Monday, 23 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Gary Rivlin

‘Especialistas em segurança da computação tendem a não se chocar facilmente com as atitudes imprudentes, freqüentemente descuidadas, em relação à segurança online. Mas, mesmo entre eles, alguns se mostraram surpresos com os resultados de um levantamento feito recentemente na Grã-Bretanha e que destacou a profunda vulnerabilidade das redes de computadores mundiais.

Um homem postado na saída da uma estação de metrô de Londres na hora do rush ofereceu, aleatoriamente, uma barra de chocolate às pessoas que passavam se elas revelassem a senha que usavam para se conectar à internet.

Espantosamente, mais de sete em cada dez pessoas aceitaram a oferta.

Ingenuidade – Essa pesquisa foi uma espécie de golpe publicitário apresentado pelos organizadores da Infosecurity Europe 2004, uma conferência sobre tecnologia da informação realizada na capital inglesa na semana passada. Não foi científica: somente 172 pessoas foram pesquisadas e não foi confirmado se elas estavam oferecendo uma senha real.

Mas, para os especialistas em computação, mesmo esse exercício informal destacou uma verdade que persiste: que apesar dos milhões de dólares que as empresas têm gasto para erguer paredes corta-fogo e instalar dispendiosos sistemas de detecção de intrusos em suas redes, o elo mais fraco de qualquer sistema continua sendo o usuário comum, bem-intencionado, mas incorrigivelmente ingênuo.

‘Nos últimos cinco ou dez anos, o departamento de Tecnologia da Informação das empresas tem feito grandes esforços para passar a seus funcionários a idéia de que eles têm de manter altos os padrões de segurança de sua senha’, disse Michael D. Allison, diretor-presidente da Internet Crimes Group, uma empresa de investigação com sede em Princeton, New Jersey (EUA). ‘Digamos apenas que eu esteja surpreso que uma porcentagem tão alta de pessoas ainda seja tão simplória.’

Os responsáveis pelo estudo britânico observaram que 53% das pessoas contactadas eram suficientemente espertas para saber que não deviam fornecer sua senha a um interlocutor, por telefone, que dissesse ser do departamento de apoio técnico do seu empregador – mas é claro que isso significa que quase a metade forneceria. Quarenta por cento disseram saber a senha secreta de pelo menos um colega de trabalho.

‘Creio que é justo dizer que as pessoas não compreendem os riscos e que por isso são tão descuidadas com suas senhas’, disse Lawrence Hale, vice-diretor da divisão de cibersegurança do Departamento de Segurança Interna dos Estados Unidos, quando lhe contaram sobre o levantamento britânico.

Parte do problema é a falta de instinto quando se navega num mundo computadorizado. Os seres humanos tendem a ser muito bons na avaliação do perigo. Evitamos uma determinada rua porque ela parece estranha e nos passa a sensação de perigo. Um carro em alta velocidade provoca medo. Mas a tecnologia – ou, mais especificamente, a ausência geral de conhecimentos sobre os mecanismos mais básicos da rede de computadores – encobre essa habilidade. ‘É difícil avaliar um risco quando você não o entende’, disse Bruce Schneier, fundador e principal técnico da Counterpane Internet Security, com sede em Mountain View, Califórnia (EUA). ‘Pessoas abordadas aleatoriamente nas ruas não compreendem a tecnologia da computação e, por isso, não entendem que fornecer uma senha é muito perigoso.’

Lee Rainie, diretor da empresa Pew Internet and American Life Project, citou um estudo conduzido por sua organização mostrando que quase 20% dos adolescentes pesquisados disseram compartilhar sua senha de acesso à internet com no mínimo um amigo. ‘Na minha época, compartilhávamos as combinações de nossos armários com nossos melhores amigos. Era uma prova de confiança’, disse Rainie. ‘No século 21, o equivalente é compartilhar a senha de acesso a um serviço online com algum colega.’’



Marijô Zilveti

‘Energia solar leva internet à floresta’, copyright Folha de S. Paulo, 28/04/04

‘Três horas diárias, três vezes por semana. Esse é o tempo médio que os índios das tribos dos yawanawas e dos ashanincas podem ficar conectados à internet.

As aldeias contam com duas antenas de recepção de satélite cada uma, mantidas por energia solar. Ou seja, se o tempo estiver chuvoso, são menos dias. Se melhorar, as comunidades podem se conectar cinco dias por semana.

Na aldeia dos ashanincas, Shatsy, 22, usa um programa de comunicação para bater papo on-line com Nane, 23, da aldeia dos yawanawas. As duas lideram o projeto de formação Rede Povos da Floresta. Ambas foram as primeiras mulheres a fazer parte do grupo, formado majoritariamente por homens.

Shatsy e Nane foram ao Rio de Janeiro no ano passado e tomaram aulas para aprender a operar o computador e acessar a internet, abrindo sites ou papeando.

Idealizado pelo CDI (Comitê para Democratização da Informática), o projeto tem como objetivo a criação de escolas de informática para usar o computador como ferramenta em cursos de capacitação junto às etnias.

O CDI (www.cdi.org.br) fechou parceria com a Comissão Pró-índio do Acre (www.cpiacre.org.br), que também conta com acesso à internet, mas com conexão de banda larga convencional, uma vez que está localizada em Rio Branco (AC).

Segundo Rodrigo Baggio, diretor-executivo do CDI, a parceria com a Comissão Pró-índio do Acre ‘foi estratégica, uma vez que eles recebem dezenas de etnias para fazer cursos de capacitação’.

O projeto foi iniciado em setembro do ano passado, quando três aldeias -duas no Acre e uma no Rio de Janeiro- receberam seus respectivos computadores.

Hoje o comitê conseguiu colocar uma máquina na tribo dos xacriabás, próxima à região de Montes Claros (MG).

Nessa aldeia, o processo de miscigenação está bastante alastrado. Por essa razão, o desafio do CDI é diferente: ‘Não se trata apenas de informatizar o local, mas apoiar o processo de resgate da cultura’, diz Baggio. Além da informatização e do uso da internet, há também a elaboração de apostilas e de livros.’



Luiz Francisco

‘Portal indígena critica ação de ‘brancos’’, copyright Folha de S. Paulo, 28/04/04

‘Serviço que coloca em comunicação representantes de várias etnias tem recebido cerca de 700 acessos diários

índios de sete etnias estão usando a internet para fazer reivindicações e criticar o governo federal, os fazendeiros e os ‘brancos’. O canal usado por eles é o portal www.indiosonline.org.br, lançado oficialmente há uma semana.

‘O Ibama proíbe quase tudo para nós. Mas, pagando gorjeta, um ‘branco’ pode fazer tudo em nossas terras’, escreveu o líder indígena Valdeleci Tupinambá, que mora em Olivença (BA). Outra atração do site é a sala reservada ao bate-papo, que reduziu as distâncias entre as nações.

Na sala, os erros ortográficos ficam em segundo plano. ‘O que nós queremos é fazer novas amizades, saber como anda a vida em outras nações, contar um pouco da história de cada um de nós. Não adianta falar corretamente o português e, em seguida, destruir o nosso passado, a nossa história, como os ‘brancos’ fazem’, disse a índia tupinambá Maria José Amaral, 43, que mora em Ilhéus (429 km ao sul de Salvador).

Para aprender a trabalhar com a internet, 14 índios de três Estados (Bahia, Alagoas e Pernambuco) participaram de um curso em Salvador, no início do mês. Depois, visitaram escolas públicas com mais de 15 mil alunos para contar as suas experiências.

As aulas foram realizadas em uma rua arborizada e sem calçamento de Itapuã (orla de Salvador), em um galpão. O portal começou a funcionar em caráter experimental na semana passada.

‘Em média, estamos registrando 700 acessos diários’, disse Luís Henrique Moreira, 38, responsável pelo desenvolvimento. Segundo ele, os sites indígenas brasileiros normalmente são atualizados por entidades. ‘Agora, os índios serão os redatores. Não existe nenhum tipo de censura.’

‘Em todo o país, há menos de cinco aldeias que têm computadores. O que fizemos foi uma coisa totalmente diferente. Doamos sete computadores para que os índios possam redigir as suas notícias, cobrar as suas reivindicações’, disse o argentino Sebastian Gerlic, 34, presidente da Thydêwá, organização não-governamental responsável pelo projeto.

Além de um curso básico de 36 horas de informática, os índios também aprenderam dicas sobre sites -imagens, navegabilidade, texto e edição.

De acordo com Gerlic, as sete etnias que encaminharam representantes para Salvador -tupinambá, quiriri, pataxó-hã-hã-hãe, tumbalalá, cariri-xocó, xucuru-cariri e pancararu- têm cerca de 25 mil índios.

O presidente da organização não-governamental disse também que todas as aldeias ganharam uma antena para conexão 24 horas por dia a um satélite. ‘Assim, os índios terão internet de alta velocidade (banda larga) o tempo todo.’ Além dos computadores, cada etnia também recebeu uma máquina fotográfica digital. ‘Queremos ver as fotos produzidas pelos índios dentro das aldeias na internet. Não queremos nada produzido, queremos a realidade’, disse Moreira.

De acordo com Sebastian Gerlic, o projeto está orçado em R$ 150 mil. Uma rede de estabelecimentos comerciais e um programa de incentivo cultural do governo baiano financiaram os computadores, os equipamentos fotográficos, as antenas e a instalação do portal indígena.

‘Estou me comunicando com o mundo, ampliando os meus conhecimentos. Não é pelo fato de eu ser índio que devo viver sempre isolado’, disse Antonio José dos Santos, 34, da etnia dos pancararus, que habitam o sertão de Pernambuco.’