Nesta semana, o Facebook anunciou a intenção de abrir o capital e ingressar na bolsa de valores. Em seu prospecto inicial apresentado à SEC (Securities and Exchange Comission, a Comissão de Valores Mobiliários dos EUA), a empresa afirma intenção de captar cinco bilhões de dólares. Projeções do Wall Street Journal, no entanto, esperam que a rede alcançe dez bilhões, com valor de mercado entre 75 e 100 bilhões. Os números seriam um recorde para empresas de internet. As duas principais bolsas de Nova York (Dow Jones e Nasdaq) disputam a empresa, mas, a exemplo da bolha da internet no final dos anos 1990, há um temor de que as expectativas não correspondam à realidade.
O LinkedIn, rede de relações profissionais, desde que abriu capital nunca alcançou o valor obtido em seu dia de estreia na bolsa de Nova York, em maio de 2011 – quando suas ações mais que dobraram. A euforia inicial lembrou as apostas em empresas online em 1998, 1999 e 2000 – empresas que, em 2001, já estavam falidas ou colocadas à venda. Para Luli Radfahrer, especialista em redes sociais e professor da Escola de Comunicações e Artes da USP, há uma expectativa muito grande para que o Facebook seja um sucesso, mas a perspectiva de crescimento da empresa é pequena. Na internet, diz ele, uma empresa de oito anos é considerada madura.
“Tem uma boa chance de dar certo porque é uma plataforma em que várias coisas acontecem. Ao mesmo tempo, está começando a ver sinais de esgotamento”, diz ele.
No atual cenário, ele não vê muitas possibilidades para a rede crescer. Com expectativas de alcançar um bilhão de usuários até o fim do ano – nessa semana, foram anunciados 850 milhões – a rede já constitui um produto sólido e rentável. “O Facebook vai continuar grande, mas quando você compra uma ação, você imagina que ela cresça”, diz Radfaher. As opções são reduzidas, diz ele, justamente porque a empresa só tem um grande produto. A saída é aumentar o tempo do usuário. Mesmo assim, há um limite.
Rafael Paschoarelli, professor da Faculdade de Economia e Administração da USP, é mais otimista. Ele não vê risco, por exemplo, de uma nova bolha da internet. “O mercado está mais maduro e muito mais seletivo na escolha de papéis”, diz. Ações daquela época, segundo ele, não teriam a menor chance de terem sucesso nas vendas.
“Eles estão fazendo dinheiro de uma maneira que no passado era impensável. Talvez seja chocante verificar que uma empresa de relações pessoais possa valer mais que uma petrolífera ou uma empresa de aço, mas o mundo muda”, diz ele, que vê no Facebook uma boa oportunidade. Há um preconceito ainda, afirma, em relação a empresas que não produzem ao modo “tradicional”, que tem resultados contados em unidades produzidas, por exemplo.
Paschoarelli lembra que o Google deu muito dinheiro aos seus acionistas em 2003, ao abrir seu capital. Já o buscador Yahoo! não se consolidou como um bom investimento, segundo ele. “Quem está no Yahoo! há muito tempo, perdeu e não tem condições de recuperar. O Yahoo! é a ‘vovozinha’ da internet”, diz.
Radfaher explica que a principal fonte de renda do Facebook, assim como o Google, vem da publicidade. No Brasil, os portais ainda lideram em termos de venda de anúncios online, mas são seguidos pelas duas redes. Nos Estados Unidos, eles também apresentam resultados de liderança no mercado. Flickr ou YouTube, por exemplo, estão muito longe da capacidade de esgotamento: as pessoas sempre subirão mais vídeos ou fotos para essas plataformas.
Já o Twitter está cada vez mais próximo do fim, segundo ele. Sua previsão é de que, com as primeiras cobranças dos investidores de Wall Street por resultados, o Facebook comprará o microblog.
“O Facebook tem muitas coisas que o Twitter não tem e o Twitter não tem nada que o Facebook não tenha”, diz.
Um dos principais aplicativos do Facebook hoje já é importar as atualizações do concorrente. Essa é uma das vantagens da rede fundada por Mark Zeckerberg: agrega vários aplicativos e negócios nela. Assim, existe a possibilidade do lucro se espalhar em um efeito cascata e todo mundo sair ganhando.
Privacidade x lucros
O Facebook estimula o próprio usuário a expor suas preferências, gostos e hábitos. Assim, as empresas podem identificar tendências de seu público e até mesmo direcionar publicidade, mais uma razão para seu alto valor. “Você tem condições de identificar nichos de todos os tipos, dos demográficos aos comportamentais e temáticos”, afirmou a especialista Elizabeth Saad em entrevista a CartaCapital no início do mês.
O passo adiante seria fornecer dados mais específicos dos usuários para as empresas. Radfaher vê aí uma barreira ética e que, caso adotasse esse política mais invasiva, o Facebook estaria dando um tiro no pé.
“Comece a fazer esse tipo de transição real de informações e você corre o risco de o produto definhar”, alerta ele. Mesmo assim, algumas pessoas já reclamam da falta de privacidade na rede.
“O Facebook é bastante honesto. Você vai em um restaurante que fecha às dez, você tem que ir embora: é uma propriedade privada [o Facebook], o cara pode propor o que ele bem quiser lá dentro”, diz ele.
Além disso, diz ele, o brasileiro ainda se expõe muito na internet. Ele compara a um adolescente que está aprendendo a se comportar dentro desse ambiente.
“O brasileiro também está aprendendo a lidar com esse ambiente social. O cenário está mudando, mas ainda há muita exposição por vacilo”, comenta.
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[Clara Roman, da CartaCapital]