Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Correa aperta cerco à mídia equatoriana

A ratificação da condenação de três diretores e um editor do jornal El Universo pela Justiça equatoriana, na última semana, assinala uma nova etapa dos ataques do presidente Rafael Correa à imprensa de seu país. “A situação está muito mais grave no Equador. Há uma campanha agressiva do governo contra a liberdade de expressão”, disse à Folha Ricardo Trotti, diretor da Sociedade Interamericana de Imprensa.

Desde que iniciou sua gestão, em 2007, o presidente Correa deu início a um processo de expropriação de canais de TV e rádio, uso discriminatório de verba para publicidade oficial e condenação judicial por injúria de jornalistas que criticam o governo. Já são 21 os meios governistas, que se dedicam a propagandear ações de Correa. Nas últimas semanas, dois casos ganharam relevância. Os jornalistas Juan Carlos Calderón e Cristian Zurita foram condenados em primeira instância a pagar multa de US$ 2 milhões por conta da publicação de El Gran Hermano, livro em que denunciam casos de corrupção vinculados ao irmão de Correa.

A causa contra o jornal El Universo ganhou repercussão internacional. O diário foi condenado por injúria devido a uma coluna do editor de opinião, Emilio Palacio, que chamava Correa de ditador e questionava sua atuação durante uma revolta policial. A pena é de três anos de prisão e pagamento de multa de US$ 40 milhões. Palacio pediu asilo político nos EUA e dois dos irmãos proprietários da empresa estão no exterior. O terceiro pediu asilo ao Panamá. “Está piorando o cerco. As nossas ações estão cada vez mais limitadas. O governo fecha as fontes e cria novos meios para fazer propaganda todos os dias. Mas não vamos desistir”, disse à Folha Gustavo Cortez, editor-geral de El Universo.

“Ofendidos e perseguidos pela imprensa”

Outro caso exemplar é o do jornalista Wilson Cabrera, dono e locutor da rádio La Voz de la Esmeralda, da cidade de Macas. Em abril do ano passado, sua rádio foi tirada do ar pela polícia e até seus cabos e antenas foram arrancados. Cabrera é acusado de transmitir sem autorização. “Não é verdade, me tiraram a rádio porque eu noticiava casos de corrupção locais. Esse governo, em vez de investigar as denúncias, vai contra os jornalistas”, diz Cabrera, que há três meses tenta sair do país para levar seu caso à Corte Interamericana de Direitos Humanos. “Esses casos são sérios e muito chamativos, mas há algo ainda mais perigoso. A lei eleitoral e a de comunicação. Se ambas forem aplicadas, não será mais possível fazer jornalismo lá”, diz Trotti.

A lei eleitoral, aprovada em 4 de fevereiro, impede os meios de fazerem matérias apontando aspectos negativos ou denúncias a candidatos às eleições de 2013. Já a lei de comunicação está no Congresso e, se aprovada, determinará que apenas 33% dos meios poderão ser privados. “Na prática, significa que serão 66% do Estado, porque a cota das minorias é controlada por Correa”, afirma Trotti.

O presidente justifica suas ações dizendo que, assim como qualquer cidadão, tem direito a ir à Justiça quando se sente injuriado. Por meio de sua conta de Twitter, anteontem, Correa disse que estava formando um grupo de “ofendidos e perseguidos pela imprensa” para, unidos, se defenderem “da imprensa corrupta”.

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“Vendi meu carro e hipotequei minha casa”

“Aos 58 anos, estou tendo que reaprender a ganhar o pão de cada dia. A Folha tem correspondente em Miami? Eu me ofereço para o posto.” De forma bem-humorada, o ex-editor de opinião do jornal El Universo Emilio Palacio descreve seus dias nos EUA desde que fugiu do Equador por conta do processo movido contra ele pelo presidente Rafael Correa.

Diz que usa caminhos diferentes todos os dias e está sempre controlando onde os filhos e a mulher estão. “Vendi meu carro e hipotequei minha casa em Guayaquil, estou vivendo da minha poupança. Enquanto isso, Correa, além de massacrar a imprensa, está ficando rico”, disse, em entrevista por telefone, de Miami.

Palacio também está se defendendo de outro processo em seu país, de uma TV estatal que classificou de fascista. Até agosto de 2010, assinava uma coluna de opinião no El Universo, além de escrever os editoriais do diário. O jornalista diz que considera Correa mais nocivo do que o venezuelano Hugo Chávez, que também expropria e condena jornalistas. “Chávez persegue por razões políticas. Correa tem algo pessoal que eu gostaria de investigar mais. Já encontrei declarações dele quando estudante, atacando meios de comunicação.”

Para Palacio, não é só no Equador que a imprensa está em perigo. “Há um processo em toda a América Latina. Sou pessimista. Há muitos presidentes com muito poder e popularidade e isso significa mais cerco aos jornalistas. E isso não é exclusivo aos governos de esquerda. Na Colômbia também está acontecendo. E, mesmo no Brasil, sabemos que a atual presidente e seu antecessor não gostam muito da mídia.”

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[Sylvia Colombo, da Folha de S.Paulo, em Buenos Aires]