‘Por onze votos a zero, o Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária (Conar) decidiu ontem pela proibição da veiculação da campanha da Brahma, feita pela agência África, com o cantor Zeca Pagodinho, que por contrato é o garoto-propaganda da Schincariol até setembro. Pela decisão, além de não poder usar a imagem do cantor, também fica proibida a execução da música ‘Amor de Verão’, composta por Nizan Guanaes, dono da África.
O Conar seguiu a Justiça de São Paulo, que também por decisão unânime resolveu pela suspensão do anúncio e ainda impede qualquer alusão à marca Nova Schin pela Brahma. A AmBev, por meio de sua assessoria de imprensa, informou que a retirada dos filmes da Brahma do ar já cumpre a decisão da Justiça de São Paulo e do Conar.
Em março, o Conar havia indeferido o pedido da agência Fischer America, pedindo a retirada do filme ‘Amor de Verão’ do ar, por considerar que a peça estava dentro dos limites da propaganda comparativa.
O publicitário e sócio da agência Fischer América, Eduardo Fischer, comemorou ontem a decisão do Conar e da Justiça paulista. Segundo ele, venceram a ética e os valores da publicidade.
– Nossa campanha sempre foi a preferida do consumidor e nunca incomodamos ninguém. Nunca entramos em brigas com o Nizan, apenas nos defendemos dos ataques – disse Fischer.
Para Fischer, o comportamento de Nizan Guanaes foi prejudicial para o mercado.
– O que ele fez não é ético, não faz bem para o mercado da publicidade e nem para o país. Por isso, historicamente, o Conar decidiu pela proibição. Agora, vamos continuar seguindo a nossa vida – disse Fischer.
Schincariol não sabe o que fazer com Zeca Pagodinho
O publicitário Nizan Guanaes não foi encontrado. A informação dada pela agência África é que ele está viajando.
A Schincariol vai manter o contrato com o cantor Zeca Pagodinho até setembro. Mas não informou se a imagem do cantor será usada em campanhas. Fischer disse que o assunto será estudado pela cervejaria e pela agência.’
Adriana Mattos
‘Conar proíbe a Brahma de veicular publicidade com Zeca Pagodinho’, copyright Folha de S. Paulo, 9/04/04
‘O Conar (Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária) decidiu ontem, por unanimidade de votos (11 a 0), proibir a Brahma de utilizar a imagem e a voz do cantor Zeca Pagodinho em suas campanhas publicitárias.
A empresa também fica impedida de veicular a música ‘Amor de Verão’ utilizada no filme publicitário. A decisão foi tomada por causa da ação impetrada no conselho pelos advogados do grupo Schincariol. Na ação, a empresa acusa a Brahma de agir de forma antiética, ferindo o Código de Auto-Regulamentação Publicitária.
Para o Conar, o filme publicitário fere o artigo 32 do código (que define diversas normas a serem seguidas em caso de propaganda comparativa).
No final de março, a Schincariol já havia obtido liminar na 27ª Vara Cível de São Paulo, contra a AmBev e o cantor Zeca Pagodinho. A liminar suspendia a veiculação do comercial da Brahma protagonizado pelo cantor.
Pelo despacho, fica proibido o uso da imagem do cantor associado direta ou indiretamente à marca Brahma, em qualquer meio de comunicação, enquanto vigorar o contrato dele com a Nova Schin.
A Schincariol afirma que ‘por diversas vezes [a AmBev, dona da Brahma] descumpriu essa ordem judicial’ e, portanto, a companhia ‘foi objeto de advertência do Tribunal de Justiça’.
A Brahma nega essa informação de descumprimento legal e esclarece que já acatou a determinação da Justiça. A empresa informa que o comercial deixou de ser veiculado já há algumas semanas.
Em nota encaminhada pela Schincariol, o publicitário Eduardo Fischer, da Fischer América, a agência da Schincariol, afirma que ‘valores morais e éticos’ saíram vencedores.
A campanha da Brahma com Zeca Pagodinho foi criada pela África, a agência do publicitário Nizan Guanaes.
O cantor é obrigado hoje a respeitar o contrato assinado entre ele e a Schincariol. Isso inclui a exclusividade da imagem de Zeca Pagodinho com a marca de cerveja até setembro deste ano. Do contrário, terá de pagar multa diária de R$ 1 milhão.
A rixa entre a Schincariol e a AmBev começou no dia 12 de março passado, quando foi ao ar o comercial da Brahma protagonizado por Zeca Pagodinho, então garoto-propaganda da Nova Schin.
No refrão da música cantada no filme da Brahma, Zeca ironiza sua passagem pela Nova Schin: ‘Fui provar outro sabor, eu sei. Mas não largo meu amor, voltei’.’
PROPAGANDA & JUVENTUDE
‘A eterna juventude à venda’, copyright O Estado de S. Paulo, 11/04/04
‘Um homem de 60 anos, quando pega o volante de uma Ferrari, se sente com 18. É com essa constatação que o publicitário Francesc Petit, da DPZ, justifica o ideal de juventude com que dezenas de campanhas publicitárias que estão no ar nas emissoras de televisão e nos veículos de comunicação impressos vendem produtos que o moço não tem dinheiro para comprar, mas está no centro das estratégias de comunicação como representante de uma aspiração: o espírito jovem.
É assim com as campanhas de automóveis como Ferrari e BMW, com os relógios Rolex e Nike (com diversos instrumentos digitais), com motos Harley-Davidson e Triumph, com a moda e, sobretudo, com os novos aparelhos celulares, tanto da Nokia como da Motorola, Siemens e Samsung. Também com as cervejas, os sabonetes e até marcas de sabão em pó. E assim continuará sendo, no que depender dos publicitários.
Fábio Fernandes, presidente da agência F/Nazca, que criou campanhas marcantes, como as da tartaruga e siris da Brahma e o ‘desce redondo’ da Skol, diz que ‘a despeito das marcas no rosto, todo homem se sente jovem por dentro, e os produtos que traduzem essa aspiração fazem parte da sua vida, do seu ideal de consumo.’
É o caso da campanha do Ford Eco Sport 4X4, criada pela J.W.Thompson, que reforça o ideal de juventude e liberdade. Mas não seria contraditório pôr no ar jovens vendendo carros que custam mais de R$ 50 mil e só poderão comprar na idade madura, ou ganhar dos pais?
Fernandes garante que não, e cita o exemplo da Skol, marca líder do mercado nacional e a mais valiosa da AmBev. ‘O jovem não é o público-alvo de uma cerveja, mas representa o ideal de qualquer um dos consumidores de cerveja.
Toda mulher quer se ver jovem. É sinônimo da alegria de viver, do convívio, da festa, é a melhor tradução do que queremos transmitir’, diz.
‘A chave de tudo é a emoção, e a propaganda tem de emocionar’, completa o francês naturalizado americano Marc Gobé, respeitado profissional de propaganda, consultor de marcas como Victoria’s Secret, Air France, Coca-Cola, MAC e ABN Amro Bank. Para Gobé, o filósofo Spinoza está certíssimo quando diz que ‘a vida é a eterna busca de felicidade’, e o jovem é aquele que se move com velocidade atrás dos sonhos. Para ele, a marca e o produto que não transmitem esse ideal estão fadados ao fracasso.
É essa sensação de liberdade que levou o empresário Daniel Calvo Barboza, de 28 anos, a trabalhar duro na empresa de automação de residências Cynthron para comprar, depois de 8 anos, uma Harley-Davidson. ‘É incrível a sensação que essa moto oferece’, diz ele, que não usa as jaquetas famosas nem tem identificação por o estilo ‘easy rider’ que a moto inspira. ‘Acho que comprei na idade certa, se você é mais jovem não percebe o potencial de uma Harley-Davidson’.
Daniel, porém, é um dos mais jovens a comprar uma moto da marca, a preferida de quem passou dos 40 anos e ainda corre atrás do ideal de liberdade. O publicitário Celso Loducca, da Loducca, agência que cria no País as principais campanhas da americana Harley-Davidson e da inglesa Triumph, diz que o ideal que essas máquinas vendem não é só o da velocidade: ‘É o ideal de liberdade, e o jovem é o próprio retrato da mobilidade, mesmo que ele não venha a comprar a moto. Só que quem compra uma Harley-Davidson tem a convicção de que está comprando liberdade e mobilidade. Muitas vezes o consumidor compra aquilo que lhe traduz o desejo de ser e, no caso da moto, há ainda o gostinho de ousar’.
Para Loducca, as campanhas de celulares, ao contrário das motos, buscam o jovem porque é ele quem escolhe a tecnologia, quem dita as regras daquilo que vai ser a necessidade no futuro. As campanhas da Motorola, que passou a usar o apelido ‘moto’, são um bom exemplo. Criadas pela agência Ogilvy, elas brincam como as festas raves e a mobilidade jovem com o GiraMoto e o MotoRave.
O diretor de Marketing da TIM no Estado de São Paulo, Pablo Larriex, diz que o jovem e até a criança não compram o celular, mas influenciam os pais.
‘Eles aprendem rápido a operar todos os serviços que um aparelho permite e isso estimula a compra pelos pais. Afinal, alguns desses aparelhos chegam a custar R$ 1,5 mil’.
Para Petit, no entanto, os celulares, os relógios e os tênis de marcas como Nike funcionam como uma compensação para aqueles que são alvo de campanhas como a da BMW ou da Ferrari e não podem comprar esses carros: ‘É como se fosse um clube em que está dentro só quem carrega uma marca no peito ou nos pés, que representa status’. Ele critica, porém, o uso exacerbado dessa estratégia, que tem o poder de excluir o jovem que não carrega essas marcas.
‘O que não ocorre com a Ferrari ou Harley-Davidson, mas pode criar situações antagônicas, como o roubo de tênis em favelas, porque ter o calçado passa a ser um sinal de status. Todo mundo sabe que a Ferrari não é para todos e, quando põe o jovem em cena, vende apenas o ideal de juventude’.
Fernandes, Petit e Loducca garantem, porém, que é inevitável a relação entre juventude e produtos dos sonhos. Tanto que, terça-feira, quando marcas de luxo capitaneadas pela grife de canetas Montblanc apresentaram seus produtos no evento Montblanc e Suas Mulheres, serão jovens modelos da agência Mega que desfilarão as jóias criadas pela Denoir para a Princess Jóias e abrirão as portas de novíssimos modelos da Mercedes-Benz expostos no evento, também patrocinado pelo cartão de crédito American Express. Coisa para gente grande, a despeito das beldades, a maioria com menos de 20 anos, que vão seduzir as verdadeiras consumidoras. ‘Tem mulheres que, para comprar esse ideal de juventude, até se arriscam nas mesas de cirurgia. Mas tudo mundo quer ser jovem, e as marcas precisam de jovialidade, só que de espírito, de atitude, não precisa ser necessariamente físico’, diz Fernandes.’