundial globalizado se caracteriza pela circulação de uma quantidade excessiva de mensagens informativas. Envolve cada vez mais a sociedade e a transforma permanentemente. Com isso, rápidas e decisivas escolhas significam conquistas de espaços na realidade profissional e social. A utilização adequada do meio impresso pode levar a opções conscientes e possibilitar a descoberta de novas formas de transformá-las em conhecimento. Embora o uso de notícias seja importante na escola, cabe ao professor – alerta Gaia – transformar toda essa quantidade de informação circulante em conhecimento, fazendo uma leitura crítica da realidade, num exercício de aprendizagem em duas vias: o professor ensina, ao mesmo tempo em que aprende.
Dinâmicas criativas
Utilizado como meio de comunicação em sala de aula, o impresso também melhora o nível de competência dos professores do ponto de vista pedagógico e contribui para a formação crítica e social do aluno. Através de leituras bem conduzidas pode espelhar muitos valores e preparar leitores experientes e críticos para o desempenho de seus verdadeiros papéis na sociedade. Pode contribuir ainda na formação geral do estudante, aumentando sua cultura e desenvolvendo suas capacidades intelectuais.
Jornais e revistas podem se tornar elos entre o conhecimento sistematizado do professor e o senso comum do aluno. De uma maneira inter e multidisciplinar, podem também envolver professores a partir de um mesmo texto ou de um conjunto de elementos presentes em suas páginas.
O texto de um veículo impresso em sala de aula pode significar para os alunos a mediação entre a escola e o mundo; o auxílio no relacionamento de seus conhecimentos prévios e sua experiência pessoal de vida com as informações e opiniões; a formação de novos conceitos e a aquisição de novos conhecimentos; a reflexão sobre o aprender a pensar de modo crítico; a definição de novos objetivos de leitura. E para os professores pode vir a ser um excelente material pedagógico (para todas as áreas), mantendo-os sempre atualizados e incentivando dinâmicas criativas e transformadoras .
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Jornalista e escritor, professor da UFJF, mestre em Comunicação pela Umesp, doutor em Comunicação pela UFRJ e conselheiro do FNPJ