Mais de dois anos depois da aprovação, na França, de uma rigorosa repressão à pirataria digital, na semana passada a agência que monitora as violações de direitos autorais enviou os primeiros casos para a Justiça. Os reincidentes poderão ser temporariamente privados de internet.
Estudos mostram que o apelo dos produtos pirateados desapareceu depois que a lei, aplaudida pelas gravadoras e pela indústria cinematográfica e odiada pelos defensores de uma internet livre, entrou em vigor. As vendas digitais, que demoraram para pegar na França, estão aumentando e a receita das gravadoras começa a se estabilizar. “Acredito que o povo francês está se conscientizando cada vez mais de que os artistas devem ser pagos por seu trabalho”, disse Pascal Negre, presidente da Universal Music France. “Acho que todo mundo tem um amigo que recebeu um e-mail sobre isso. A medida criou um estardalhaço considerável. Entretanto, seu efeito é educativo.” Mas com a proximidade das eleições presidenciais, cujo primeiro turno será em abril, a oposição à lei começa a esquentar.
Os adversários do presidente Nicolas Sarkozy, que defendeu a medida, afirmam que ela infringe as liberdades civis. Seus oponentes, que estão ganhando força com o impulso de uma campanha destinada a derrotar dois projetos de lei em Washington para conter a pirataria, e de uma onda de protestos contra um tratado internacional sobre direitos autorais, querem repelir ou modificar a lei francesa.
Vendas de músicas piratas subiram
A agência que monitora a aplicação da lei, conhecida pela abreviação francesa Hadopi, enviou 822 mil advertências por e-mail a suspeitos infratores no final de dezembro. A estes, seguiram-se 68 mil avisos com segundas advertências, enviados por carta registrada. Desses casos, 165 chegaram à terceira fase, na qual os tribunais são autorizados a impor multas de 1.500 euros (cerca de R$ 3.385) e a suspender as conexões de internet por um mês.
Eric Walter, secretário geral da Hadopi, disse que o número relativamente pequeno de infratores na terceira fase mostrou que o sistema está sendo um sucesso para combater a pirataria. “Nosso trabalho consiste em explicar às pessoas o motivo pelo qual a pirataria é uma coisa ruim e que deve ser evitada”, disse em uma entrevista. “Quando as pessoas entendem isso, param. Evidentemente, algumas não querem compreender. Então o seu caso precisa ir para a Justiça.” Um relatório encomendado pela Hadopi, que tem um orçamento de 11 milhões e emprega 70 pessoas, mostrou um considerável declínio do compartilhamento de arquivos desde que o sistema entrou em vigor.
Um estudo separado, realizado por pesquisadores do Wellesley College em Massachusetts e da Carnegie Mellon University em Pittsburgh, sugere que a Hadopi impulsionou os downloads legais por meio da loja de música iTunes, da Apple. Desde a primavera de 2009, quando o debate sobre as medidas estava no ápice, até meados de 2011, as vendas da iTunes subiram muito mais na França do que em outros países europeus. Embora não existam provas de que a Hadopi foi responsável por isto, o estudo diz que a relação se justifica pelo fato de que as vendas de gêneros musicais que sofrem por causa da intensa pirataria, como o hip-hop, subiram muito mais do que as vendas de gêneros pouco pirateados, como músicas natalinas e música clássica.
O fechamento do Megaupload
Os pesquisadores calcularam que a Hadopi favoreceu um aumento de mais de 13,8 milhões ao ano das vendas de música do iTunes, na França. Depois que sites como Napster surgiram há mais de dez anos, as gravadoras dos Estados Unidos promoveram uma campanha para levar à Justiça as pessoas que faziam compartilhamento de arquivos, mas posteriormente recuaram por causa das reclamações.
Desde então, as autoridades e os veículos de comunicação americanos aparentemente concentraram sua atenção do lado da oferta da pirataria. Em janeiro, o Departamento de Justiça fechou o Megaupload, um serviço de download e upload de arquivos, e acusou sete pessoas envolvidas de ajudar a pirataria.
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[Eric Pfanner, do New York Times, de Paris]